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Marisa Matias

«Não nos lixem»: A luta contra a co-incineração de resíduos industriais perigosos nos arredores de Coimbra*

(texto não editado)

 

Introdução

Embora a história do tratamento dos resíduos industriais em Portugal conte já com quinze anos de existência, a escolha de Souselas (Coimbra) para a realização de co-incineração de resíduos industriais perigosos remonta a Dezembro de 1998. Desde então, e até muito recentemente, assistiu-se a um longo processo de contestação e redefinição das estratégias políticas inicialmente delineadas. É precisamente este processo que constitui o «cenário» privilegiado da nossa análise. A luta de Souselas arrastou um vasto e complexo conjunto de questões que, impulsionadas pela sua maior amplificação, permitiram a um movimento de protesto local, nos seus períodos mais «quentes», a definição da agenda nacional.

A análise de todo este processo parece indiciar que a sociedade portuguesa está a sofrer profundas alterações de âmbito estrutural que, aliás, já se vinham manifestando em outras situações de controvérsia pública recentes. Se no período imediatamente posterior ao derrube da ditadura salazarista - quase meio século de opressão e supressão das liberdades individuais -, a sociedade portuguesa foi atravessada por inúmeras iniciativas populares e acções colectivas, nos anos mais recentes viveram-se estranhos momentos de apatia. No entanto, sobretudo a partir da segunda metade dos anos noventa, parecem estar a emergir novos focos de participação pública, que, à semelhança da luta de Souselas, têm questionado de forma directa a relação entre os processos de decisão política e o conhecimento científico e a participação dos cidadãos. Dado o seu carácter recente, é ainda prematuro caracterizar as alterações que estes movimentos poderão produzir na sociedade portuguesa que, até ao momento, mantém intactas duas características marcantes: fraca organização da sociedade civil e défice de participação política (Santos, 1993 e 1994). Serão estas movimentações efectivamente portadoras de uma mudança mais generalizada ou reflectem apenas um reforço da complexidade já existente ao nível das práticas sociais como resultado da condição semi-periférica da nossa sociedade?

Por outro lado, tem-se verificado que em situações públicas controversas a Administração portuguesa se tem revelado «tradicionalmente centralizada e pouco aberta, seja ao parecer científico, seja ao debate público» (Gonçalves, 1996: 136). Apesar de em Portugal a ciência ter sido sempre considerada como uma esfera autónoma da decisão política, nos países centrais a ciência funcionou como um importante aliado desta. Ora, o que actualmente se verifica nestes países é um decréscimo de credibilidade da ciência, uma vez que se foram tornando claros os riscos associados a algumas das suas aplicações (Ezrahi, 1996; Gonçalves, 2000). Neste contexto, não deixa de ser relevante o facto de, em algumas das manifestações mais recentes na sociedade portuguesa, ter vindo a surgir pontualmente o recurso aos pareceres de especialistas com a finalidade de informar as decisões, ou até mesmo, como se verificou no caso de Souselas, como instrumento de legitimação, por parte dos decisores políticos. A par desta situação, tem-se verificado um crescente questionamento da credibilidade dos resultados das práticas científicas, por parte dos cidadãos e de outros actores envolvidos nos processos. Estes «novos» envolvimentos abrem caminho a um conjunto de questões com particular importância: quais as consequências das possíveis alianças entre cientistas e decisores políticos? Que portas se abriram em função da associação entre cientistas e cidadãos, nomeadamente entre saberes científicos e saberes leigos, ao nível do movimento de protesto?

Estas e outras questões de carácter mais específico serão analisadas mais à frente. De seguida, procuramos fazer um enquadramento geral do movimento que aqui analisamos, bem como a identificação das hipóteses que conduzem a nossa análise. Numa segunda parte do texto, procuramos descrever sumariamente o movimento de protesto contra a instalação de uma co-incineradora em Souselas. Na terceira parte procuramos debater este movimento, abrindo ainda espaço às alternativas, isto é, ver em que medida o movimento de protesto analisado pode contribuir para um alargamento das formas de participação pública de carácter emancipatório.

Para além da análise documental e bibliográfica, para a realização desta investigação recolhemos ainda informação através de entrevistas aos representantes das associações/entidades que fizeram parte da «Comissão de Luta Contra a Co-incineração», tendo igualmente mantido uma proximidade permanente com o movimento de protesto.

 

1. Enquadramento geral

Assiste-se actualmente a um crescimento de interesse pelos assuntos relacionados com a ciência e a tecnologia, a par da denúncia dos riscos e incertezas gerados pelas suas aplicações (Nunes, 1999). No que toca ao crescimento de importância das questões ambientais, a ciência é actualmente tomada tanto como problema, quanto como panaceia, uma vez que se esta permite um reconhecimento da profundidade dos problemas correntes, parece igualmente mostrar, nas suas próprias práticas, consequências que escondem alguns dos piores excessos da modernidade. No entanto, se assim identificamos o problema, um outro desde logo se coloca e prende-se com a atitude de alguns cientistas que entendem a ciência como uma forma «especial» de conhecimento que deve ser arredada das formas locais de pensamento, permitindo que a ciência se mova de local para local, assumindo o seu carácter universal (Clark e Murdoch, 1997). Encontrando-se actualmente instalado o debate, têm sido visíveis alguns desenvolvimentos que visam o repensar das articulações entre diferentes tipos de saber e questões ambientais. Neste sentido, tem sido favorecido o envolvimento dos cidadãos em situações controversas, semelhantes à que aqui analisamos, que envolvem conhecimento científico e técnico e percepção de riscos por parte de populações afectadas. Vários têm sido os modelos postos em prática - Conferências de Consenso, Painéis de Cidadãos, Focus Groups, Referendos, entre outros -, a que correspondem várias formas e vários níveis de envolvimento dos cidadãos (Fixdal, 1997; Font, 1998; Rowe e Frewer, 2000). No entanto, seja com um carácter consultivo, seja com um carácter deliberativo, os cidadãos têm participado de forma directa na definição de políticas a este nível, ainda que, no que respeita à escolha do modelo de participação dos cidadãos, não exista um consenso relativamente à identificação dos métodos mais adequados, uma vez que dependem muito das especificidades das situações em jogo.

Apesar da sua integração num bloco regional central (a União Europeia), em Portugal não existem mecanismos intermédios ao nível da tomada de decisão em assuntos de ciência e de tecnologia, ao contrário do que acontece em alguns dos países «homólogos». Aliás, o desempenho privilegiado ao nível da regulação social, tendo como base um abismo que separa os representantes dos representados, têm sido características fundamentais do Estado português (Santos, 1990 e 1994). Esta tensão tem vindo ainda a ganhar contornos diferenciados à medida que o país vai adoptando quadros legais e práticas políticas diferenciadas, em função da sua integração na União Europeia, que se afiguram mais distantes das práticas sociais existentes, uma vez que idealizadas para outros contextos (forte envolvimento científico, altos níveis de associativismo e sociedades civis fortes). A questão do tratamento dos resíduos industrias perigosos é disso exemplo, sendo que a actuação do Estado neste campo tem sido marcada por avanços repentinos, intercalados por períodos de estagnação. Com efeito, no que diz respeito ao tratamento de resíduos em Portugal, só em 1985 foram lançadas as primeiras bases de uma política nacional de gestão de resíduos. Não podemos esquecer que, nessa altura, Portugal se encontrava numa fase de negociação com vista à integração na Comunidade Europeia, pelo que se tornava urgente o esforço de aproximação dos quadros legais, tendo o Estado assumido a condução da vida nacional com um elevado nível de autonomia (Santos, 1993). Esta postura poderá igualmente explicar o período de vazio legislativo que se seguiu neste campo até 1990, quando se desencadeia a tentativa de definição do destino que deve ser dado aos resíduos produzidos em Portugal. Ainda assim, só em Fevereiro de 1994 é relançado o Sistema Integrado de Gestão de Resíduos Industriais (SIGRI). Foi no decurso da definição de uma política de resíduos que, em 1998, foi divulgada a opção de Souselas para a realização da co-incineração.

Numa concepção alargada, poderemos afirmar que o movimento de protesto contra a co-incineração em Souselas é um dos indicadores do reposicionamento de Portugal no contexto mundial, que, actualmente, mantendo-se enquanto país semiperiférico, tem a particularidade de se encontrar inserido num bloco regional central (a União Europeia). Se em termos de desenvolvimento económico a sua posição não foi alterada, uma vez que a economia portuguesa permanece semiperiferizada, o facto é que, dada a natureza política da União Europeia, Portugal tem de se comportar como se fosse um país central, não só em termos legislativos, como no campo do discurso político. Estes factores acabam por condicionar as próprias lutas políticas.

Numa outra perspectiva, a União Europeia passou a ser também um recurso para os movimentos sociais, situação esta que podemos analisar numa dupla perspectiva: por um lado, sendo a legislação europeia mais avançada que a nacional em alguns campos de actuação na área do ambiente, os movimentos sociais socorrem-se frequentemente das directivas europeias como suporte para a sua contestação, por outro, vão sendo tidos em conta os movimentos de protesto que têm surgido em outros países europeus, analisando as situações e as soluções apresentadas. Podemos daí sugerir que os movimentos sociais portugueses têm vindo a tentar tirar algum partido do seu atraso, olhando para a Europa de uma forma selectiva: defendendo as posições mais avançadas e recusando as soluções que já se mostraram falíveis em outros contextos.

Por outro lado, o Estado português tem pouca experiência em questões de gestão de risco e, como tal, estas têm sido submetidas às estratégias políticas convencionais, revelando total descrédito e desconfiança pelas formas de participação dos cidadãos, inclusive através da transformação das consultas públicas em meros pró-formas de cumprimento de calendários, tendo-se ainda verificado uma actuação pautada pelo autoritarismo no que toca às questões de gestão do risco. Ainda assim, e apesar da presença permanente da capacidade do Estado para condicionar as constelações das práticas sociais (Santos, 2000), no caso da co-incineração algum espaço de manobra foi deixado para a experimentação social. Resta, no entanto, saber se, devido às características da sociedade portuguesa, estas transformações têm condições para prosseguirem por via da crescente politização dos diferentes espaços-tempo, ou, por outro lado, necessitam da força impulsionadora e recriada do Estado enquanto novíssimo movimento social (Santos, 1998). O princípio da comunidade rousseauniana, que compreende a ideia da obrigação política horizontal, ao nível dos cidadãos, e a ideia da participação e da solidariedade concretas ao nível da formulação da vontade geral, é aquele que tem mais virtualidades emancipatórias. A possibilidade de uma nova cultura política e de uma nova qualidade de vida pessoal, na descentralização e na democracia participativa, no cooperativismo e na produção socialmente útil são os caminhos que a partir daí se decalcam (Santos, 1994). As transformações associadas às lutas emancipatórias (a transformação do poder em autoridade partilhada, a transformação do direito despótico em direito democrático e a transformação do conhecimento-regulação em conhecimento-emancipação) ocorrem de forma diferenciada ao nível dos diferentes espaços-tempo, sujeitas aos seus diferentes ritmos (Santos, 1995 e 2000). Não se trata de uma transformação una, mas efectiva. No que toca a esta questão, a análise aqui desenvolvida demonstra, de forma particular, as transformações que foram sendo efectuadas ao nível do espaço-tempo da cidadania por via do desenrolar do movimento de protesto.

Paralelamente às questões atrás identificadas, a análise do movimento de protesto contra a co-incineração permite-nos equacionar o papel da ciência e da tecnologia no nosso país, quer enquanto elemento associado a formas de poder e regulação, quer enquanto recurso para formas de participação pública de carácter emancipatório e, do mesmo passo, explorar uma experiência de articulação entre modos de conhecimento científico e não científico. Associada a esta dimensão aparece-nos ainda uma experiência de participação dos cidadãos que se coloca frente a frente com a democracia representativa, tendo ambas sido «obrigadas» a medir forças e a reconhecer fraquezas. O mesmo embate foi travado ao nível das diferentes formas de conhecimento, com a agravante de terem como cenário um palco de incertezas e de rivalidades antigas.

Por outro lado, a razão genérica que esteve na base quer da decisão governamental, quer do movimento de protesto, era a mesma: o combate a um problema do foro ambiental. Com efeito, a decisão do Ministério do Ambiente fundamentava-se na necessidade urgente de dar um tratamento aos Resíduos Industriais Perigosos produzidos em Portugal que, tal como estavam, representavam uma enorme ameaça ambiental; o movimento de protesto fundamentava-se no facto de a solução escolhida não ser ambientalmente correcta, transformando a própria solução em ameaça. De referir ainda que, desde o início, estiveram associados ao movimento de contestação dois tipos de conhecimento tradicionalmente tidos como opostos: o conhecimento «local» e o conhecimento «global». A diferenciação entre estes dois tipos de conhecimento, encarados como «rivais», assenta no pressuposto de que existem formas de saber que, pela forma como são construídas, são independentes das contingências e das limitações associadas às formas locais de conhecimento, sendo assim considerados como conhecimentos de carácter universal, globalmente impostos às restantes formas de conhecimento. Esta separação, fortemente associada a uma concepção moderna de conhecimento, assente na separação entre ciência e senso comum, permite a desvalorização dos conhecimentos locais, disfarçando-os de manifestações pontuais, pelo que, em contextos de confronto de conhecimentos, estes tendam a ser considerados como formas não legítimas de saber.

Debruçando-nos agora na análise concreta do movimento de protesto contra a co-incineração, três hipóteses de trabalho que afiguram-se-nos como centrais:

  1. Uma ciência menos bem preparada é uma ciência mais vulnerável à apropriação pelo poder político;
  2. A politização da ciência é o outro lado da cientifização da decisão política;
  3. O movimento contra a co-incineração mostra as forças e as fraquezas dos movimentos sociais hoje em Portugal e como estes estão ligados à utilização dos conhecimentos e experiências «profanos».

Retomando a primeira hipótese de trabalho, ao contrário de outros países, nomeadamente os países centrais, em Portugal, a ciência conseguiu, ao longo dos anos, manter um elevado grau de autonomia relativamente às restantes esferas sociais. Aliás, um dos legados da modernidade, a separação entre conhecimento científico e senso comum, foi-se arrastando, fazendo com que, em alguns casos, o conhecimento científico ainda permaneça envolto numa película que é invisível, mas que separa. Só muito recentemente começaram a vir a público algumas polémicas que, aliadas a movimentos de contestação, permitiram questionar algumas das fundamentações de base científica. No entanto, a elevada autonomia do conhecimento científico não se traduziu num reforço da autoridade política do mesmo. Com efeito, alguns estudos têm demonstrado que a posição da ciência e dos cientistas permanece frágil, o que se torna num elemento que pode favorecer a manipulação deste tipo de conhecimento (Gonçalves, 1996). A este respeito, o movimento que aqui apresentamos é, sem dúvida, aquele que permitiu a amplificação destes questionamentos. A argumentação de base científica foi incorporada num duplo sentido: por um lado, enquanto meio de legitimação do movimento de protesto, por outro, enquanto instrumento para a decisão política. Neste último sentido, verificamos que, apesar de em Portugal nunca terem sido realizados estudos sequer semelhantes aqueles que foram efectuados pelas comissões de cientistas nomeadas, os resultados obtidos foram tidos como os mais válidos, ainda que anos de estudos e de debates realizados em outros países pudessem apontar soluções diferentes. A ciência politizou-se e, ao politizar-se, tornou-se parte do conflito, deixando cair a sua «aura». A concepção da ciência como «descrição única e autorizada do mundo» (Irwin, 1996) foi-se dissipando, à medida que se foram reconhecendo contradições entre os próprios cientistas.

Por outro lado, no que diz respeito à segunda hipótese de trabalho, à semelhança da situação descrita anteriormente, também a este nível a sociedade portuguesa não se assemelha às sociedades centrais. Com efeito, se para esses países as relações entre ciência e democracia estiveram intimamente ligadas ao projecto de desenvolvimento e progresso da modernidade, na sociedade portuguesa este foi um dos legados não cumpridos da modernidade. Pelo contrário, foi precisamente quando esta relação começou a ser questionada nos outros países que em Portugal se começou a fazer as primeiras associações a esse nível. A situação verificada relativamente ao processo que aqui apresentamos vai, no entanto, muito para além da simples associação, tendo-se transformado mesmo numa situação sem antecedentes.

Por último, o movimento de protesto cresceu e criou alianças. No primeiro tempo, juntaram-se as associações e instituições locais, os representantes locais dos partidos políticos, as personalidades locais, os cientistas locais. Seguiu-se o alargamento à comunidade científica nacional, bem como à totalidade dos representantes dos partidos políticos da oposição na Assembleia da República. No segundo tempo, as próprias associações e entidades locais passam a movimentar-se em articulação com outras associações e entidades de outros locais. Os mais de dois anos de protesto, ainda que percorridos por um desdobramento das «vozes» e dos «textos» a ele associados, foram sempre acompanhados por uma pluralidade de posições e uma heterogeneidade ao nível dos seus intervenientes. No entanto, a população que gritou as palavras de ordem foi sempre a população local. Pontualmente, terá surgido uma ou outra manifestação de solidariedade para com o movimento, mas nunca alargada à população nacional ou, até mesmo, regional. Pelo contrário, o movimento de protesto foi alvo de inúmeras críticas, das quais podemos destacar aquela que sempre o acompanhou: estávamos perante um movimento de base local, que defendia interesses particularistas com base num egoísmo localista (síndroma «NIMBY»), cujos argumentos assentavam na irracionalidade e na ignorância. Na origem destas críticas estiveram, sobretudo, o governo, alguns cientistas e alguns «opinion makers» nacional. No entanto, o movimento de protesto reagiu e mudou de estratégia, aprendeu com os seus próprios erros, e desenvolveu e aprofundou a articulação entre a contestação de base local e algumas iniciativas que foram sendo desenvolvidas de âmbito nacional. Neste sentido, informou-se e questionou a solução escolhida em confronto com as práticas e quadros legais de outros países, e, em particular, da Comunidade Europeia. Os argumentos de base local, não deixando de existir, recuaram no sentido de abrir espaço a outro tipo de fundamentação ao nível do protesto, tendo mesmo sido possíveis iniciativas únicas em Portugal no que toca a uma movimentação deste género. No entanto, e como veremos mais adiante, o movimento de protesto permitiu-se descansar nos momentos menos «quentes» do processo, resguardando muita da sua força para os momentos de decisão política, sofrendo as consequências dos «apagamentos» a que se auto-sujeitou.

 

 

2. O movimento de protesto de Souselas e o choque dos conhecimentos

Antecedentes do movimento

Um dos passos decisivos para o avanço do processo de decisão em favor da co-incineração foi a constituição da Scoreco - um consórcio de cimenteiras formado pela Secil e pela Cimpor, em associação com uma empresa francesa (Suez Lyonnaise des Eaux), em 1996. A inclusão de Souselas como um dos locais possíveis para a co-incineração de Resíduos Industriais Perigosos foi afirmada durante o mês de Junho de 1998, altura em que a Scoreco apresentou o Estudo de Impacte Ambiental. Para levar a sua estratégia avante o governo sugeriu a criação de um Plano Estratégico de Gestão de Resíduos Industriais (PESGRI), a par da requalificação ambiental das localidades afectadas. Estas medidas viriam a tornar-se as «bandeiras» do governo na defesa da co-incineração. Ambos serviriam ainda para suportar a base argumentativa governamental ao longo de todo o processo: a urgência do tratamento dos Resíduos Industriais Perigosos.

Nenhum destes argumentos foi, no entanto, suficiente para anular o movimento de protesto que buscava outra solução, evidenciando desconfiança e incerteza relativamente à política que o governo tentava fazer passar.

De entre os argumentos que serviam de base ao movimento de protesto destacavam-se a «convivência» negativa que a população vinha mantendo com a cimenteira desde a sua entrada em funcionamento em 1974 (os estragos provocados nas casas pelas «explosões» da cimenteira, os frequentes «acidentes» na laboração da cimenteira, a constante poluição na via pública, a destruição da agricultura de subsistência, os problemas de saúde da população, etc.) e os perigos que a co-incineração poderia acarretar para a saúde pública, tendo havido, inclusivé, a apresentação de dois documentos justificativos do protesto, tal como nos foi confirmado em entrevista pelo representante da Associação de Defesa do Ambiente de Souselas (ADAS):

«(...) quando foi a discussão pública do estudo de impacte ambiental em Souselas, a ADAS apresentou dois documentos: um de aspecto técnico que foi apresentado pelo João Pardal, e outro relativo aos acidentes que foi apresentado por mim» (Gonçalves, Joaquim, Entrevista pessoal. 24/07/00).

Esta posição assumida pela ADAS demonstra que, desde o início, houve uma tentativa de mobilização do conhecimento disperso, por forma a reforçar as dimensões esquecidas até aí, nomeadamente o trabalho desenvolvido pela Comissão Anti-Poluição existente em Souselas desde 1976, que vinha funcionando como uma espécie de observatório da actividade da cimenteira desde então.

Apesar dos «avisos» que foram sendo feitos ao governo, indiciando a possibilidade de surgirem focos de resistência, a decisão relativa à escolha dos locais foi tornada pública no dia 28 de Dezembro de 1998: Souselas era um dos dois locais onde iria funcionar uma co-incineradora.

Primeiro tempo: «medir forças» ou a redefinição de forças

Os primeiros meses de 1999 acabaram por reflectir uma nova dimensão do processo: a luta de Souselas tinha descido à sua cidade (Coimbra). A variedade e intensidade das iniciativas promovidas fizeram com que este tivesse sido o principal assunto no âmbito do debate político nacional e local. Uma das primeiras iniciativas do movimento foi a constituição da «Comissão de Luta Contra a Co-incineração», que, a título informal, juntou as «forças vivas» da cidade. Com esta comissão, uniram-se as vozes do protesto que, difusamente, vinham tentando contrariar a decisão governamental.

De entre as várias iniciativas promovidas, deve ser destacada a petição promovida pelo jornal local «Diário de Coimbra» em prol da revogação da decisão governamental, petição esta para a qual foram obtidas mais de 50 mil assinaturas, o que representa cerca de 50% da população do concelho de Coimbra. Nesta fase, ao movimento de protesto juntaram-se ainda a totalidade dos partidos da oposição com representação na Assembleia da República.

Aos argumentos da população de Souselas, juntavam-se outros baseados, sobretudo, na localização da co-incineradora. De entre as razões que eram apontadas para o não avançar da proposta governamental, destacavam-se: o facto de a co-incineradora ficar situada junto a um grande aglomerado populacional - Coimbra; a «desvalorização» a que estava sujeita a região centro, uma vez que esta, nunca representando custos políticos elevados para o partido no poder, à semelhança de outras situações anteriores (incluindo governos anteriores), era alvo de discriminação em termos de desenvolvimento económico e social, cabendo-lhe algumas das iniciativas mais impopulares, de que a co-incineração era exemplo; o facto de Coimbra ter um fraco tecido industrial, o que desaconselhava a sua escolha para o tratamento dos resíduos produzidos, sobretudo, em outras localidades. Para além destes argumentos que se prendiam, sobretudo, com a localização, verificava-se que as «palavras de ordem» eram bastante diversas, não havendo um consenso quanto às soluções a propor.

Com a aprovação do projecto de lei, apresentado pelo PSD, que suspendeu a co-incineração até que uma comissão científica determinasse se essa era, ou não, o método mais seguro de tratamento de RIP, no dia 25 de Fevereiro, o movimento de protesto «festeja» o seu primeiro sucesso. Para este sucesso fora decisiva a deslocação do presidente da Associação Cívica de Coimbra «Pro Urbe» ao Parlamento, onde negociou com os partidos da oposição a aprovação do documento do PSD, conseguindo o esbatimento das diferenças e permitindo a unanimidade na oposição ao governo socialista. Sendo um dos momentos que de forma mais visível pôs em evidência uma aproximação da democracia participativa com a democracia representativa, os cidadãos conseguiram mobilizar os representantes parlamentares no sentido de viabilizarem uma decisão política que favorecia o movimento. Simbolicamente, nesse mesmo dia à noite, a população de Souselas concentrou-se em frente à igreja local e fez o «velório» da co-incineração.

O enquadramento legal da Comissão Científica Independente (CCI) ficaria apenas completo com a publicação da Lei nº 20/99, da Assembleia da República, de 15 de Abril, que regulamentava a «Comissão Científica Independente para o Tratamento de Resíduos Industriais Perigosos», e do Decreto-Lei nº 120/99, do governo, de 16 de Abril, que regulamentava a «Comissão Científica Independente de Controlo e Fiscalização Ambiental da Co-incineração». Esta dupla regulamentação da CCI ficava «resolvida» mediante o Decreto-Lei nº 121/99, também de 16 de Abril, onde o governo assumiu que as duas comissões seriam a mesma.

Com a definição da CCI, chegava assim ao fim o primeiro «capítulo» do movimento de protesto. Para trás ficava um caleidoscópio de opiniões, que durante alguns meses haviam «saturado» os meios de comunicação social.

Este capítulo foi marcado pela reivindicação da intervenção de peritos na tomada de decisão. As populações locais, a par com as associações/entidades que se haviam juntado ao protesto, lutaram para que a co-incineração fosse discutida cientificamente, uma vez que havia ficado provada a insuficiência da reivindicação popular junto do governo. Para esta aspiração dos cidadãos muito contribuíram as posições entretanto assumidas por diversos cientistas, contrárias ao processo de co-incineração, que fizeram crer ao movimento de protesto que a ciência estava do seu lado. Com efeito, várias foram as iniciativas em que o saber científico foi articulado com outras formas de saberes com vista à contestação.

Segundo tempo: a instalação da controvérsia científica

O segundo tempo do movimento de protesto começa a delinear-se durante a campanha eleitoral para as legislativas devido às acesas discussões fomentadas neste âmbito. Tendo ganho as eleições, o governo socialista tinha agora um novo Ministro do Ambiente, que, vincadamente, continuou a defender a política da co-incineração.

Durante o mês de Dezembro, altura em que tomou posse a CCI, as associações ambientalistas e cívicas de Souselas e das restantes localidades envolvidas delinearam uma estratégia conjunta de combate à co-incineração, assente nas alternativas já conhecidas para o tratamento da maioria dos resíduos indicados para queima. A luta passaria a ser contra a solução de «fim de linha», independentemente dos locais escolhidos para a sua realização. O movimento ampliava-se e redefinia os seus argumentos.

À semelhança do que se havia verificado no primeiro tempo, a co-incineração voltou a transformar-se no principal assunto da agenda política nacional. A discussão gerada era agora mais alargada, quer ao nível dos seus intervenientes, quer ao nível dos seus conteúdos. Foi a partir da tomada de posse da CCI que a polémica no interior da comunidade científica se generalizou, fazendo com que o debate relativo às diferentes posições sobre o processo se tornasse uma constante.

Uma das iniciativas mais relevantes deste período, foi a realização do «Forum Internacional sobre Co-incineração». Este fórum seria subdivido em dois: um dedicado às alternativas à co-incineração e outro dedicado às questões relativas à participação pública. Estrategicamente, e já com algum atraso, os resultados do estudo da CCI acabariam por ser revelados no dia anterior à realização da primeira sessão do fórum (19 de Maio de 2000), apontando no sentido da continuidade do processo, ainda que recomendassem uma alteração ao nível dos locais inicialmente previstos, mantendo-se a cimenteira de Souselas e substituindo a da Maceira pela do Outão (situada num Parque Natural). O Ministro do Ambiente, em declarações ao jornal «Público» tentava pôr um ponto final neste assunto:

«Quatro cientistas, por unanimidade, são taxativos. É o momento para que a política, neste domínio, se possa basear na ciência e no conhecimento objectivo e não no preconceito, nem na ignorância, nem na demagogia». (20/05/00)

A postura de isolamento do conhecimento científico relativamente aos outros saberes envolvidos tornava-se, nesta fase, um elemento central na defesa da co-incineração, sendo ainda relegadas para um segundo plano as posições defendidas por outros cientistas contrários ao avanço do processo, desvalorizando-as.

A polémica é reacesa e o relatório da comissão é fortemente criticado. No entanto, parte dos meios de comunicação social portugueses encararam a posição tomada pelo ministro de forma bastante positiva pois, embora houvesse contestação, o urgente era apresentar medidas e solucionar problemas, independentemente da fórmula ser ou não a mais correcta. Esta situação derivava em grande medida da situação política vivida em Portugal, uma vez que o governo socialista sofria fortes críticas devido à sua passividade perante os problemas do país.

Os resultados da comissão baseavam-se no argumento de que a co-incineração seria o método ambiental e economicamente mais indicado para o tratamento dos resíduos tóxicos. Na opinião destes cientistas, o facto de os processos de redução e de reutilização não estarem a funcionar correctamente em Portugal fazia com que os mesmos fossem excluídos. Do mesmo modo, concluía-se que a queima de resíduos tóxicos em cimenteiras não traria qualquer acréscimo ao nível das emissões atmosféricas para além dos efeitos produzidos pelo funcionamento normal das cimenteiras (Formosinho et al., 2000).

A realização da sessão do Fórum dedicado às alternativas foi marcada por um redobrar das atenções, uma vez que a decisão da CCI já era conhecida. No debate promovido, em que participaram especialistas nacionais e internacionais, o ponto mais mediático foi, contudo, a acalorada discussão entre um dos membros da CCI e os elementos da mesa e a assistência. Neste mesmo debate foi ainda salientado por um especialista da Direcção-Geral de Ambiente da Comissão Europeia o facto de Portugal não estar a cumprir a hierarquia das opções, definida, em 1996, pela totalidade dos seus Estados-membros, em que o tratamento dos resíduos deveria obedecer à seguinte ordem: prevenção, reutilização, reciclagem, valorização energética (co-incineração ou incineração dedicada) e aterro.

O movimento de protesto alegava o facto de a comissão não ter cumprido o seu mandato, uma vez que consideravam que o estudo que haviam feito das alternativas à incineração e à co-incineração se limitava a uma enumeração das mesmas, não tendo sido consideradas em pé de igualdade a «redução», a «reutilização» e a «reciclagem». Mas as críticas ao relatório não se ficavam por aqui. Inúmeros cientistas nacionais apontaram falhas nos resultados obtidos e demonstraram o seu desacordo relativamente aos mesmos. A controvérsia no interior da comunidade científica assumiu, nesta fase, o seu expoente máximo, levando a uma radicalização das posições divergentes. Em associação com o movimento de protesto, acusavam ainda o governo de estar a «começar a casa pelo telhado» uma vez que os dados relativos à produção e ao destino do resíduos em Portugal não eram conhecidos. Um outro argumento que foi ganhando peso ao longo do processo e que agora era assumido como determinante, prendia-se com o facto de a co-incineração representar o tratamento de uma ínfima parte dos resíduos produzidos em Portugal - e apenas uma parte dos Resíduos Industriais Perigosos - reduzindo, desta forma, a escala do problema.

As reivindicações das populações mais afectadas pela laboração das cimenteiras foram uma constante. Estas reivindicações assentaram, sobretudo, na convivência negativa que mantinham com estas unidades e na desconfiança relativamente às instituições que iriam conduzir o processo e que afirmavam a segurança do mesmo. O fundamento destas posições reside nos largos anos de exposição a níveis de poluição excessivos provocados pelo mau funcionamento das cimenteiras, sem que se verificasse um esforço por parte dos decisores políticos ou da gestão destas empresas no sentido da sua diminuição. A maior visibilidade deste tipo de posições defendidas pelas populações locais trouxe mais relevo às relações entre problemas ambientais e saúde pública. Efectivamente, o facto de viverem em situações de perigo faz com que as populações tenham acesso a tipos de informação acerca delas próprias e do ambiente onde se inserem antes mesmo que estas sejam visíveis exteriormente (Kleinman, 2000; Brown, 2000). A denúncia de situações problemáticas a esse respeito insere-se no contexto da chamada «epidemiologia popular» (idem), actualmente bastante em foco.

A juntar aos argumentos decorrentes de vivências pessoais, permaneceu sempre uma questão, para a qual nunca foi dada resposta: por que razão, e independentemente das localizações apontadas, todas as situações previstas apontavam a realização da co-incineração em duas unidades cimenteiras, uma da Secil, outra da Cimpor?

Como se deixa adivinhar, apesar de a CCI ter emitido o seu parecer, o que poderia significar o final do processo, o movimento de contestação não baixou os braços e as iniciativas sucederam-se. De entre elas, destacam-se a realização da segunda sessão do Fórum dedicado ao tema da participação pública.

Mesmo no limiar deste segundo tempo ganhava força, ao nível do movimento de contestação, a defesa de uma solução para o problema baseada no bom senso. Propunha-se a negociação do conflito instalado com base numa situação da qual, todos os intervenientes sairiam ganhadores, ao invés dos tradicionais desfechos ganhador-perdedor. Nas palavras do presidente da Associação Cívica de Coimbra «Pro Urbe», a questão era assim colocada:

«Se, depois delas tomadas [as alternativas à co-incineração propostos pelo movimento de contestação], houver ainda resíduos para queimar, o que é provável, eles deverão ser distribuídos por todas as cimenteiras segundo a sua capacidade. A favor dessa distribuição militam muitas razões: se todas as cimenteiras forem, como devem, requalificadas, todas estão nas mesmas condições para queimar resíduos; se não há nenhum risco para a saúde ou para a ecologia, não há nenhuma objecção lógica a esta distribuição territorial; se há risco para a saúde, como é reconhecido nos países que adoptam a co-incineração, a distribuição difusa da fonte do risco é sempre preferível, em termos de análise de risco, à sua concentração; além do mais, com esta medida, será possível eliminar o síndroma ‘nunca no meu quintal’ e promover uma verdadeira solidariedade nacional; acresce que como as soluções de queima são hoje consideradas pela UE, além da quarta prioridade, transitórias, a distribuição territorial permitirá mais facilmente avaliar impactos e decidir reduções.

As soluções que aqui proponho, além de corresponderem às exigências comunitárias, são exequíveis a curto prazo e permitiriam pôr fim a conflitos que corroem a credibilidade de todos os envolvidos. São, acima de tudo, soluções de bom senso. É ainda possível parar a bola de neve da insensatez?» (Público, 14/06/00).

Através da iniciativa parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», a Assembleia da República voltava a pôr um travão à co-incineração. Com efeito, a proposta deste partido assentava na suspensão do processo, mediante a alteração da Lei nº 20/99, até que fossem avaliados os riscos da co-incineração em termos de saúde pública, tendo sido constituída uma nova comissão de peritos - o Grupo de Trabalho Médico - para avaliar esses efeitos.

Todas as cartas voltavam a estar em cima da mesa. Seguiu-se um novo período de reflexão.

Quanto à petição promovida pelo «Diário de Coimbra» que, em Janeiro de 1999, havia recolhido mais de 50 mil assinaturas, esta só foi debatida na Assembleia da República no dia 29 de Junho de 2000, passados que estavam os períodos de maior discussão, tendo sido ignorada durante dezassete meses. A (não) importância atribuída pelo governo à participação dos cidadãos ao longo deste processo ganhou neste episódio a sua imagem mais marcante.

Terceiro tempo: A saúde pública

Nesta fase, as preocupações do movimento de protesto centraram-se de forma muito concreta na defesa da saúde pública das populações afectadas. A constituição do Grupo de Trabalho Médico (GTM) respondia a uma das suas principais aspirações.

Este período caracteriza-se ainda pelo «regresso» do protesto a Souselas, uma vez que a cidade de Coimbra «virou as costas» às iniciativas promovidas pelo movimento de protesto.

As conclusões do GTM foram tornadas públicas em Dezembro de 2000, garantindo a inocuidade da co-incineração para a saúde das populações afectadas. Neste relatório era ainda referido que os riscos decorrentes da actividade de uma co-incineradora eram «socialmente aceitáveis» (Barros et al., 2000).

De entre os vários elementos que compunham o GTM, apenas um se mostrou contrário a estas conclusões, tendo votado contra. Foi este voto que permitiu que o movimento de protesto contra a co-incineração mais uma vez ganhasse terreno ao nível da contestação. Um outro elemento trouxe credibilidade à luta: o reconhecimento silencioso do erro operado pela CCI. Com efeito, a publicação do relatório do GTM foi acompanhada por uma «nova versão» do Relatório da CCI, tendo «caído» das páginas deste novo relatório algumas das descrições e referências que mais fortemente haviam sido criticadas pelo movimento de contestação, nomeadamente a comparação que havia sido feita com as emissões efectuadas pelas lareiras domésticas. Nunca tendo admitido o seu erro, a CCI, que vincadamente afirmou a sua certeza, acabaria por desta forma dar razão a alguns dos argumentos avançados pelo protesto.

Durante o período de discussão pública do relatório do GTM, que se estendeu até Março de 2001, surgiram algumas das iniciativas mais marcantes de todo o processo, de entre as quais, a apresentação de um relatório sobre o estado de saúde da população de Souselas apresentado pela CLCC, em parceria com o Instituto de Higiene e Medicina Social da Universidade de Coimbra. Este estudo surgia como reacção ao que havia sido elaborado pelo GTM, nomeadamente pelo facto de terem sido apresentadas conclusões relativas aos efeitos da co-incineração para a saúde pública sem que tivessem sido analisados quaisquer dados existentes, ou sem que tivesse sido feita qualquer visita dos elementos deste GTM às localidades afectadas. O estudo apresentado pela CLCC concluía que a população de Souselas era já portadora de um elevado «défice» de saúde, manifestado, sobretudo, nos «tipos de patologias em que os factores ambientais assumem particular relevância, como nas patologias repiratórias e no cancro da mama» (CLCC, 2001), traduzindo-se, assim, na manifestação de uma forma alternativa de epidemiologia.

Afirmando que os 11650 pareceres enviados ao longo do período de discussão pública não haviam trazido «nada de novo» à discussão, o Ministro decidiu avançar com o processo, marcando a fase de testes da co-incineração para os meses seguintes. Foi ainda decidida a realização de estudos epidemiológicos pelos membros da CCI, cujos resultados ficaram fortemente comprometidos com o boicote da população aos testes médicos agendados, uma vez que apenas 2% do total de pessoas abrangidas compareceu nos locais marcados.

De referir, no entanto, que nesta última decisão do Ministro do Ambiente foi também avançado que iriam apenas ser sujeitos a co-incineração os resíduos que não tivessem qualquer outra alternativa de tratamento (excluindo os óleos usados e os solventes orgânicos), o que reduziu substancialmente a proposta apresentada. Ficou ainda por decidir onde iria ser colocada a estação de tratamento dos resíduos que iriam ser sujeitos a queima e a definição concreta de quais seriam esses resíduos. Do lado do movimento de protesto continuam ainda a ser efectuados esforços no sentido de serem encontradas alternativas para os restantes resíduos.

Mais recentemente, na Convenção de Estocolmo (2001), o governo português acabou por revelar a sua oposição a todos os processos que impliquem a produção de poluentes orgânicos persistentes (POP). Esta posição pôs seriamente em causa a defesa de um processo sem risco, tal como foi inicialmente defendida a co-incineração. Por outro lado, a referida convenção veio confirmar a opção dos Estados-membros pelas alternativas não térmicas para o tratamento dos resíduos tóxicos, uma vez que a incineração e a co-incineração são centrais ao nível da produção de POP. Este exemplo, entre outros, é um dos indicadores da duplicidade de discursos adoptados pelo governo nacional, assumindo uma postura externa que difere substancialmente daquela que é assumida internamente, i.e., apostando numa actuação diferenciada consoante seja encarado como um membro da União Europeia, ou consoante seja encarado como regulador do espaço nacional.

 

3. As implicações do movimento numa dupla óptica de saberes e poderes

Foi o desbravar das possíveis consequências associadas à decisão governamental que permitiu a emergência da controvérsia no interior da comunidade científica, um dos elementos decisivos ao longo de todo o processo. O facto de parte dessa comunidade se ter associado ao movimento de cidadãos fez com que tivesse ganho força e visibilidade e, ao mesmo tempo, conferisse credibilidade à contestação. Esta dimensão foi seguramente reconhecida pelos intervenientes no processo de contestação, tal como é visível em algumas declarações proferidas:

«Há, realmente, uma grande divergência de posições sobre esta matéria na comunidade científica. Portanto, como cidadão, não tenho formação nenhuma nesta área (...) mas, aquilo que eu estava a dizer é que na comunidade científica houve tantas, mas tantas divergências que se vê, realmente, que é bastante problemática esta questão dos Resíduos Industriais Perigosos. (...) [ao nível da contestação] funcionou bem porque a comunidade científica, de certa forma, ouviu as populações. Porque eu não acredito (...) naquilo que dizem alguns técnicos que estão do lado do governo e do poder económico, que os maus [cientistas] são os que estão do lado das populações e eles é que são os bonzinhos. Não acredito! Não acredito porque temos experiências de todos os tempos e de todas as áreas que nos dizem precisamente isso» (Figueiredo, José, Entrevista pessoal. 18/07/00.).

A associação entre saberes científicos e saberes leigos acabaria por se revelar a dois níveis: por um lado, democratizou a luta, no sentido de colocar no mesmo patamar discursivo os dois lados do protesto, por outro, ao verificar-se a realização do debate nos termos da própria ciência, conduziu a uma permanente reivindicação de um lugar para o saber e experiência dos «leigos», abrindo espaço para a necessidade de adequação e relacionamento do conhecimento a determinados contextos sócio-espaciais particulares, nomeadamente, ao nível dos problemas ambientais. Num processo como este, que envolveu questões de risco e incerteza, tornou-se explícito que ao manter as discussões no âmbito restrito da ciência se eliminaram muitas das suas dimensões. Com efeito, as questões suscitadas ao nível da percepção de riscos por parte das populações são exemplificativas da necessidade de articulação dos diferentes tipos de saber. Em primeiro lugar, há que considerar que «apesar de o conhecimento sobre os riscos que nos rodeiam ser partilhado de forma desigual, os riscos são uma parte da experiência quotidiana que todos têm» (Ross, 1996) e, neste sentido, os diferentes actores envolvidos no processo podem legitimamente reivindicar a sua autoridade na definição e solução dos problemas identificados. O facto de estarmos perante um movimento de enorme complexidade, cujas implicações são imprevisíveis, reitera a necessidade de articulação dos diferentes saberes e dos benefícios que daí podem decorrer, uma vez que as perspectivas parciais, ao invés de limitadas, devem ser encaradas enquanto formas privilegiadas para a produção do conhecimento em condições que vão para além das práticas experimentais e de observação das ciências (Nunes, 1999). No caso da co-incineração, perante a situação de conflito gerada no primeiro tempo, a opção recaiu numa solução de base científica, deixando de lado modos de conhecimento cuja participação teria sido relevante para informar a decisão. O relegar da experiência para um segundo plano, fez com que a análise do problema não tivesse considerado algumas informações que só os cidadãos residentes nas localidades directamente afectadas poderiam ter conhecimento, como sejam: a regularidade com que se verificam acidentes ao nível da laboração das fábricas; o carácter estável ou instável das emissões produzidas por essas mesmas fábricas; a incidência, ou não, de determinado tipo de doenças ao nível das populações e/ou dos animais, entre outras. Efectivamente as pessoas residentes na localidade têm uma memória activa daquilo que se tem passado ao longo dos anos, têm consciência dos riscos e de como os devem enfrentar e, à luz das suas experiências quotidianas, têm um profundo sentimento da moralidade (ou falta dela) da decisão. Ao fim de mais de 20 anos de existência de protesto, através da Comissão Anti-Poluição, as pessoas uniram-se, sentindo-se fragilizadas mesmo apenas com a possibilidade de acrescentar algo mais à laboração «normal» da cimenteira. O conhecimento das condições locais foi, aliás, um dos argumentos mais utilizados e serviu de mote a um dos primeiros documentos de contestação, apresentado pela Associação de Defesa do Ambiente de Souselas. Um dos entrevistados colocava assim esta questão: «A poluição não é só aquilo que sai das chaminés, é aquilo tudo que a fábrica põe em redor (...) não podem ser os políticos que vêm de Lisboa ou do Porto ou vêm de outro local que chegam a Souselas, por exemplo, e sabem o que nós sofremos na pele» (Gonçalves, Joaquim, Entrevista pessoal. 24/07/00.). Um outro entrevistado referiu mesmo que «a ciência, a teoria sem experiência é falência» (Lucas, Adriano, Entrevista pessoal. 18/08/00).

No entanto, ao longo de todo o processo assistimos a uma enorme assimetria entre a importância que foi concedida aos argumentos apresentados em sucessivos relatórios científicos e as condições sociais da aplicação das medidas políticas ou os saberes vividos expressos nas opiniões ou experiências dos cidadãos, catalogados sumariamente de ignorantes.

Os saberes que foram considerados enquanto válidos para a resolução do problema apontam para uma solução tipicamente moderna relativamente a um problema pós-moderno, uma vez que as conclusões utilizadas na decisão, para além de não se estenderem para além do conhecimento científico, permitiram uma associação entre os cientistas que produziram estes mesmos resultados e os decisores políticos. Um dos problemas da «utilização da ciência como instrumento de legitimação está no facto de esta obscurecer as preocupações políticas e económicas mais vastas» (Irwin, 1996), situação esta que não passa à margem dos intervenientes nos processos, que, desde logo, perceberam o peso económico que era representado pelas cimenteiras e a salvaguarda dos seus interesses que inicialmente havia sido negociada com o governo. Por outro lado, o movimento de protesto sentiu-se impotente perante o poder económico que estava por detrás da decisão, sendo sintomáticas as declarações de alguns dos intervenientes no movimento de protesto: «Penso que na base disto tudo tem estado o negócio» (Nogueira, Mário, Entrevista pessoal. 27/07/00); «As cimenteiras iriam poupar milhões de contos ao nível do combustível (...) e isto tem de ser tido em conta» (Moreira, António, Entrevista pessoal. 19/07/00). Há, por isso, que reafirmar que a decisão governamental, que teve como base os relatórios científicos, foi tomada com a oposição dos cidadãos dos locais directamente afectados, dos partidos da oposição, das associações ambientalistas e de parte da comunidade científica.

No entanto, neste caso, a atitude de sentido regulatório por parte do Estado não foi acompanhada por um défice de participação dos cidadãos que, pelo contrário, continuaram a medir forças com o governo. As relações que se estabeleceram entre o Estado e os cidadãos permitiram uma maior visibilidade da desigualdade entre as partes envolvidas. Efectivamente, no movimento que aqui apresentamos, apesar da participação efectiva dos cidadãos, houve uma tentativa permanente por parte do governo no sentido de ignorar as reivindicações dos cidadãos em matérias que iriam afectá-los directamente, situação que, naturalmente, é criticada pelos seus intervenientes:

«O governo (...) tem agido mal porque, por um lado, não tem considerado a opinião das pessoas, o que acho que é fundamental em qualquer situação deste tipo, e, depois, não tem tido, de facto, uma intervenção isenta. (...) As pessoas estão desconfiadas porque nunca ninguém lhes provou que não há motivos para isso». (Nogueira, Mário, Entrevista pessoal. 27/07/00)

O facto de o movimento de protesto ter «descansado» nos períodos entre relatórios científicos serviu de argumento para que a posição favorável ao avanço do processo tentasse deslegitimar a sua acção. No entanto, apesar de, como já referimos anteriormente, não podermos falar de um movimento de protesto à escala nacional, nem tão pouco de um sentimento generalizado de oposição relativamente à decisão do governo, não podemos igualmente anular as muitas «portas» que se abriram a partir desta contestação. Uma das críticas mais acesas foi, como já referimos igualmente, o facto de se tratar de um movimento de base local com interesses meramente localistas. Ora, não nos podemos esquecer que ao nível das questões ambientais, a identificação dos problemas ao nível local é um dos factores determinantes para que estes se possam tornar visíveis e, desta forma, ser ampliada a sua discussão. Sob a acusação do NIMBYismo, foi completamente relegada a possibilidade de as pessoas contribuírem para a discussão e procura de soluções para o problema, tendo como recurso o saber vivido. Se esta crítica tem a seu favor o facto de chamar a atenção para o enviesamento de uma questão que é mais alargada, pode igualmente ter o risco de promover uma oposição entre o local e o global. Acresce ainda o facto de, neste caso, facilmente poderemos verificar que vários tipos de argumentos estiveram sempre presentes: no primeiro tempo, com maior visibilidade para os argumentos de base local, e, inversamente, com maior incidência para os argumentos mais «globais» nos segundo e terceiro tempos. Resulta desta evolução que a força impressa ao movimento cresceu e impediu a paralisação da acção por via das críticas que lhe foram dirigidas. Estando o processo ainda em curso, e tendo sido já desenvolvidas inúmeras articulações entre as diferentes iniciativas locais, tendo igualmente sido desenvolvidas algumas alianças de âmbito nacional, resta o envolvimento da sociedade civil e do Estado para que as mesmas reivindicações e iniciativas locais se baseiem num princípio de tipo NIABY (Not in Anyboby’s BackYard). Com efeito, vários têm sido os avanços neste sentido proclamados pelos intervenientes ao nível do movimento de protesto:

«(...) este processo da co-incineração correu bastante bem. Do ponto de vista da participação e das contribuições que têm sido dadas, acho que é dos melhores processos que têm havido. Aliás, sob esse ponto de vista, acho que está a abrir muitas vias novas cá em Portugal porque muitas das coisas nunca aconteceram».

«(...) não há dúvida que esta história da co-incineração, que espero que continue a dar polémica (...), já fez avançar mais estas questões no espírito das pessoas do que dez anos de luta miudinha e dez anos de acções de educação ambiental para os pequeninos, ou, até mesmo, vinte anos.» (Silva, João Gabriel, Entrevista pessoal. 29/08/00)

«(...) há algumas vitórias: a vitória das pessoas que têm opiniões e que têm sugestões - pessoas e organizações -, porque às sugestões que se apresentaram, acrescentaram-se outras tantas. Ninguém pode ter uma resposta para um problema que é global, ninguém tem uma varinha mágica para resolver este problema, portanto, há uma vitória em termos de recuo das posições governamentais e das posições das comissões científicas». (André, António, Entrevista pessoal. 20/07/00)

Ainda quanto à postura dos cientistas favoráveis à co-incineração, o discurso utilizado ao longo de todo o processo extravasou em muito o princípio do cepticismo organizado (Santos, 1996), tendo sido sempre vincada uma postura de noções definitivas em relação aos problemas apresentados. Os textos que serviram de suporte aos relatórios científicos não deixaram transparecer em momento algum o princípio da dúvida, simplificando um discurso que, à partida, é caracterizado pela complexidade. Foi, aliás, este conjunto de razões que, a dado momento, não permitiu o reconhecimento formal e público dos erros inicialmente cometidos no relatório que serviu de base à decisão.

No que toca aos efeitos destas movimentações no contexto da sociedade portuguesa, por enquanto são as pequenas transformações que se vislumbram; as grandes, ao que já sabemos, escondem-se do nosso olhar imediato. As soluções dessa transformação têm a forma local; neste caso, só ainda não sabemos se são soluções. Sabendo que, «quanto mais global for o problema, mais locais e mais multiplamente locais devem ser as soluções» (Santos, 1994), ainda resta saber qual a efectiva dimensão do problema e qual a efectiva dimensão das soluções.

 

Conclusão

O movimento de protesto contra a co-incineração tem sido caracterizado por períodos diferenciados de contestação. Até ao presente momento, pudemos identificar três desses períodos, de onde ressaltam as seguintes características fundamentais: no primeiro tempo, a insuficiência da reivindicação popular junto dos decisores governamentais traduziu-se num apelo ao saber de peritos, por forma a fundamentar a decisão; no segundo tempo, a posição tomada pela CCI, totalmente favorável ao avanço do processo de co-incineração, fez com que a contestação se fizesse, sobretudo, por via da controvérsia científica instalada; no terceiro tempo, o alargamento das análises científicas às questões relativas à saúde pública permitiram um reforço da associação que já vinha acontecendo entre parte da comunidade científica e o movimento de protesto, havendo uma aproximação inequívoca às principais preocupações das populações locais.

De entre as suas várias implicações deste processo, é de salientar que os desenvolvimentos promovidos ao longo do movimento de protesto foram sendo construídos e delineados numa dupla base de contingências e universalidades. Assistimos, indiscutivelmente, a uma politização da ciência e a uma cientifização da decisão política.

Apesar de, desde o início, a contestação promovida ter sido acusada de localista, com o desenrolar dos acontecimentos, foram sendo estabelecidas pontes de diálogo e foram sendo suscitadas questões até aí inexistentes no nosso país. O movimento de protesto assumiu ainda uma posição de vanguarda ao posicionar-se contra a chamada «cultura tóxica», uma das questões actualmente mais em voga.

Por outro lado, para o movimento aqui apresentado, o que, à partida, é a face visível da sua fraqueza, deverá ser encarado como a sua grande força: as pequenas transformações visíveis permitiram um repensar da transição, deixando em aberto todo um conjunto de possibilidades de continuação.

O debate instalado demonstrou que, à semelhança das outras formas de conhecimento, também os argumentos da ciência, ou melhor, das ciências, são parciais e cultural e socialmente circunscritos. Recordando os factos, verificamos que a decisão política na sua totalidade foi substituída pelo parecer científico. Com este processo condensaram-se anos de aprofundamento das relações entre ciência e poder político, ao nível da implementação de novas tecnologias, sem que, no entanto, algum espaço fosse deixado em aberto para a participação de outros actores. Pelo contrário, a passagem de testemunho dos governantes para os cientistas assentou na «certeza» e «verdade» dos resultados obtidos e na idoneidade dos cientistas envolvidos, o que, por si só, deslegitimaria os movimentos de protesto. Se num dos lados, se assistia a uma dessacralização do conhecimento científico, do outro, este era consagrado como princípio da vitória sobre a ignorância, a irracionalidade e a emoção. No mesmo terreno, travou-se uma «batalha» paralela ao nível de concepções de conhecimento aparentemente irreconciliáveis. A união entre conhecimento científico e conhecimentos leigos foi desbravando terreno, o que também confere uma tónica de mudança a este processo. O fraco desenvolvimento e o pouco saber acumulado nesta área fariam prever uma maior tolerância face a posições diversas no campo científico e uma maior atenção em relação aos saberes vividos. Os sucessivos recuos que a decisão governamental foi sofrendo reflectem a aceitação de algumas das direcções apontadas pelo movimento de protesto, esbatendo aos poucos o «fantasma de Galileu» inicialmente agitado pelo governo. Ficou assim aberta a possibilidade de identificação dos saberes vividos e da sua exploração para associar ao uso do conhecimento científico uma dimensão mais democrática e emancipatória. A instalação da controvérsia científica, associada aos conhecimentos «rivais» em jogo, abriram caminho à legitimação dos saberes ditos «leigos», bem como a novas constelações de saberes, uma vez que permitiu demonstrar que a ciência também é política.

Ao «destapar» a oposição entre a luta política entendida de modo tradicional e a luta ambiental, o movimento de Souselas encetou um outro modo de fazer a luta política, diferente da que é canalizada pelos partidos e instituições tradicionais. Com efeito, a acção desenvolvida por este movimento procurou organizar e dar voz e visibilidade a identidades colectivas emergentes, que partindo de problemas que são vividos, primeiramente, à escala local, se vão ligando progressivamente a lutas e movimentos de âmbito mais geral, centrados na luta pela defesa do ambiente e pelo direito de participação dos cidadãos em decisões que afectam as suas vidas, a sua saúde e o ambiente.

Tendo chamado a si o direito de participar, os cidadãos foram progressivamente construíndo a sua posição em relação a todo o processo, cada vez mais informada e mais crítica.

 

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