Seminário ECOSOL-CES

A crítica feminista das Epistemologias do Sul  e a invenção do trabalho reprodutivo das mulheres

Teresa Cunha (CES)

2 de maio de 2018, 17h00

Sala 2, CES | Alta

Resumo

Uma crítica feminista das Epistemologias do Sul permite distinguir com maior clareza que a racionalidade abissal inscrita no penso moderno logocêntrico é também androcêntrico e antropocêntrico. Por outras palavras, a separação abissal está também reflectida no sexismo, entendido enquanto sistema de disjunção e hierarquização com base na oposição entre feminino e masculino reduzidos a atributos biossociais criados e alimentados por si.

Os trabalhos de muitas feministas têm vindo a mostrar como as estratégias das mulheres [são cooptadas em] proveito dos homens (Whathouse; Vijfhuizen, 2001) ou como alerta Silvia Federici (2004) inventou-se a mulher como ‘dona de casa’, responsável pelo cuidado e pela infra-estruturação da vida e das condições necessárias para a produção e a consequente acumulação do capital. A transformação do trabalho numa mercadoria, que pode ser comprada em vendida teve, como consequência, uma mudança paradigmática sobre o conceito de trabalho e de economia. Se o trabalho foi entendido durante muito tempo como another name human activity which goes with itself, which in its turns is not produced for sale but for entirely different reasons, nor can that activity be detached from the rest of life, be stored or mobilized (Polany, 1975 [1944]: 72) com a revolução industrial moderna passa a ser as atividades que podem ter valor de troca no mercado capitalista. Sendo assim, os trabalhos das mulheres, realizados fora da esfera industrial e do comércio, ou seja, no espaço doméstico ou da comunidade, uma vez que não assalariados – não têm valor de troca no mercado - deixam de ser trabalho, ou, quando muito, são considerados trabalho reprodutivo. Como afirma Amaia Orozco (2014) a promoção de uma ética reacionária do cuidado está na base do contrato social moderno que continua a manter a obsessão pela conquista dos conhecimentos e dos corpos das mulheres (Federici, 2004) reorganizando e reapropriando os seus modos de vida, as suas atividades, enfim, os seus trabalhos.

Neste seminário tenho dois objectivos fundamentais. O primeiro é fazer uma crítica feminista das Epistemologias do Sul; o segundo, a partir dessa crítica, é reflectir sobre a dicotomia entre trabalho produtivo e reprodutivo. 


Nota biográfica

Teresa Cunha, nascida no Huambo em Angola, é doutorada em Sociologia pela Universidade de Coimbra. É investigadora sénior do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra onde ensina em vários Cursos de Doutoramento; co-coordena o Núcleo de Humanidades, Migrações e Estudos para a Paz (NHUMEP), os ciclos do Gender Workshop e Oficinas das Epistemologias do Sul e o Programa de Investigação Epistemologias do Sul. É investigadora associada do CODESRIA e do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique. Em 2017 , foi agraciada com a Ordem de Timor-Leste pelo Presidente da República Democrática de Timor-Leste. Os seus interesses de investigação são feminismos e pós-colonialismos; mulheres transição pós- bélica, paz e memórias; outras economias e economias feministas; direitos humanos. Tem publicados vários livros e artigos científicos em diversos países e línguas dos quais se destacam: Women InPower Women. Outras Economias criadas e lideradas por mulheres do sul não-imperial; Never Trust Sindarela. Feminismos, Pós-colonialismos, Moçambique e Timor- Leste; Ensaios pela Democracia. Justiça, dignidade e bem-viver; Elas no Sul e no Norte; Vozes das Mulheres de Timor; Timor-Leste: Crónica da Observação da Coragem; Feto Timor Nain Hitu - Sete Mulheres de Timor»; Andar Por Outros Caminhos e Raízes da ParticipAcção.