Seminário Internacional
Espectáculo/Cidade/Teatro: as Representações da Cidade entre o Espectáculo e a Cena Teatral Contemporânea Luso-Brasileira

1 a 3 de Julho de 2009, Sala de Seminários do CES


Sinopses

Abel Neves
Ruína do Futuro
A cidade inexistente é a utopia que pode intuir-se ou materializar-se no teatro. A experiência utópica que acontece no espaço da representação pode sugerir o sentido essencial que nos é negado fora do teatro e com isso revitalizamos o nosso património. A cidade anunciada no teatro faz lembrar uma ruína do futuro.

Ana Raquel Fernandes
À procura de espaço na cena contemporânea luso-brasileira
Considerando o espaço nas suas múltiplas dimensões (físico, mental e social), procura-se analisar o modo como este é representado na cena contemporânea luso-brasileira. Para o efeito, coloca-se em diálogo as seguintes peças: António, um rapaz de Lisboa de Jorge Silva Melo, Casas de Miguel Castro Caldas, Guarda Sol Amarelo, uma criação colectiva, De quem sois? de Ivam Cabral, O Solo do Pianista Morto de Otávio Martins e A coleira de Bóris de Sérgio Roveri.  

Antonio Pedro Pita
Uma Hipótese de Território Cultural
O objectivo da comunicação é desenhar uma hipótese de definição de território cultural, utilizando alguns elementos extraídos da extensa documentação referente a quatro anos de financiamento público das artes.
Para definir um território cultural não basta que existam equipamentos, instâncias de programação e instâncias de criação. É preciso pensar uma geografia específica, consolidar projectos que assegurem a pluralidade de linguagens e de identidades estética, incentivar dinamismos e mobilidades e definir estratégias de visibilidade.
A coesão cultural será tanto maior – isto é: tanto mais radicalmente fundada – quanto mais a expressão das diferenças ocorra no limiar da incompatibilidade.

Armando Nascimento Rosa
A minha alocução procederá a uma breve identificação de modos de presença das imagens da cidade em obras recentes de dramaturgia própria e alheia, incluindo leitura comentada de curtos excertos das mesmas.

Berta Teixeira
Com a apresentação de um practice discourse procurarei contribuir para a reflexão das relações que as manifestações estético-expressivas, nomeadamente o teatro, potenciam e/ou estabelecem com a paisagem da cidade e fornecer um exemplo de como a cena contemporânea de e em Benguela (Angola) acontece «(in)visivelmente» fora dos edifícios teatrais. Apresentarei a residência de troca m.a.r.e.s. como um dos espaços-tempos de cidadania cognitiva, porquanto, cultural da iniciativa «ó da arte» (troca/investigação/criação/reflexão). Esta acção tem como objectivo estimular e promover algumas redes de comunicação e de colaboração entre e dentro de diversas comunidades (científicas, artísticas, geográficas, etc.) lusófonas como projecto de justeza e de beleza social.

Claudino Ferreira
O teatro e a cidade
A comunicação reflecte sobre o papel que os teatros desempenham nas cidades contemporâneas, sobretudo no que respeita à modelação dos seus ambientes culturais. Tendo por base investigação que vem sendo desenvolvida sobre Portugal, e em particular sobre a Região Centro do país, discute-se o modo como os teatros públicos, na sua qualidade de instituições culturais de referência, se relacionam com a cidade e as comunidades urbanas. Ponderam-se as condições que afectam hoje esse papel referencial e que, em consequência das transformações de natureza política, socioeconómica e cultural em curso, colocam novos desafios aos teatros e ao modo dilemático como procuram compatibilizar a sua tradicional missão cultural com missões de cariz mais cívico, político, económico e identitário, relacionadas quer com os projectos e estratégias para os territórios urbanos em que se inserem, quer com os novos imperativos de gestão e competitividade que hoje se colocam aos agentes culturais.

Ingrid D. Koudela
Reflexão acerca da cidade como alegoria no texto espetacular, a partir das contribuições de Heinner Muller e Brueghel. A partir do cruzamento  do jogo, das imagens e das espacialidades  de matrizes distintas, em parte daquelas oriundas de um imaginário popular/medieval, a cidade  surge, em cena, como alegoria, ruínas ou fragmento. Um espaço urbano não delimitado pela cenografia, mas pelo jogo e por signos espaciais não dramáticos.

Jorge Louraço Figueira
Cidadelas Teatrais - Na última década surgiu em Portugal e no Brasil uma mão cheia de autores e encenadores que criaram espectáculos não apenas sobre a cidade mas também para intervir na cidade. Esta comunicação tenta mostrar como esses retratos cénicos da cidade revelam características e estratégias de sobrevivência da produção teatral na cidade, e em que medida foram bem sucedidos.

José Antonio Bandeirinha
O Teatro pressupõe um acto de indómita vontade por parte da comunidade que o acolhe e que o pratica. Os espaços construídos e pensados para o efeito são o testemunho mais claro e insofismável dessa vontade. Pode, sem dúvida, continuar a fazer-se teatro em espaços improvisados, o que deixa de existir é a prova petrificada de que o Teatro é amado e respeitado por todos. Deixa de existir o conteúdo específico do acto, quase tão importante como a essência.

José Simões de Almeida Júnior
O ponto de partida para a discussão é o de compreender o lugar teatral como agente, uma espécie de media definidora do fenómeno teatral. Nesse sentido, o espaço teatral não é concebido como reflexo ou mesmo depósito da cena. Constitui se no território vivido, edificado ou não, para esse fim. Temos, então, o lugar teatral caracterizado pelo uso o que leva-nos a interrogar o quotidiano das cidades com “outro olhar”, na busca de territórios teatrais, não mais “teatros edificados”. São, portanto, outras espacialidades e visibilidades que constroem o imaginário do lugar teatral na paisagem das cidades.

Maria Amélia J. Corá
Construção do imaginário na Política Cultural Brasileira
Pensar em política pública no Brasil é fazer um exercício de construção do imaginário, isso porque a política pública ainda não foi apropriada às discussões cotidianas e com isso os cidadãos brasileiros não sabem quais são os papéis a desempenhar nessa construção.
Vamos exemplificar como as políticas culturais são pensadas no Brasil e em especial na cidade de São Paulo, partindo de iniciativas privadas dos grupos de teatro Satyros e Grupo XIX, seguido por intervenções municipais como os CEUs e a Virada Cultural, e para finalizar, vamos discutir um pouco das mudanças propostas na substituição da lei de financiamento cultural (Lei Rouanet).

Mirian Tavares
No início dos anos 20 o cineasta Sergei Eisenstein estava ainda profundamente ligado ao teatro, onde começou a sua carreira artística. Ele chegou a encenar algumas peças, mas sua principal função, como homem de teatro, era a de cenógrafo. Ao lado do encenador desenhava não apenas os cenários, mas concebia a própria peça a partir da arquitectura do espaço que ele imaginava. Uma das peças para a qual idealizou uma cenografia foi Precipício, de Pletnev. Era preciso mostrar um inventor a correr pela cidade em euforia. E a sua tarefa era resolver a dinâmica das ruas ao mesmo tempo que mostrava um indivíduo a mercê deste espaço grande e assustador. A ideia de Eisenstein, que não foi executada, era construir fragmentos de cidade que seriam incorporados aos corpos das pessoas, cada uma delas era ao mesmo tempo sujeito e objecto e com o movimento de seus corpos provocavam o movimento da cidade, dotando este espaço de dinamismo. Inspirava-se então no Cubismo e na sua visão multifacetada do mundo. Num só gesto o homem convertia-se, ele mesmo, na cidade, como se ambos fossem uma única coisa. A cidade apresentada no palco era além de metafórica, metonímica. Mesmo porque Eisenstein sabia que a grande diferença entre o teatro e o cinema era que um representa o espaço. O outro, apresenta. Ou finge apresentar. Uso este exemplo para ressaltar as dessemelhanças entre estas duas artes quando se trata de trabalhar o espaço urbano: no palco e no ecrã a cidade assume diferentes figurações, mesmo que não altere o seu significado. O cinema utiliza o espaço cénico como espaço do artifício, o que faz com que o carácter de realidade do filme seja ainda mais acentuado. Nesta palestra irei falar sobre as diferentes formas de apresentação/representação do espaço urbano a partir da experiência dupla de Eisenstein como encenador e realizador de cinema, passando por alguns exemplos contemporâneos de filmes onde o espaço cénico é explorado como espaço do artificial e do não-visível.

Newton Moreno
Pretendo abordar o processo de construção do espetáculo ASSOMBRAÇÕES do RECIFE VELHO livre adaptação de minha autoria da obra do sociólogo brasileiro Gilberto Freyre. O espetáculo é um poema fragmentado de amor à cidade do Recife (no Nordeste de Pernambuco) que elenca alguns 'fantasmas' de sua formação, é como se através das lendas que o povo recifense elegeu pudéssemos entender as grandes cicatrizes no processo de construção de sua identidade. Abordaremos também como a montagem inicial utilizava-se de um casarão abandonado, na tentativa de dialogar (e jogar foco) para as construções históricas grávidas de memória que desabam sem o menor cuidado do poder público. O espetáculo quer discutir como tratamos nossa memória.

Paulo Peixoto
A cidade performativa
Nos anos 30 do século passado, Lewis Mumford propôs-se entender a cidade como um teatro da acção social. A perspectiva de Mumford continua tão actual quanto o era há 80 anos atrás. A “cena urbana”, os “dramas urbanos”, a “arte pública”, a “plasticidade do espaço público”, a “espectacularização do quotidiano”, a “concorrência entre cidades”, entre outras, são noções que nos dão conta do alargamente incessante da dimensão performativa das cidades. A economia das experiências, os rankings, e a necessidade do fazer acontecer através da radicalização das proposta de intervenção, assinalam a presença das lógicas teatrais e da performance nas cidades.

Rogério Proença Leite
A espetacularização da cidade contemporânea:notas para uma comparação entre vida urbana e cena teatral
As cidades contemporâneas, sobretudo, as cidades históricas, estão cada vez mais a se transformar em verdadeiros cenários espetaculares  monumentais de uma tradição reinventada. Essa comunicação pretende discutir, tendo por base os proc essos contemporâneos de intervenções urbanas, em que medida podemos de fato falar de uma “teatralização” da vida cotidiana no contexto atual da cultura urbana contemporânea; e que em que medida as cidades contemporâneas podem ser consideradas cenários da vida pública, no sentido de espaços cenográficos construídos para a estetização das sociabilidades.

Rui Pina Coelho
A partir de Assombrações do Recife Velho, de Newton Moreno (Brasil) e de Este Oeste Édem, de Abel Neves (Portugal) é possível cartografar as cidades afectivas bem como o tecido urbano que é metáfora para as cidades imaginadas pelos seus autores. Este comentário visa interpelar estas duas construções de uma paisagem emotiva e evocativa buscando as suas razões e modos de ser. Rui Pina Coelho

Sílvia Fernandes
Cartografia de BR3
O objetivo do texto é analisar o espetáculo BR3, do Teatro da Vertigem, estreado no dia 10 de fevereiro de 2006, no rio Tietê, em São Paulo. O intenção do projeto foi investigar possíveis identidades brasileiras, ou não-identidades, a partir do estudo e da vivência em três lugares do país: Brasilândia, bairro da periferia de São Paulo, Brasília, no Distrito Federal, e Brasiléia, pequena cidade da fronteira do Acre com a Bolívia.  As regiões foram escolhidas pelo radical de nacionalidade e por formarem territórios de exceção, em que a idéia de país é posta em xeque, bem como conceitos definidos de periferia e centro, arcaico e moderno, exclusão e cidadania, es petacular e não espetacular. A cidade planejada, a cidade de fronteira e a cidade periférica projetam territórios em que a idéia de pertencimento nacional é enfraquecida por noções de borda e identidades instáveis substituem os sujeitos seguros da brasilidade.
Inicialmente, localizo as três cidades pesquisadas pelo grupo e a seguir analiso a dramaturgia de Bernardo Carvalho, trabalhada pelos atores em workshops e improvisações, que une Brasília, Brasilândia e Brasiléia na saga de uma família de brasileiros. A encenação de Antonio Araújo no rio Tietê, ambientada nas margens, em pontes, viadutos e barcos, é último aspecto enfocado no texto. 

Susana Constantino
Construídos no período de vigência do Estado Novo, os Cine-Teatros são obras que materializam a conciliação dos espectáculos de cinema e teatro num edifício único e que se vão assumir como o grande equipamento cultural das localidades onde se inserem, contribuindo para o redesenho e reforço de novas centralidades urbanas.Alguns destes edifícios, de diferente modo, chegaram até aos dias de hoje e conformam ainda o território contemporâneo português.

Vera Borges e Maria Angélica Alberto
Da “transformação em lanternas” (caso brasileiro) ao “mundo perfeito” (caso português): a formação e o mercado teatral.
A formação realizada no interior dos grupos de teatro, entre amigos, e a aprendizagem pela experiência inter-geracional desempenham um papel importante na formação inicial dos actores. O “amor à arte” ajuda a explicar, em parte, a persistência dos actores neste mercado de trabalho precário e incerto, mas a escola e as comunidades locais parecem mais do que nunca “piscar-lhe o olho”. A partir dos resultados de duas investigações, uma desenvolvida em Portugal e a outra em curso no Brasil, pretendemos discutir as tensões e as ambiguidades que existem em torno da tríade: “amor ao teatro”, formação e trabalho. Mostraremos até que ponto os grupos de teatro se assumiram como “escolas de actores”, sendo hoje a escola e a comunidade local que levam os candidatos a actores ao teatro, através de estratégias originais de emprego no mercado artístico.

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