O sincretismo religioso presente na obra "O pagador de promessas", de Dias Gomes
Rosa Maria Mijas Beloto (Faculdades Integradas Teresa Martin de São Paulo)
rosabe@uol.com.br

Sincretismo, nesta comunicação, é a fusão de elementos culturais diferentes, ou até antagônicos, em um só elemento; é a tendência à unificação de idéias ou de doutrinas diversificadas e, por vezes, até inconciliáveis.
Na época da escravidão, os negros africanos, não podendo praticar livremente seus cultos religiosos, procuravam burlar a vigilância dos senhores brancos, fingindo cultuar santos católicos, quando, na verdade, adoravam deuses nagôs.
Quando se trata da presença de elementos da cultura africana na Literatura Brasileira, imediatamente o nome de Jorge Amado é lembrado, já que sua obra é repleta desses elementos. No Brasil, no entanto, há uma premiada peça de teatro da atualidade literária - "O pagador de promessas", de Dias Gomes - que tem como motivo o sincretismo religioso, ainda comum nas regiões brasileiras, sendo a Igreja do Nosso Senhor do Bonfim (na Bahia) seu símbolo máximo.
Zé-do-Burro, protagonista desse drama e assim chamado porque seu burro Nicolau é seu melhor amigo, promete a Iansã (da mitologia africana) que levará uma enorme cruz de madeira até a Igreja do Bonfim caso Nicolau se cure da grave doença que o vitimou. O "amigo" é curado e Zé-do-Burro carrega a pesada cruz até a Igreja do Bonfim, pois lá existe uma imagem idêntica à da santa que concedeu essa graça (Santa Bárbara, do Catolicismo). Diante da porta da igreja e do seu responsável, o Padre Olavo, Zé-do-Burro vive uma seqüência de acontecimentos que culmina com um final trágico, só porque para aquele homem simplório Iansã e Santa Bárbara são a mesma santa. Afinal, a imagem é a mesma para ambas. Padre Olavo argumenta que Zé-do-Burro fez a promessa para uma santa e está querendo cumpri-la para outra e não permite sua entrada na Igreja do Bonfim. Durante todo o tempo em que tenta cumprir sua promessa, Zé-do-Burro representa as classes populares tentando vencer a intolerância e o domínio das classes poderosas, representadas pelo Padre Olavo. Esta comunicação mostrará que Zé-do-Burro, apesar do seu final trágico, sagra-se vencedor nesse "combate"da mesma maneira que os negros escravos venceram seus senhores brancos através do sincretismo religioso.
A obra "O Pagador de Promessas", de Dias Gomes, recebeu 07 (sete) prêmios de Teatro, desde sua estréia em 1960 no Teatro Brasileiro de Comédia (mesmo sendo uma tragédia). Essa obra é muldialmente conhecida, porém, na sua versão cinematográfica, dirigida por Anselmo Duarte, que recebeu 09 (nove) prêmios nacionais e internacionais, dentre eles a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1962. Seu autor, Alfredo de Freitas Dias Gomes, destacou-se na Literatura como dramaturgo, escrevendo " A invasão", "O Santo Inquérito", "As primícias" e "O Rei de Ramos" , mas se popularizou como autor de telenovelas e como esposo da "rainha" da teledramaturgia brasileira, Janete Clair. "O bem-amado" e " Roque Santeiro" as telenovelas mais famosas de Dias Gomes. A obra que o imortalizou em nossa Literatura, sem dúvida alguma, é "O Pagador de Promessas", da qual nos utilizaremos para tratar do tema central desta comunicação.

 

Livreiros e editores: livro mediado e comunidades de leitura
Nuno Miguel Ribeiro de Medeiros (Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa)


Resumo da comunicação:
O propósito desta comunicação é propor uma reflexão em torno de dois agentes de mediação entre autor e leitor associados à esfera do livro: o editor e o livreiro. O eixo central é, justamente, tentar perceber de que modo participam na leitura, encarada aqui como um conjunto de modos de apropriação e recepção do livro (tomado como objecto físico reconhecível e como metáfora do discurso fixo e ordenado tornado público), incluindo práticas sociais associadas às interpretações de sentidos do seu conteúdo e da sua forma. Pretende-se, por isso, proceder à exploração da ideia dos livreiros e dos editores enquanto elementos activos na estruturação da oferta de leituras possíveis ao leitor, procurando-se analisar o papel de mediação que desempenham no universo social do livro.

Este objectivo é correlativo de uma demarcação clara das visões que outorguem ao autor e ao campo autoral (assente, muitas vezes, em arenas onde se desenrolam estratégias de influência política e emergência mediática ou onde se assiste à correlação de forças entre escolas, movimentos e estilos) o único poder na definição do que se lê e de como se lê, conferindo extensa autonomia aos autores na forma como influenciam os públicos e as modalidades de leitura e, portanto, atribuindo uma condição passiva à leitura, negando ao leitor competências imaginativas de re-criação dos sentidos do que lê e não reconhecendo a outros actores e instâncias sociais ligados ao livro um papel activo e dinâmico na informação ou conformação das leituras de uma obra ou de um autor, como a escola, o crítico, o distribuidor, a biblioteca, a censura, a tertúlia, o prefaciador, a família.

É essencial sublinhar que a leitura pode não radicar nas idiossincrasias de um acto individual, remetendo - muitas vezes através da actuação de agentes de mediação - para conjuntos alargados de significados, isto é, para leituras partilhadas, muitas vezes discutidas, extravasando a apropriação pessoal e podendo dar lugar à formação de verdadeiras comunidades de interpretação ou de leitura. As comunidades de leitura derivam de certas afinidades electivas que as pessoas podem ter entre si relativamente a um género, um tema ou um autor, sem que daí derive um sentimento consciente e percebido de comunidade.

Avançado a partir destes pressupostos, importará conhecer os editores e os livreiros, verdadeiros sujeitos de apreciação e de classificação do real, configuradores de redes sociais de autorização de significado. Os textos que publicam e que vendem, constitutivos de um mercado e obedecendo a escolhas, devem ser lidos e apreendidos sem desvio. O comércio do livro institui-se simultaneamente como o guardião e o criador constante de uma dada cultura escrita, constituindo-se os seus representantes como agentes de selecção e de organização do pensamento com acção fundamental na estruturação do próprio campo literário do contexto social e histórico em que intervêm.

Livreiro e editor são parte integrante da trama que se urde em torno da leitura e das comunidades (mesmo se imaginadas, como os leitores do género policial ou de ficção científica) que se formam em torno de um conjunto partilhado de consumos, gostos, interpretações ou inclinações. Reflectir sobre a leitura e sobre o livreiro e o editor é perspectivar os dois últimos como instâncias de mediação entre um produto (ou entre um autor) e o seu consumidor dinâmico e inventivo. Editar e gerir uma livraria consiste, não somente nas tarefas de identificar e isolar o que se denominaria de "subculturas do gosto", mas também, ou sobretudo, no incentivo à emergência ou modificação dessas mesmas subculturas. Assim, a escolha do leitor, livre em abstracto, deriva de encaminhamentos e de constrangimentos.

 

O sincretismo religioso presente na obra "O pagador de promessas", de Dias Gomes
Rosa Maria Mijas Beloto (Faculdades Integradas de São Paulo)

Sincretismo, nesta comunicação, é a fusão de elementos culturais diferentes, ou até antagônicos, em um só elemento; é a tendência à unificação de idéias ou de doutrinas diversificadas e, por vezes, até inconciliáveis.
Na época da escravidão, os negros africanos, não podendo praticar livremente seus cultos religiosos, procuravam burlar a vigilância dos senhores brancos, fingindo cultuar santos católicos, quando, na verdade, adoravam deuses nagôs.
Quando se trata da presença de elementos da cultura africana na Literatura Brasileira, imediatamente o nome de Jorge Amado é lembrado, já que sua obra é repleta desses elementos. No Brasil, no entanto, há uma premiada peça de teatro da atualidade literária - "O pagador de promessas", de Dias Gomes - que tem como motivo o sincretismo religioso, ainda comum nas regiões brasileiras, sendo a Igreja do Nosso Senhor do Bonfim (na Bahia) seu símbolo máximo.
Zé-do-Burro, protagonista desse drama e assim chamado porque seu burro Nicolau é seu melhor amigo, promete a Iansã (da mitologia africana) que levará uma enorme cruz de madeira até a Igreja do Bonfim caso Nicolau se cure da grave doença que o vitimou. O "amigo" é curado e Zé-do-Burro carrega a pesada cruz até a Igreja do Bonfim, pois lá existe uma imagem idêntica à da santa que concedeu essa graça (Santa Bárbara, do Catolicismo). Diante da porta da igreja e do seu responsável, o Padre Olavo, Zé-do-Burro vive uma seqüência de acontecimentos que culmina com um final trágico, só porque para aquele homem simplório Iansã e Santa Bárbara são a mesma santa. Afinal, a imagem é a mesma para ambas. Padre Olavo argumenta que Zé-do-Burro fez a promessa para uma santa e está querendo cumpri-la para outra e não permite sua entrada na Igreja do Bonfim. Durante todo o tempo em que tenta cumprir sua promessa, Zé-do-Burro representa as classes populares tentando vencer a intolerância e o domínio das classes poderosas, representadas pelo Padre Olavo. Esta comunicação mostrará que Zé-do-Burro, apesar do seu final trágico, sagra-se vencedor nesse "combate"da mesma maneira que os negros escravos venceram seus senhores brancos através do sincretismo religioso.
A obra "O Pagador de Promessas", de Dias Gomes, recebeu 07 (sete) prêmios de Teatro, desde sua estréia em 1960 no Teatro Brasileiro de Comédia (mesmo sendo uma tragédia). Essa obra é muldialmente conhecida, porém, na sua versão cinematográfica, dirigida por Anselmo Duarte, que recebeu 09 (nove) prêmios nacionais e internacionais, dentre eles a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 1962. Seu autor, Alfredo de Freitas Dias Gomes, destacou-se na Literatura como dramaturgo, escrevendo " A invasão", "O Santo Inquérito", "As primícias" e "O Rei de Ramos" , mas se popularizou como autor de telenovelas e como esposo da "rainha" da teledramaturgia brasileira, Janete Clair. "O bem-amado" e " Roque Santeiro" as telenovelas mais famosas de Dias Gomes. A obra que o imortalizou em nossa Literatura, sem dúvida alguma, é "O Pagador de Promessas", da qual nos utilizaremos para tratar do tema central desta comunicação.



Línguas, cultura e literatura oral em São Tomé e Príncipe
Ayres Veríssimo Major (Direcção. Geral de Cultura - S. Tomé e Príncipe)
cultura@cstome.net

S. Tomé e Príncipe é um país que vale a cada palmo pela sua diversidade cultual, como mostram as suas danças, a sua música, as línguas nacionais, o teatro, os usos e costumes, a medida que se avança da capital para Norte ou para Sul.
Pela teatralidade dessas danças, pela força da sua música, pela intensidade e significado que cada uma delas representa (estando uma grande parte em vias de extinção), a sua literatura oral, enfim, é de extrema importância e necessidade à sua pesquisa, recolha, tratamento, preservação e divulgação.
Mesmo sobrevivendo às intempéries do progresso, os mais velhos que têm sido verdadeiras "bibliotecas vivas" ainda têm vontade de nos transmitir muitos valores que neste momento correm o risco de ficar no esquecimento, tendo em conta o fenómeno de globalização.
Além de outras fontes, é também através da oralidade que se encontram as mais diversas riquezas culturais do passado são-tomense, que se sabe que, com a chegada dos portugueses as ilhas, começou o fluxo de escravos africanos à São Tomé, e daí para o Príncipe, uns ocupando-se das tarefas domésticas, outros na agricultura, vindo das zonas costeiras do continente, nomeadamente Gabão, Bénin e outras, bem como Angola, Moçambique, mais tarde Guiné e Cabo Verde, despachados como mercadorias para as grandes roças de cacau, deixando todos eles vestígios da sua cultura neste arquipélago.
A crioulização das ilhas foi fruto da contribuição desses escravos, tendo surgido algumas línguas crioulas, tais como: "Santomé", falado e entendo em todo o País, tal como o Português, Angolar (Ngolá), utilizado, sobretudo nos extremos Norte e Sul da Ilha de S. Tomé pelos Angolares, e Lung'iye cujos falantes são naturais da Ilha do Príncipe (os Minuiyes), sendo, hoje, um pouco rara a sua utilização, tendo qualquer delas características próprias com muitos termos vindos dessas paragens sobretudo as situadas na região Bantu.

 

Linguagem Proverbial em África: o poder da palavra
Carlos Serrano (Universidade de São Paulo)

A palavra, enunciada em determinados contextos sociais lembra -nos certas regras, que se impõe como signo do poder e eficácia perante aqueles que a escutam ou a quem lhes é dirigida. Estamos falando de uma certa oralidade ritualizada para a solução de determinados problemas surgidos no seio da comunidade (direito costumeiro), de certos pronunciamentos que inauguram certos eventos rememorativos, nominação de personagens que ocupam novas posições sociais, entronizações, invocação da ancestralidade ou dos gênios tutelares da terra. Momentos importantes e necessários à retenção, lembrança e imposição dos símbolos de uma linguagem silenciosa, expressam-se não só pelas palavras mas também pelo ritmo da voz, pela escolha dos símbolos orais ou gráficos invocados ou pela performance corporal no tempo e espaço escolhido. Estes são alguns elementos significativos no exercício da "Palabra".
É entre os Bawoyo (Cabinda-Angola) que pretendemos fundamentar nossa análise sobre alguns símbolos do poder em relação às suas representações gráficas e a enunciação de provérbios a eles associados, pesquisa que já estamos realizando há alguns anos.

 

Problemas de representação dos contextos afro-brasileiros na literatura e na
etnologia

Claudius Armbruster (Universität zu Köln)

Como introdução, a comunicação pretende apresentar uma visão geral do desenvolvimento da temática afro-brasileira na literatura do Brasil em relação a textos etnológicos e antropológicos. A discussão, travada em escala global durante as últimas décadas acerca da "writing culture" chamou a atenção tanto para o caráter narrativo das ciências históricas, sociais e etnológicas como para as influências textuais dos discursos científicos para as letras. Surgiram, no campo da literatura, novos questionamentos sobre a autoridade e o foco narrativo dos autores de textos literários e científicos.
O trabalho tematiza sobretudo a religiosidade afro-brasileira (candomblé etc.) sob aspectos literários e etnológicos, descrevendo e comparando as atitudes de três autores a este respeito, nomeadamente a do romancista baiano Jorge Amado (1912-2001), que pretendeu se integrar, ele próprio, nas estruturas desta religião, divulgando as suas mensagens; do etnólogo, viajante e antropólogo francês Pierre Verger (1902-1996), que se aproximou deste fenômeno brasileiro numa busca autodidática e científica da religiosidade africana, e do autor-viajante alemão Hubert Fichte (1935-1986), que tanto através de suas viagens como em sua literatura (difícil de classificar, mas caracterizada como "antropologia poética") se deixou estimular pelas religiões e culturas afro-americanas. Inserindo estes três autores na história dos discursos científicos e literários sobre o Brasil africano, o trabalho analisa a contribuição específica de cada um, dando especial relevo à relação intertextual entre Jorge Amado, Hubert Fichte e Pierre Verger. Na comparação entre o autor brasileiro e o autor alemão tornam-se distintivos, diante do próprio e do alheio, os critérios de alteridade e de identidade. Todos os três autores caracterizam-se pelos condicionamentos resultantes da transposição e fixação da tradição oral através do meio da escrita.
O objetivo deste trabalho é, assim, investigar em textos de Pierre Verger, Hubert Fichte e Jorge Amado os elos que ligam e separam literatura, etnologia e religião no campo de tensão Europa-Brasil-África. Os textos a serem analisados aqui são originários de um contexto etnológico-religioso-literário no qual a Europa, a África e a América se juntam, se chocam, se ligam e se fundem. Por um lado, unem-se aqui vozes e textos de diferentes origens; por outro lado, esta heterogeneidade é representada e encenada como forma literária híbrida pelos próprios escritores. Textos e imagens referentes a religiões afro-brasileiras transmitidas oralmente possuem em regra um estatuto de narração, já que ficam a dever à observação de fora, ao registro oral e à documentação dos fenômenos religiosos. As questões que se colocam nesta comunicação são, por um lado, se na literatura o campo propício à heterogeneidade e à alteridade é mais amplo do que na ciência e, por outro lado, se na literatura como veículo de comunicação, o estranho é menos reduzido, polido, denunciado ou discriminado em sua heterogeneidade e alteridade do que na ciência.
Chega-se à conclusão de que uma redefinição cosmopolita da cultura afro-brasileira necessita de uma ruptura das formas e retóricas textuais fechadas, deixando emergir uma pluralidade e multiplicidade de visões e representações semânticas e simbólicas do contexto afro-brasileiro.

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