Arquitectura judiciária e acesso ao direito e à justiça: o estudo de caso dos tribunais de família e menores em Portugal

Período
21 meses
Resumo

A comunicação do discurso do direito, associada desde o positivismo ao código escrito, à linguagem técnica e formal, pode ser feita através de outros “materiais”, compostos de sequências e artefactos não verbais (Santos e Villegas, 2001). Jacob (1995) entende que a arquitectura constitui uma componente essencial da imagem da justiça, cujo simbolismo permite estabelecer uma distância, mais ou menos reduzida, com os cidadãos. Assim, o primeiro gesto da justiça é o de delimitar um espaço onde se estipulam regras, se estabelecem objectivos e se instituem actores (Garapon, 1997). E se é difícil definir a instituição judicial, we know one when we see it (Brigham, 1996), pois reconhecemos um tribunal ao reconhecermos o edifício, os seus símbolos, sendo poucos os edifícios públicos com um significado tão forte como os da justiça (Patterson, 2004). Mais, um tribunal não é apenas um conjunto de salas, corredores ou de entradas; é, sobretudo, um espaço social e emocional, onde a organização física do espaço transmite mensagens não verbais de conteúdo social e psicológico aos seus utilizadores. As paredes, a forma da sala de audiências, o posicionamento da mobília e até a escolha dos materiais são de crucial importância para se aceder ao direito e à justiça (Mulcahy, 2007). Neste sentido, reclama-se que as teorias, concepções e representações do direito, da justiça e da administração da justiça são os principais factores por detrás da concepção e transformação dos espaços judiciários. O espaço onde se administra a justiça (seja a primitiva árvore da justiça, a casa da justiça inserida nos mercados medievais, o distante palácio da justiça neoclássico ou o contemporâneo campus de justiça) é sempre resultado das concepções dominantes de direito e de justiça, de soberania e do Estado, condicionando, assim, o programa arquitectónico de um tribunal. O estudo da evolução e da configuração destes espaços permite-nos determinar as características das relações entre os cidadãos, o direito e a justiça em cada sociedade. Para verificar esta linha de pesquisa será abordada uma área específica do direito, por conter características especiais que aprofundam as ligações entre arquitectura judiciária e justiça: o direito da família e das crianças, que é hoje chamado a responder a novos problemas, de contornos ainda pouco definidos, que se manifestam entre uma tendência para a privatização/negociação e uma tendência para a (re)publicização, designadamente em matéria de novas conjugalidades e de defesa dos direitos das crianças (Commaille, 1991; Pocar e Ronfani, 2008). Assim, surge a necessidade de analisar os espaços da justiça numa área tão rica e complexa como a das famílias e das crianças, na qual a interacção com o sistema judicial é associada com a devassa da vida privada, a fragilidade e a emotividade, decorrentes não só do tipo de acção em causa, como da própria relação com o espaço de um tribunal. Quer-se analisar, nos espaços dos Tribunais de Família e Menores portugueses, de que modo estiveram, ou não, presentes, na sua concepção ou adaptação, os conceitos de soberania, de negociação, de acesso ao direito e à justiça, de efectividade e cidadania, a partir dos quais se tentará determinar se o espaço de justiça será mais ou menos distante/próximo, mais ou menos efectivo na comunicação do direito. Este tipo de estudo tem estado ausente do debate actual em Portugal, seja pelas ciências jurídicas, seja pelas ciências sociais, e faz ainda mais sentido num momento em que toma lugar um novo mapa judiciário visando a eficiência da resposta judicial, orientado pela gestão racionalizada e especializada dos tribunais. As funções da justiça evoluíram, por isso nos perguntamos se as novas atribuições do direito e da justiça, em especial numa área como a da família e das crianças, se podem continuar a acomodar no antigo simbolismo arquitectural ou se precisarão de novos símbolos. Assim, é necessário avaliar as experiências realizadas noutros países (como França ou Austrália) para, a partir daí, fazer a sua aplicação em Portugal, interpretando de que modo os espaços de justiça portugueses foram sendo/são concebidos, atendendo às suas funções, quer pelo sistema político, quer por quem os idealizou, quer por quem os experiência, seja como profissional, seja como utente. Para tal, o grupo de pesquisa combina a interdisciplinaridade, partindo da teoria do direito e filiando-se nos sócio-legal studies, combinando estudos sobre a família, resolução de conflitos e acesso à justiça.O estudo pretende problematizar e contribuir teoricamente para a questão da arquitectura judiciária portuguesa actual, bem como para a futura, através da elaboração de sugestões sobre design, organização e funcionalidade dos espaços judiciais, em particular na área das famílias e crianças, como espaços aptos a garantir a privacidade dos seus utentes, ao mesmo tempo que permitem garantir a efectividade do direito e da justiça.

Resultados

Workshop; curso de formação avançada; conferência internacional.

Investigadoras/es
Cláudia Pozzi
João Pedroso
Patrícia Branco (coord)
Valerio Nitrato Izzo
Palavras-Chave
tribunais de família e menores, arquitetura judiciária, acesso ao direito e à justiça, justiça no século XXI
Financiamento
Fundação para a Ciência e Tecnologia