Novas Poéticas de Resistência: o século XXI em Portugal

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Sandra g.d.



nascimento

Os prédios altos em forma de morte nascem no Teu Berço. O Teu Berço, Meu o espanto colossal, rompendo pela janela e pela madrugada luminosa. As revelações tuas no instante de uma noite dentro de si, sem casa e apenas noite do dia sem começo. Aquém, os lençóis quedam-se brancos, e no entanto, imaculados e perfeitos de uma ausência que é Senhora no Berço e a Negação. Não durmo, não sonho. Não durmo, não sonho. Serei esta história interminável, sem interdição nem o contratempo que é o limite do meu nascimento. E sonho-me, só depois da negação, como impossível de mim, na permanência de não ser sonho. Podes tu embelezar-me dentro do tempo ou fora dele. Tu escolherás, querendo como ser, sendo, querendo ser como o tempo, nada. E depois, na morte, serei alguma coisa mais. O fim do sonho, serei.
































vazio relacional

estamos vivos dentro de um mistério insignificante, acontecendo como árvores penduradas no escuro, a salivar de resignação. somos palavras imprudentes, sempre a dizer a mesma coisa porque queremos saber onde estamos, porque estamos, como estamos, ansiosos por saber de um pensamento impossível de ter porque é vazio cheio de um buraco sem fundo a dar para um lugar que é ainda mais fundo e não tem onde chegar por isso fica sempre fundo e mais fundo e nunca deixa de ser o buraco que é fundo. saibamos desse pensamento porque o temos vagamente para escrever sobre ele e saber que existe. porque escrever é escrever para saber que as coisas existem através das palavras e, se não existiam antes, passam a existir depois de serem escritas. mesmo que falem sobre o vazio a dar para um buraco sem fundo. mesmo que sejam as palavras de pensamentos imprudentes, tão imprudentes que se tornou imprudente escrever sobre eles porque as palavras que são imprudentes são palavras que matam sem nunca chegarem a ser escritas porque matam por dentro e por fora como se dentro e fora fosse tudo a mesma coisa, um vazio que é vazio por ser vazio dentro do vazio.




























Sandra Guerreiro Dias (1981) nasceu em Beja e vive em Coimbra. É licenciada em Línguas e Literaturas Modernas e Mestre em História das Ideologias e Utopias Contemporâneas, com a dissertação «Modos do tempo e do espaço em Eduarda Dionísio e Lídia Jorge: mudança, imaginação e (ir)realidades». Encontra-se a desenvolver o projecto de Doutoramento «Poética(s) e cidadania(s) no Portugal pós-revolucionário (1975-1995)», financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), realizando investigação sobre imaginação, mudança social e cidadania na produção literária do pós-25 de Abril. Foi bolseira de investigação, em 2009, no Departamento de Literatura, Estudos e Línguas Europeias, da Faculdade de Humanidades da Universidade de Oslo, no âmbito do projecto «text/history». Colabora com diversos projectos/publicações de âmbito literário e cultural.

 

 

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