Opinião | |||
Elísio Estanque |
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A tradição, a festa e o sexismo entre os estudantes
O fenómeno da feminização introduziu uma importante dissonância na cultura estudantil de Coimbra, uma vez que a tradição académica é fortemente masculinizada. O peso demográfico das raparigas na UC tem vindo a crescer de forma constante desde meados do século XX (29% em 1952, 40% em 1961, 50% em 1974 e cerca de 55% na actualidade); entre os grupos de activistas dos anos 60 contavam-se já algumas figuras femininas; um dos primeiros movimentos que questionou o lugar da mulher na sociedade começou em Coimbra, com a publicação da “Carta a uma jovem portuguesa” (no jornal académico Via Latina, em 1961). Porém, a presença de mulheres nos lugares dirigentes das estruturas associativas tem sido escassa. Mesmo quando elas estão presentes, continuam em geral a ser os rapazes a monopolizar o protagonismo. Nos rituais académicos e nas práticas da praxe persistem os códigos, as linguagens e os comportamentos marcados pela masculinidade. Os rituais festivos, os cortejos, as próprias canções associadas à nostalgia são todos eles imbuídos de valores patriarcais e tutelares perante a rapariga. Por exemplo, não é permitido às mulheres cantarem o fado de Coimbra; os dirigentes associativos e os activistas são maioritariamente rapazes; as jovens que ocupam posições na estrutura dirigente da associação ou nos “núcleos” de curso das faculdades, inserem-se sempre em pelouros de pendor mais “feminino” (de acordo com o cânone tradicional); na Direcção Geral, as “meninas” (além de serem minoritárias) surgem sempre na segunda ou na terceira fila nas diversas cerimónias oficiais onde a associação está representada. É certo que esta questão é alimentada simultaneamente por rapazes e raparigas. Portanto, não se trata de vitimizá-las a elas e acusá-los a eles (o problema é de natureza sociocultural). O que podemos é interrogar-nos até quando esta alegre e despreocupada indiferença vai manter-se? Até quando iremos ter uma Universidade feminizada no conteúdo (onde as mulheres são mais e têm melhores resultados escolares), mas masculinizada nos comportamentos? É certo que a Universidade é reflexo da sociedade, mas não deveria ela ser a "vanguarda" e antecipar tendências? |