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Cidade, cultura e globalização
Estudos de sociologia

Carlos Fortuna

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Introdução: sociologia, cultura urbana e globalização

"The city bristles with malice"
Mike Davis (1992)

Num famoso texto de 1915, Robert E. Park argumentava em favor da conveniência em se fazer da cidade o laboratório de análise, por excelência, da natureza humana (Park, 1967). Aquilo que se dissesse da primeira, dir-se-ia também, com propriedade, da segunda. A cidade, equivalente à sociedade, mostraria a esta última a natureza dos seus processos evolutivos, dos seus equilíbrios e tensões.

A nobreza da intenção do jornalista e sociólogo americano parece conservar actualidade e, por isso, ela continua a insinuar-se, nos nossos dias, como desafio cultural. Poderemos dizer da sociedade aquilo que dizemos da cidade? A resposta é ambígua. Dir-se-á que sim, se se entender que é da cidade e da cultura urbana que irradiam as diferentes forças que mantêm, reproduzem e complexificam a sociedade no seu todo. O pressuposto desta resposta é duplo e reside, por um lado, em julgar que nada mais há de politicamente relevante para além da esfera da cidade e da cultura urbana e, por outro lado, que, perante os efeitos da globalização, estas se uniformizaram e, logo também, as suas influências sobre a sociedade. Ao contrário, dir-se-á que não, se se julgar que a actual expansão da cidade e da cultura urbana, em vez de as tornar homogéneas, as distingue e diversifica entre si, ao ponto de, conjugadas no plural, não se poderem constituir em eventual e único critério de aferição da sociedade em geral. Aqui, é o pressuposto da supremacia da sociedade sobre a cidade e a cultura urbana que preside e, com ele, a convicção de que, à globalização, a cidade e a cultura urbana respondem com o reforço da sua autonomia própria, refractária perante influências sociais externas.

Esta discrepância de pontos de vista é tanto política como disciplinar. No campo das Ciências Sociais, ela pode assumir o estatuto de confrontação, quer entre diferentes áreas disciplinares, quer no interior de cada uma delas. No domínio do urbano, como em qualquer outro, a vitalidade que as Ciências Sociais retiram do confronto de ideias é hoje, como sempre, a matriz da sua frutificação. Não é, por isso, desejável que a multiplicidade de visões sobre a cidade, a cultura urbana e a sociedade, convirja para um qualquer alinhamento discursivo, conceptual ou analítico. A procura de consensos, tanto políticos como científicos, é frutuosa apenas enquanto estimule o progresso de cada uma das partes envolvidas e, assim, ajude a prefigurar uma estratégia comum, capaz, a um tempo, de reconhecer, e de se reconhecer, na validade discrepante dos contributos parcelares. Esta parecer ser a condição de um alinhamento virtuoso de diferentes campos do conhecimento. Da desejável articulação das várias visões sobre a cidade, a cultura urbana e a sociedade, um trabalho a ser feito por inúmeras mãos, resultará, por certo, um grau mais elevado de inteligibilidade sobre cada uma delas. Talvez só então se reduza a ambiguidade que, por ora, a proposta de Park suscita, permitindo, sem confundir uma com a outra, dizer da sociedade o que se diz da cidade e, inversamente, compreender a cidade a partir da sociedade.

Partindo do campo particular da Sociologia, as contribuições aqui coligidas estão atentas ao indispensável cruzamento inter-discursivo sobre o universo urbano e social. Os textos resultam, na sua maioria, de um Encontro sobre Cultura Urbana, Estilos de Vida e Práticas de Consumo, que teve lugar em Coimbra como realização conjunta da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, do Centro de Estudos Sociais e do Manchester Institute for Popular Culture (1v). Tratou-se de um Encontro com a participação de investigadores de diversas áreas das Ciências Sociais, tendo-se optado por verter para português apenas alguns dos textos apresentados, de raíz mais marcadamente sociológica.

A avaliação do estado da investigação no domínio da cultura urbana e das cidades em Portugal, reconhecendo embora o seu progresso recente (2v), salda-se por um défice de publicações disponíveis sobre estas matérias, em particular no campo da Sociologia. Deste modo decidiu-se juntar aos textos seleccionados do referido Encontro, alguns dos ensaios matriciais dos estudos urbanos. É assim que se justifica a Parte I, que faculta aos estudiosos portugueses textos clássicos como A Metrópole e a Vida do Espírito, de Georg Simmel, e O Urbanismo como Modo de Vida, de Louis Wirth. Embora já disponíveis em edição brasileira, foram agora objecto de nova tradução. Ao seu lado, pela primeira vez, surge a tradução portuguesa do famoso texto de Walter Benjamin, Paris, Capital do Século XIX, que é, a todos os títulos, um contributo inestimável para a leitura sociológica da cidade e da cultura urbana modernas.

É longa de quase dois séculos, a tradição sociológica sobre a cidade e a cultura urbana. Ela é, evidentemente, o outro lado do processo de urbanização que, com a chamada Revolução Industrial, começou por alterar a fisionomia do mundo ocidental e continua, hoje em dia, a modificar as geografias, as mentalidades e as práticas sociais em todo o mundo. Seria fastidioso desenvolver aqui considerações detalhadas sobre o movimento de urbanização que marcou a sociedade ocidental. Nesta introdução é suficiente referir o longo e intenso movimento de concentração populacional em aglomerados urbanos que faz da sociedade ocidental uma sociedade fundamentalmente urbana. Com efeito, enquanto que, em 1950, cerca de 1/4 da população do globo vivia em aglomerados urbanos, em 1990, regista-se a existência de 270 cidades com mais de 1 milhão de habitantes, o que, por si, representa cerca de 1/3 de toda a população mundial (United Nations, 1990). Ao mesmo tempo, prevê-se que, no ano 2010, a população urbana possa ultrapassar os 3/4 da população mundial. Embora se trate de um fenómeno global, nos nossos dias, o padrão de urbanização é marcado sobretudo pela cadência acentuada a que crescem e se multiplicam as cidades nos países, sobretudo africanos e asiáticos, mais pobres ou em vias de desenvolvimento (Clark, 1996: 49). A variável demográfica obriga desde logo, portanto, a distinguir entre urbanização e geografia da urbanização.

Mas há uma segunda distinção a fazer. Esta tendência para a crescente urbanização não pode nem deve ser confundida com a história do urbanismo, nem com a formação e propagação da cultura urbana. Na verdade, à evolução linear do crescimento das cidades corresponde a constituição hesitante, feita de avanços e recuos, daquilo a que chamamos cultura urbana. Como campo teórico, centrado em redor de um conjunto específico de práticas sociais, mentalidades e estilos de vida que se forjam, comunicam e reproduzem na cidade, a cultura urbana tem uma história própria, iniciada nos meados do século XIX, sob o pano de fundo da industrialização europeia.

A cidade moderna, em especial a grande metrópole, berço de novos grupos e figurações sociais, novas formas de organização e de conflito, com as suas homogeneizantes e simultaneamente segregadoras ideologias e práticas de consumo e, enfim, com as suas novas topografias, tornou-se, por tudo isso, objecto da curiosidade e da reflexão académicas. No gradualismo da sua institucionalização em disciplina autónoma, esta reflexão começou por identificar as raízes históricas da cidade e os contrangimentos que sobre ela recaíam, sobretudo de natureza económica. Ao mesmo tempo que se iam desbravando novos campos de reflexão, perante a hegemonia do academismo clássico, esta filtragem propagou-se, insidiosamente, a outras áreas disciplinares. A cidade da sociologia urbana positivista foi, assim, sendo expurgada de numerosos elementos (políticos, literários, arquitectónicos, geo-espaciais, etc.) que haviam feito dela um universo tanto mais específico quanto mais complexo. Esta coisificação da cidade traduziu-se no seu empobrecimento e a transformação da cidade-sujeito em cidade-objecto da sociologia urbana parece dizer mais sobre os mentores de tal estratégia do que sobre o fenómeno cultural urbano em si.

Nas últimas duas décadas, porém, novas visões sobre a cidade têm surgido e dado origem a uma espécie de devolução à cidade das suas múltiplas facetas, resgatando uma soberania temporariamente ofuscada. A Sociologia que temos por urbana parece hoje estar a converter-se numa Sociologia das cidades, por efeito não apenas do reconhecimento da fragilidade das fronteiras disciplinares que haviam separado e oposto entre si a cidade e o urbano ao campo e ao rural, mas também da redescoberta do hibridismo cultural contemporâneo que a cidade exibe, e ainda em resultado da crescente centralidade de escalas infra-estatais de governação, fruto cruzado da regulação pós-fordista e da globalização.

A cidade não é uma coisa. Ela reconhece-se simultaneamente como real e representacional, como texto e como contexto, como ética e como estética, como espaço e como tempo, socialmente vividos e (re)construídos. Nesta sua implosão, a cidade torna-se uma alegoria da sociedade e, como que a concretizar a proposta de Robert Park (1967), o que se diz sobre uma, parece poder dizer-se, cada vez mais, sobre a outra. Por isso, nos nossos dias, da clássica Sociologia urbana, pouco nos resta para além de uma cultura do mesmo nome, como conjunto de acções, memórias, representações e narrativas sociais que se fundem e articulam entre si sob o pano de fundo de um espaço urbano e de um poder social determinados. A reconceptualização da cidade como espaço fragmentado e disputado abriu novos campos de análise e fez surgir novos objectos empíricos de pesquisa, alinhados quer pela atenção conferida aos micro-regimes de poder na cidade, quer pela influência pós-estruturalista sobre as relações sociais e as identidades urbanas, quer ainda pelo interesse pós-marxista sobre a cultura visual, o consumo e os regimes representacionais (3v). Nesta reinterpretação da cidade não são apenas os estudos sobre cidades particulares que sobressaem, mas emergem também como objectos singulares de pesquisa empírica, e em detrimento da meta-narrativa urbana, os seus (re)arranjos socio-espaciais específicos, a sua economia simbólica e a natureza dos seus edifícios, monumentos e outros marcadores, ou as suas ruas, parques e zonas de comércio (4v). Todos eles interferem com a cultura pública citadina e o discurso da Sociologia sobre a cidade torna-se, deste modo, crescentemente, um discurso cruzado com numerosos outros enunciados, de tipo fenomenológico, semiótico e literário (Ostrowetsky, 1996; Pellegrino, 1994; Westwood e Williams, 1997). Nunca o discurso sobre a cidade foi tão multifacetado e plural como neste final de século. Nunca estivemos tão próximos de reconhecer que só no cruzamento de diferentes campos discursivos e tradições intelectuais pode a cidade re-encontrar-se na plenitude da sua multivocalidade e polivalência.

Reside aqui um desafio imposto à coerência intelectual. Se, como argumenta Bruno Latour (1994), para que se concretize, a modernidade deve ser capaz de reflectir sobre a natureza híbrida das suas próprias construções, também a moderna Sociologia, para oferecer inteligibilidade à cidade, não pode estar sujeita a interpretações exclusivistas e monolíticas. Procurou-se respeitar este princípio na presente selecção de textos sobre a cidade. Poder-se-ia argumentar que uma das suas limitações residiria no facto de se tratar de um conjunto de textos oriundos de um único campo de reflexão - a Sociologia. Mas esta limitação poderá converter-se em virtude. A sua Sociologia é uma Sociologia de tempos diferentes (o que é mais notório entre os textos da Parte I e os restantes), centrada em espaços urbanos muito díspares (como denota toda a Parte III), com pontos de partida igualmente muito variados (como resulta, por exemplo, das Partes II e III). Ademais, não existe neste conjunto de textos uniformidade teórica, analítica, ou temática. Oriundos embora do mesmo campo disciplinar, no seu conjunto, os ensaios contidos neste livro são, cada um à sua maneira, tentativas de ler sociologicamente a(s) cidade(s) dos nossos dias. O diálogo com outras narrativas sobre as cidades é um diálogo interno a todos e cada um dos textos apresentados. É desta diversidade das partes que, pode-se dizer, se alimenta a unidade do livro no seu conjunto. Afinal, como a própria cidade moderna, cuja unidade resulta, também ela, da sua múltipla diversidade.

Na Parte I desta colectânea, incluem-se alguns dos textos que marcaram mais profundamente o trajecto inicial da Sociologia urbana. Aos pontos de contacto existentes entre os ensaios de Georg Simmel e de Louis Wirth, contrapõe-se o texto de Walter Benjamin, um documento precioso, de meados deste século XX, sobre o modo como a cidade da modernidade se faz de memórias do passado e de crenças optimistas no futuro.

A Parte II inclui três textos sobre alguns dos vectores do reconhecimento da cidade e da cultura urbana. Em tempos de globalização, o texto de Mike Featherstone entrelaça o local com o global e interroga-se sobre o sentido da nossa cultura (pós)moderna. Laura Bovone pergunta quem são, como actuam e que visões fornecem os novos agentes da intermediação cultural, responsáveis pela atribuição de sentidos à cultura urbana. Alan Warde, por seu turno, ilustra, recorrendo ao campo da gastronomia, a pertinência das acções de intermediação cultural na combinação de universos imaginários com práticas sociais e modos de apresentação estilizada do corpo.

A Parte III desta selecção de textos recolhe seis estudos de caso sobre diferentes cidades. O que os une entre si é a ampla concepção de cultura urbana que deles se recolhe. Sem que seja objecto de análise detalhada, todos os casos têm por referência a alteração dos modos de estar e de imaginar a cidade em tempos de globalização da cultura, da economia e dos modos de governação. Mas a globalização tem as suas raízes históricas, territoriais e institucionais. Sem que nos dediquemos a esta questão em pormenor, todavia, os leitores não estranharão que tentemos, de seguida, uma breve incursão sobre a história recente do pensamento ocidental sobre a cidade moderna, a que se seguirão algumas referências aos textos aqui incluídos, com destaque maior para os textos clássicos da Parte I.

CIDADES E CULTURA URBANA

Uma das mais divulgadas teses sobre a natureza da cidade medieval europeia é a de Henri Pirenne (1973). Na sua obra sobre as cidades medievais, o historiador belga faz depender a dinâmica urbana das relações mercantis, fazendo ancorar aí o poder da cidade e a sua independência política. O comércio, sobretudo o comércio mediterrânico de longa distância, que tivera efeitos desastrosos para as cidades europeias e o próprio Império Romano, revela-se decisivo, igualmente, para a redinamização urbana posterior ao século XI. À medida que enriquecem e se autonomizam perante a aristocracia e o clero, mercadores e comerciantes, residentes sub-urbe, ou seja, literalmente, nas vertentes "abaixo da cidade", situada, estratégica e simbolicamente, no alto do monte (LeGates e Stout, 1996: 37), transmitem à esfera urbana um sentido público de uma comunidade construída em redor do comércio e troca de mercadorias. O mercado converte-se no elemento central da vida urbana e as cidades medievais passam a constituir verdadeiros oásis de promessas de liberdade num mundo de obrigações feudais. Stadtluft macht frei!, o velho aforismo da pré-moderna Alemanha além-Elba, encontra aqui a sua raíz.

O dinamismo daquela classe média, de feição mercantil e comercial, foi responsável não apenas pelas alterações das relações sociais, políticas e económicas da cidade, mas igualmente, como testemunham os trabalhos de Braudel ou Wallerstein, induziu a expansão do capitalismo e, com ele, a preponderância crescente das relações cidade-cidade, em consequência do comércio de longa-distância, sobre as relações cidade-campo. O cenário urbano vai alterar-se profundamente e a busca dos seus fundamentos continuou a ser objecto de variadas investidas na história da vida urbana. Entre estas destaca-se a obra de Max Weber que, ao contrário de Pirenne, não limita a análise da cidade medieval ao impacto oscilante da sua componente económica e mercantil. Da pesquisa histórica de Weber sobre a cidade, condensada num conjunto de notas recolhidas entre os anos de 1911 e 1913 e feitas editar, postumamente, em 1921, por Marianne Weber, ressalta uma concepção plural de cidade. Com efeito, Max Weber não se restringe apenas à cidade ocidental (europeia), fazendo também incursões na cidades orientais, mas, mais do que isso, entende a cidade como uma espécie de urbanismo pleno, não tanto no sentido da intensificação e multiplicação das relações sociais, como entenderia Simmel, por exemplo, mas no sentido da crescente autonomia da esfera urbana, não restringida à actividade económica que nela se desenrola (Weber, 1982). Pesem embora, por um lado, o reconhecimento da centralidade do mercado e da produção e, por outro, a justeza histórico-empírica da sua interpretação (Hannerz, 1980: 86), este urbanismo pleno de Weber reconhece na cidade medieval uma entidade multifacetada, dotada de instituições políticas e associativas, jurídicas e burocrático-administrativas, relativamente autónomas.

Vários autores têm feito notar, ou mesmo lamentado, o facto de Weber se ter restringido à análise da cidade medieval e barroca. O mesmo se poderia, aliás, dizer de Werner Sombart, seu contemporâneo, que, no seu Amor, Luxo e Capitalismo, quando se debruça sobre a cidade se detém no século XVIII (Sombart, 1983: cap. 2). Há dois aspectos histórico-sociológicos do trabalho de Weber, que importa fazer ressaltar como legado intelectual da sua reflexão: em primeiro lugar, o facto de ter produzido uma influente leitura global da constituição da cidade ocidental; em segundo lugar, o de ter ensaiado uma explicação para o surgimento de três tipos-ideais de sociabilidade urbana, protagonizados pelo cidadão, o estranho e o empresário capitalista (Jonas, 1995a: 28). Isto não quer dizer que Weber, e para esse efeito também Sombart, desprezassem a cidade da era pós-renascentista e industrial. Com efeito, embora não lhe dediquem uma análise sistemática e aprofundada, pode dizer-se que a cidade moderna está subjacente enquanto terreno singular de acção social, fórmula política e figuração cultural específica, tanto em Economia e Sociedade (Weber, 1978), como em O Capitalismo Moderno (Sombart, 1978).

À medida que o capitalismo se industrializa, a cidade sofre transformações de monta. A cidade medieval que crescera e florescera, como vimos, em resultado da sua capacidade para incorporar e fazer sua a iniciativa política, económica e cultural das classes mercantis, isto é, a cidade que crescera e florescera num movimento das margens para o centro, torna-se, com o capitalismo industrial, uma cidade de conflito aberto e de fragmentação social sem precedentes.

Friedrich Engels ofereceu, em 1845, o mais acutilante relato das condições de vida típicas da cidade industrial de meados do século XIX. Para Engels a cidade industrial é um produto directo do capitalismo industrial e, como tal, é o cenário aberto da luta de classes. A sua dramática leitura política da cidade é pautada, por um lado, pelo testemunho directo do horror vivido pelo proletariado urbano-industrial de Manchester e, por outo lado, pela denúncia das estratégias de segregação de classe impostas pela burguesia. Quanto a este último aspecto, para Engels, a imagem que a burguesia procura instaurar na cidade industrial inglesa por excelência, é a de uma cidade onde o conflito está ausente:

devido à curiosa configuração da cidade, afirma Engels, é possível viver em Manchester ao longo de anos, ir e vir para o emprego, sem nunca avistar um bairro operário (Engels, 1958: 54).

Esta deliberada invisibilização das classes operárias - "(...) a pobreza encontra-se escondida, ... fora do alcance da vista das classes mais favorecidas da sociedade" (idem, 33) - para além de ser sintoma da violenta fragmentação urbana e social, traduziria, ao mesmo tempo, o derradeiro objectivo burguês de conferir à cidade uma imagem de harmonia, capaz de "evitar ofender a frágil susceptibilidade do olhar e dos sentidos das classes médias" (idem, 56). A "resposta" histórica das classes médias é conhecida. A sua fuga para os subúrbios fez da suburbanização o principal agente do futuro crescimento das cidades, mas alterou também a sua ordem social interna. Ao contrário da cidade medieval, pode-se dizer, a cidade do capitalismo industrial cresce a partir do centro saturado para as margens em expansão.

Tal desenrolar inspirou uma vastíssima e aguerrida reflexão anti-urbana, alimentada não apenas pelos malefícios da industrialização e da monetarização das relações sociais, como no caso de Engels, mas principalmente pela ideologia burguesa que acusa a cidade de promover a degradação cívica e moral dos cidadãos, precarizar a sua condição física e intelectual e instigar a desordem, o vício e a doença (por exemplo, Stallybrass e White, 1986; Short, 1991). Em contraste com este pessimismo urbano, nas sociedades em que se tornara impossível oferecer o campo e a vida rural como alternativa mercê da massiva fuga para a cidade, os subúrbios das grandes cidades eram frequentemente referidos como a solução mais segura, onde a família, a estabilidade e a comunidade de valores podiam desenvolver-se a coberto dos riscos da grande cidade (Chaney, 1994; Stilgoe, 1988). Em pleno século XIX, como de resto ao longo de todo o século XX, tanto a crítica anti-urbana como a defesa do subúrbio recolheram aplausos e contestações, tanto no domínio político e das ideologias, como no domínio da investigação em Sociologia, em Geografia, ou nos estudos de planeamento e urbanismo. Interessa-nos aqui apenas referir que, em nosso entender, teorizações em redor dos "lugares centrais", ou dos "círculos concêntricos" da expansão urbana, projectos sobre as "cidades-jardim", movimentos de "rurbanização" e "contra-urbanização" se alimentam, todos eles, de uma maneira ou outra, do reconhecimento de uma transformação radical da natureza e das funções da cidade que, com diferentes matizes e graus de intensidade, tem subjacente ou enuncia o seu fim, enquanto entidade centralizadora e espaço homogéneo.

A natureza do ensaio de Engels coloca-o, ao lado das interpretações históricas de Weber e Sombart sobre a cidade, entre os trabalhos precursores de uma reflexão sociológica sobre os modos de organização e a estrutura social das cidades. Com estes, mas também com Georg Simmel e Ferdinand Tönnies, consolida-se uma linha de pensamento, de raíz germânica (5v), sobre o que podemos considerar ser a cultura urbana. Emerge, assim, um objecto novo em que ressaltam práticas políticas e comportamentos sociais, valores culturais e universos mentais que, forjados na interacção urbana, no entanto, não se confundem com a cidade, a sua morfologia e a sua estruturação espacial.

Um dos mais destacados pensadores da cultura urbana moderna é Georg Simmel de quem reproduzimos aqui um dos seus mais célebres ensaios. A interrogação de Simmel sobre a natureza da modernidade conduz-se por linhas metodológicas que pouco ou nada têm a ver com a matriz utilizada por Weber ou Sombart. Desde logo, Simmel não procede a uma análise histórico-comparativa e a sua preocupação com o que é "novo" e "moderno" na sociedade da viragem do século XIX desenrola-se em exclusivo pelo recurso às representações mentais, aos modos de percepção/apropriação e à experiência vivida dos sujeitos. A interferência do capitalismo e da monetarização da economia sobre as relações sociais é analisada de modo acutilante no laboratório que constitui o quotidiano da metrópole, a qual, no seu dizer, "foi sempre a sede da economia monetária" (6v).

Pese embora esta herança, o que mais atrai Simmel são os efeitos indeléveis decorrentes da violenta ruptura espacio-temporal que se opera na metrópole, a correspondente alteração das relações de causalidade social e a resposta socio-psicológica e emocional dos sujeitos. Daí a secundarização da análise histórica.

Adepto dos micro-universos e do sensível, Simmel utiliza a metodologia do contraste para fazer sobressair a natureza e a originalidade da metrópole. O referente que Simmel destaca como contraponto da metrópole moderna, porém, ao contrário do que frequentemente se assume, não é o campo nem a comunidade rural - como em Ferdinand Tönnies ou Louis Wirth -, mas antes a pequena cidade ou a pequena localidade (Savage e Warde, 1993: 112).

Ao insistir nas novas formas de sociabilidade metropolitana (individualismo, atitude blasé, relações de estranhamento), Simmel põe a tónica na intensificação e na multiplicação das relações sociais, ampliando o sentido weberiano de plenitude do urbano, já assinalado. Como afirma,

Se aos incessantes contactos públicos das pessoas nas grandes cidades correspondessem as mesmas reacções interiores dos contactos que têm lugar na pequena localidade, ... estaríamos completamente atomizados interiormente e cairíamos numa condição mental deplorável.

A alternativa simmeliana a este estado de coisas não se encontra no esforço de racionalização das relações sociais, como seria a proposta de Weber, mas antes no refúgio dos sujeitos na individualização, na criação de distâncias sociais e no anonimato. A agorafobia e a hiper-sensibilidade são vistas, deste modo, como mecanismos de auto-defesa da personalidade metropolitana que alteram radicalmente as relações sociais de interacção (Frisby, 1985: 75). Com o intuito de detectar "os ajustamentos da personalidade aos factores que lhe são externos", em A Metrópole e a Vida do Espírito, Simmel demarca-se claramente do sentimentalismo e da repugnância com que muitos contemporâneos seus (por exemplo, John Ruskin ou Friedrich Nietzsche) abordam a crescente superficialização das relações sociais nos grandes espaços urbanos.

Neste sentido, o carácter formal e objectivista da Sociologia de Simmel, afasta-o igualmente da problemática da anomia social, desenvolvida principalmente por Émile Durkheim e os durkheimianos, quer a entendamos num sentido objectivo (de desorganização institucional), quer num sentido subjectivo (de desorientação pessoal). A metrópole, ao constituir-se num quadro novo da vida social, impõe aos sujeitos a necessidade de se relacionarem entre si e com o mundo exterior através de um extremo objectivismo. No extenso e denso espaço urbano que é a metrópole, a "preponderância do espírito objectivo sobre o espírito subjectivo" é o resultado directo da monetarização da economia e, esclarece Simmel, "na justa medida em que o dinheiro ... sujeita todas as diferenças qualitativas ao critério do 'quanto custa'", são os próprios sujeitos que, na metrópole, se vêem convertidos em objectos.

Resultam daqui quatro traços principais da cultura metropolitana, todos eles confluindo para consumar o individualismo e, usando de empréstimo a expressão de Richard Sennett (1978), a "queda do homem público": 1) o intelectualismo, pelo qual, e ao contrário do que sucede nas pequenas localidades, o sujeito metropolitano se vê forçado a conter as suas emoções e a proceder de modo racional; 2) a reserva mental, ou a criação de distâncias nos contactos quotidianos, como mecanismo de auto-protecção da individualidade; 3) o espírito calculista e pragmático como garantia de sobrevivência numa cultura quantitativista e 4) a atitude blasé, um traço psíquico que remete para a banalização das diferenças e a (auto)desvalorização pessoal (Savage e Warde, 1993: 111).

O modo como o sujeito da metrópole recorre à subjectividade para objectivar as suas relações com outros e deles se "dissociar" constitui, para Simmel, "uma das formas elementares de socialização" em contexto urbano, capaz de assegurar ao indivíduo um "grau de liberdade pessoal, sem paralelo em quaisquer outras circunstâncias". Parece ressoar aqui o eco do velho aforismo medieval alemão. Os "ares" da metrópole de Simmel, dir-se-á, são libertadores, também eles. Mas a correlação simmeliana entre vida urbana e emancipação social distancia-se desta concepção, semelhante aliás ao convencimento de Marx e Engels de que a cidade retira os homens à idiotia da vida rural, e refere-se antes a uma noção de liberdade psicológica e emocional, do domínio "espiritual" e do sensível. Este refúgio na dimensão sensível e estética do quotidiano, aliada à preferência de Simmel pela análise dos fragmentos fugazes da vida, ou o que chamava os snapshots sub species aeternitatis (Frisby, 1985; Pais, 1993), conferem à sua obra uma actualidade sociológica singular. Assim se justifica que, ainda que tenha escrito sobre a cultura e a metrópole de finais do século XIX, Simmel tenha sido recentemente "pós-modernizado", devido à sua démarche metodológica e às suas preferências temáticas (Weinstein e Weinstein, 1993). A sua Sociologia, que para muitos não passa de bricolage intelectual de um diletante animador de salão (Collins, 1985), é, talvez por isso mesmo, um contributo inestimável para a compreensão do que alguns consideram ser a caoticidade cultural dos nossos dias (Tofler, sd).

A herança sociológica de Simmel e, em particular, do seu ensaio sobre a metrópole, encontrou, por exemplo, em Robert Park (seu estudante em Berlim), Louis Wirth e na Escola de Chicago, como um todo, o terreno mais propício para a sua frutificação. Na primeira parte da presente colectânea, incluimos O Urbanismo como Modo de Vida, da autoria de Louis Wirth, que é um dos textos mais ilustrativos da aproximação da Escola de Chicago à metodologia adoptada, à natureza das interrogações e às temáticas simmelianas.

O texto de Wirth é normalmente tido como um desenvolvimento de A Metrópole de Simmel, com o qual estabelece uma relação tensa de aceitação e de distância simultâneas. O autor adopta uma posição pragmática de procura de uma "definição sociologicamente relevante da cidade", capaz de separar com clareza os conceitos de urbanismo e de capitalismo industrial. Esta alusão é especificamente dirigida ao texto de Simmel, que Wirth considera ser deficiente no reconhecimento da autonomia das relações de interacção urbana, por um lado, e da monetarização da economia, por outro. Deste modo, em Wirth, a interferência da economia sobre a vida urbana é posta de lado, enquanto se deixa conduzir pela linha metodológica e analítica do contraste, fiel à adoptada por Simmel.

Metodologicamente, como Simmel, Wirth recorre ao confronto de situações para fazer realçar o seu objecto de análise. No entanto, o confronto que põe em evidência é muito menos próximo da oposição de Simmel entre metrópole e pequena cidade e muito mais subsidiário da dicotomia clássica usada por Tönnies (1972) entre Gemeinschaft e Gesellschaft ou das famosas oposições de Park (1952) sobre a família e mercado ou o sagrado e o secular. O confronto que Wirth provoca entre a cidade e o campo, ou a vida urbana e a comunidade rural, é uma das mais importantes falácias do seu texto por se referir a entidades ontologicamente diversas: a cidade é um universo cultural aberto enquanto a folk society é um universo fechado (Hannerz, 1980: 66). Sem dúvida que, embora com menor intensidade que nos nossos dias, a comunicação entre ambos os universos é acentuada e o continuum rural-urbano encontra-se presente em Wirth sob a forma de "mosaico de mundos sociais". Contudo, este "mosaico" parece funcionar de modo unidireccional e a análise de Wirth tem muito mais a ver com a difusão da cultura urbana sobre o hinterland da cidade do que, ao invés, com a capacidade da comunidade rural para projectar a sua cultura própria sobre o contexto urbano (ibidem).

A principal razão para que Wirth seja incapaz de assegurar de que modo pode a comunidade rural, mesmo exposta às influências da cidade, conservar e ampliar traços de urbanidade, reside precisamente no modo como a cidade é definida. Esta é vista como o efeito sociológico combinado da dimensão (demográfica), da densidade (das relações e contactos) e da heterogeneidade (de tipos sociais), em presença no espaço urbano. Para Wirth, a dimensão da cidade, na esteira de Simmel, potencia tanto a autonomia dos indivíduos, como o seu anonimato e a perda do sentido de participação, podendo conduzir à anomia e ao vazio social. A densidade, por seu turno, na linha da tradição darwinista social, é tida como potenciadora do espírito de competição, mas também, da tolerância perante os outros. Por fim, a heterogeneidade, ao mesmo tempo que instiga a necessidade de definição e delegação de interesses e o cosmopolitismo, é responsável pela insegurança dos indivíduos e confere à vida urbana um forte sentido de imprevisibilidade.

São numerosas as críticas dirigidas a esta matriz teórica e à validade das suas respectivas antinomias (por exemplo, Hannerz, 1980; Saunders, 1993; Savage e Warde, 1993, entre outros). Em síntese, pode dizer-se que o que mais é criticado em Wirth é o facto de as suas três variáveis explicativas se articularem entre si e, ipso facto, definirem sociologicamente a cidade de modo diferente consoante o tempo e o espaço que se considerem. A verdade desta observação, porém, deve ser relativizada, porquanto o ensaio de Wirth visa estabelecer as coordenadas principais do "modo de vida" urbano, entendido como tipo-ideal, colocando-se, portanto, num plano universalizante de interrogação que não corresponde ao plano empírico e casuístico donde é oriunda a maioria das críticas que lhe têm sido dirigidas.

Contemporâneo de Wirth, Walter Benjamin encontra-se noutra latidude. A sua visão sobre a metrópole distancia-se claramente do viés empiricista do sociólogo americano, como evidenciam as suas Passagen-Werk, de onde é retirado o texto que aqui incluimos. As Passagen-Werk não chegaram nunca a constituir um livro mas tão-somente uma colecção de anotações fragmentárias que Benjamin terá coligido a partir do ano de 1927 e incompletas à data do seu suicídio, em Setembro de 1940, durante a mal sucedida fuga de França a caminho dos Estados Unidos da América (Buck-Morss, 1993). O título Passagen-Werk foi-lhes dado pelos responsáveis pela edição alemã dos 6 volumes que compreendem as mais de 900 páginas de notas a que o autor havia chamado Passagenarbeit ou simplesmente Passagen. Paris, Capital do Século XIX começou a ganhar forma em 1934 e, sobretudo, no ano seguinte quando Benjamin preparou, em alemão, o seu exposé sobre Paris (a que se seguiria um segundo, de 1939, escrito em francês).

Organizada em seis "secções" (com uma introdução e uma conclusão na versão de 1939), esta espécie de catálogo temático da grande cidade articula, em cada uma delas, uma figura história e um determinado acontecimento ou situação ("Fourier e as Galerias", "Daguerre ou Panoramas", "Grandeville ou as Exposições Universais", "Luis Filipe ou os Interiores", "Baudelaire ou as Ruas de Paris" e, por fim, "Haussmann ou as Barricadas"). Nas primeiras três "secções" Benjamin põe em claro alguns exemplos da pujança técnico-produtiva da época moderna, por exemplo a utilização do ferro na construção, e relaciona-a com os ideais sociais, utópicos uns, pragmáticos outros, de personalidades como Fourier, Grandeville ou Daguerre. A técnica e a arte (o ferro, a fotografia, o panorama e o cinema, por exemplo) e a imaginação social e teórica parecem convergir na "expressão de um novo sentido de vida" caucionado pela interpenetração do Passado com o Futuro. Em Benjamin, esta interpenetração traduz a relação tensa, senão dramática, da existência humana. O passado, o fragmento da memória e a autobiografia, que, aliás, constituem outros tantos elementos do método de Benjamin, confrontam-se de modo intempestivo com o futuro ambíguo da modernidade. Para Benjamin, o passado, isto é, a consistência e o sentido de uma época ou de um acontecimento só pode ser revelado através do seu fluir. Se o estilo arquitectónico das galerias de Paris se fica a dever às capacidades técnico-industriais do capitalismo do século XIX, nomeadamente ao uso do ferro na construção, a sua vitalidade projecta-se na utilização do vidro na arquitectura dos inícios do século seguinte. De igual modo, são os panoramas que "emancipam" a pintura. Em Benjamin, é o futuro que torna o passado compreensível, e aquilo a que Frisby (1985) chama a "pré-história da modernidade" é o modo como Benjamin converte, como se de um jogo de espelhos se tratasse, as formas urbanas edificadas do passado em tradutoras da nossa contemporaneidade e inversamente. Isto equivale a argumentar sobre a indeterminação do presente da modernidade e da sua qualidade para aferir, como sustenta Boaventura S. Santos (1996), das nossas "ilusões retrospectivas e... prospectivas". Por isso, tanto a modernidade, como a cidade, que a representa simbolicamente, nas incertezas e desafios que revelam, constituem-se em campos sociais e políticos de negociação, de desfecho incerto. O presente da modernidade de Benjamin é, assim, exaltante e o seu futuro tanto pode ser erigido sobre a revelação da revolta inconformista do passado como sobre a eufórica confiança no progresso futuro.

As três últimas "secções" do texto de Benjamin remetem para o isolamento do indivíduo em espaços privados de ilusão deliberada, para as imagens alegóricas despersonalizantes das ruas de Paris e para o violento redesenhar das formas topográficas, das imagens e das paisagens da cidade. As imagens espaciais da cidade ganham em Benjamin uma centralidade ímpar para a compreensão da sociedade moderna. Antagónicas como são, estas imagens tornam a cidade um espectáculo (7v) e Benjamin antevê no ambiente citadino o desejo colectivo de se "suprimir e transfigurar a imperfeição do produto social, bem como as deficiências do sistema social de produção", no que alguns comentadores entendem ser uma das suas mais claras aproximações a Marx. Na expressão de Susan Buck-Morss, uma destacada estudiosa da obra de Benjamin, Paris - a Cidade dos Espelhos e das Luzes - "deslumbra e decepciona as multidões" (Buck-Morss, 1993: 81). Tal é um efeito da supremacia alcançada pelo valor representacional das mercadorias e objectos sobre o seu valor de uso (e de troca) na vida moderna. As galerias de Paris, as exposições, os panoramas, a política fantasmagórica, o deambular pelas ruas e o novo urbanismo são, todos eles, representações culturais, expressões fragmentares benjaminianas da nova "dialéctica do olhar" urbano. Esse olhar é um meio e um método de aceder e reconhecer a cidade-labirinto que é a expressão cultural da cidade moderna.

Se em Simmel, como vimos, a atitude blasé é o reflexo objectivado da monetarização da economia, em Benjamin será o flâneur que melhor corresponde à expressão sociológica da moderna cultura urbana. Mas a passividade da personagem blasé não encontra eco no flâneur de Benjamin que representa o modo como o autor de Paris, Capital do Século XIX predente pôr a claro a estrutura mítica dos impulsos, aspirações e ansiedades que perpassam o quotidiano vivido da cidade (Shields, 1996; Jenks, 1995; Tester, 1994). O flâneur de Benjamin, ele próprio uma apropriação da imagem metafórica com que Baudelaire (1993) ilustra a personalidade descomprometida e, em simultâneo, o intérprete perspicaz da modernidade, é a personificação da ambiguidade típica da cidade moderna. Produto híbrido, resultado do cruzamento das modernas multidões urbanas com a lógica do consumo de massas, o flâneur alimenta-se e disfarça-se de umas e de outra. Da sua anónima e diletante versatilidade, o flâneur retira uma capacidade muito particular para "ver" a modernidade e devolver dela e das suas múltiplas representações e redes de significação, uma imagem fiel porque, paradoxalmente, translúcida, e consistente, porque volátil e transitória. Se "chaque époque rêve la suivante", se tentarmos ser fiéis ao pensamento analítico de Benjamin, devemos interrogar-nos, meio século passado sobre a sua escrita, de que modo os seus boulevards haussmannianos, ou as suas galerias de Paris, ou a sua flânerie, enquanto expressões de uma cultura urbana e de consumo se consolidam, irradiam sentido, prefiguram e tornam intelígivel o nosso trajecto colectivo presente. Dados os propósitos desta antologia, não devemos senão referir que, ora implícita, ora explicitamente, são vários os textos aqui coligidos que procuram dialogar com Paris, Capital do Século XIX. Não é de todo dispicienda esta referência, porquanto, como bem assinalam Savage e Warde (1993: 123), a obra de Walter Benjamin, abundantemente discutida na teoria literária, tem permanecido na penumbra ou tem mesmo estado ausente das agendas de investigação sociológica, pese embora o seu valioso contributo para a compreensão da cultura urbana moderna.

CIDADES E GLOBALIZAÇÃO

O modo de perspectivar o vigor desta cultura urbana é fortemente subsidiário da vitalidade social da própria cidade. Como referimos anteriormente, desde meados do século XIX que o dinamismo da cidade se tornou objecto de aceso debate entre os seus aguerridos detractores e os não menos entusiastas defensores. Conhecidos os argumentos dos primeiros (degradação física, mental e moral dos indivíduos, anarquismo político e acção colectiva das massas, anomia, despersonalização, insegurança e pânico generalizados), entre os regeneradores da cidade deste século é justo referir o nome de Patrick Geddes (1854-1932), escocês de origem e entusiasta divulgador das ideias da Cidade-Jardim e da necessidade de planeamento urbano. No seu conhecido Cities in Evolution, Geddes (1915) introduziu a expressão Cidade Global para designar o urbanismo atento ao prévio levantamento das condições e necessidades locais e regionais como base da reconstrução da vida política, social e cultural da cidade (Meller, 1990). Divulgado e expandido mais tarde por Peter Hall (1966), o conceito de Cidade Global encontra-se hoje enquadrado pelo processo de globalização dos fluxos económicos, culturais e de governação da era da flexibilização pós-fordista (Harvey, 1989). Neste quadro, é justo mencionar o trabalho de Saskia Sassen (1991; 1994) que contraria a tese da inépcia da cidade, ao chamar atenção para os efeitos regeneradores recentes que a globalização pode ter sobre alguns centros urbanos. Com efeito, a investigadora da Universidade de Columbia faz ressaltar a capacidade das "cidades globais" (Nova Iorque, Londres, Tóquio) para traduzirem em termos locais e tirarem partido dos processos de globalização, suplantando os seus constrangimentos e tornando-se centros nevrálgicos da alta finança, da tecnologia de informação, do marketing e da administração multinacional e dos serviços de ponta. Os critérios de Saskia Sassen são exclusivistas e, ao destacarem os poderes económicos, financeiros e tecnológicos como suporte das "cidades globais" (8v), eliminam muitas outras possibilidades, nomeadamente de ordem cultural, que podem "globalizar" a cidade e torná-la dinâmica.

Perante o actual processo de desterritorialização dos fluxos económico-financeiros, tecnológicos e culturais-informativos, o desafio está na capacidade das diferentes cidades para procederem à sua reterritorialização, o que independe da dimensão das cidades, para se referir, antes, à intensidade, grau e espessura com que sejam capazes de se dotarem de segmentos desses fluxos. A redinamização globalizante da cidade apresenta-se sempre no quadro de uma vertente interna (natureza e diversidade de equipamentos, fixação de funções sócio-económicas, promoção de uma identidade coerente) e de uma vertente externa (lugar de suporte e captação parcelar de fluxos globais, atracção de movimentos de pessoas em circulação transnacional). O que está em causa, portanto, é a necessidade de uma concepção mais flexível e ampla do processo de globalização, capaz de dar conta das inúmeras situações e possibilidades de as cidades se reposicionarem no actual contexto sócio-político internacional.

Uma das interpretações heuristicamente mais valiosas de globalização é a fornecida por Boaventura de Sousa Santos que a entende como mecanismo "pelo qual determinada condição ou entidade local consegue estender a sua influência a todo o globo e, ao fazê-lo, desenvolve a capacidade de designar como local outra condição social ou entidade rival" (Santos, 1997). Tanto o "global" como o "local" surgem aqui como conceitos relacionais. Aplicada ao contexto particular da cidade, a capacidade da sua redinamização pela globalização depende da figuração de outras "globalidades" ou de outras "localidades" que em conjunto se perfilam no decurso da actual concorrência inter-cidades.

A dimensão relacional deste binómio global-local torna possível ajuizar do grau e da espessura com que cada cidade pode reforçar as especificidades locais, alargar ou reconstruir a base da sua legitimidade política e cultural, fazendo aumentar o seu próprio sentido de lugar e a sua própria identidade, ao mesmo tempo que se insinua no plano internacional. Mas tal sucederá sempre de modo desigual. Aos casos de sucesso de redinamização global de umas cidades contrapõem-se as situações em que, não por inexistência de recursos globalizantes próprios, o que tende a variar com a conjuntura, mas por ineficácia da sua gestão, algumas cidades se vêem incorporadas de modo passivo nos meandros da globalização e são incapazes de fazer reconhecer aqueles recursos no plano transnacional.

Paralelamente a esta situação de globalização passiva das cidades, a flexibilização do conceito de globalização permite juntar duas outras situações não menos importantes para darmos conta do dinamismo das cidades. A primeira destas situações diz respeito à globalização parcelar, ou sub-globalização, isto é, a situação em que uma determinada entidade projecta para além de si própria e faz reconhecer apenas alguns dos seus atributos, competências e recursos, ou, mutatis mutandis, se vê passivamente globalizada em apenas alguns domínios e não noutros. A segunda situação é a que permite pensar a existência de um processo de globalização decorrente da valorização temporária dos recursos imagéticos e representacionais. Uma cidade simbolicamente global será aquela que vê valorizada transnacionalmente a sua imagem, por efeito, por exemplo, de acontecimentos singulares, rituais, ocasiões distintivas, ou em resultado do reconhecimento universal do seu património histórico e cultural ou recursos turísticos. O carácter transitório de uma tal globalização em nada diminui a sua pertinência. O facto de ser a dimensão simbólica e a imagem representacional da cidade que surge (re)valorizada nesta situação, pode permitir um reforço inaudito da identidade local e autorizar que a cidade temporária e simbolicamente globalizada se constitua na situação típica da "globalização contra-hegemónica", contemplada por Boaventura S. Santos (idem).

A moderna relação local-global encontra eco particular no texto de abertura da Parte II desta colectânea. Nele, Mike Featherstone tece considerações acerca do modo como se articulam as culturas locais e globais perante o desafio central da pós-modernidade que consiste em gerar comunicação intercultural e gerir os seus diversos fluxos e sentidos. O contexto urbano é o pano de fundo da sua reflexão e, como ponto de partida, Featherstone coloca-se perante o processo de mundialização da comunicação (pelo qual as cidades se abrem ao exterior e internacionalizam as suas imagens e economias urbanas, reais ou simbólicas) que se faz acompanhar do processo, de sentido inverso, de localização do mundo, uma espécie de desglobalização (em que é a identidade local e o sentido de lugar que ganham proeminência e se complexificam). Aquilo a que chama terceiras culturas, um espaço cultural de confluência tanto discursiva como de interacção, parece constituir a plataforma de descodificação comunicativa mais apta a conferir sentido aos modos de expressão e de representação que pontuam na sociedade contemporânea, em geral, e na cultura urbana em particular. O convívio multi-étnico de culturas não deixará, no entanto, de encerrar desafios múltiplos, talvez irresolúveis, como a ambivalência de valores e o hibridismo, mas, como Featherstone advoga, para se traçar o quadro da comunhão local-global é preciso fazer sedimentar novas competências por sobre os capitais culturais, étnicos e de classe originários.

É perante este desafio que ganha relevo a contribuição de Laura Bovone. As imagens e as narrativas de que dispomos sobre a nossa cultura e as nossas cidades são, sobretudo, oriundas da acção comunicativa de especialistas. São imagens e narrativas com autoria própria, forjadas numa rede de múltiplas referências culturais e simbólicas e variados trajectos e lealdades classistas, que os novos intermediários culturais personificam. Para Laura Bovone é crucial conhecer-se o quadro referencial destes intermediários da cultura - sejam eles jornalistas, produtores de televisão, operadores de turismo, criadores de moda, arquitectos, galeristas, etc. -, em vista da sua competência exclusiva para reduzirem e difundirem, sob fórmulas condensadas, os mais variados universos culturais. Às suas mãos a cidade vê flutuarem incessantemente os seus sentidos e significados e, à medida que se acentua a cultura mediática e do consumo, mais as suas imagens e signos alteram a nossa estrutura de sentimentos e desejos. E fazem-no, podemos acrescentar, sem qualquer rumo definido, em vista de a sua intervenção ser conduzida pela "infindável procura de novas experiências ... e uma peremptória resistência aos códigos instituídos" (Featherstone, 1991: 44). Das imagens culturais da modernidade às imagens culturais da pós-modernidade, para Laura Bovone, a mediação simbólica que estes intérpretes do gosto proporcionam, se conserva alguma lealdade, é perante os cânones da ambivalência, aliás em conformidade com o seu próprio lugar de classe, estimulando o contínuo exercício de auto-reflexividade dos sujeitos.

No prolongamento desta problemática, o texto de Alan Warde ilustra o papel da intermediação cultural na alteração do gosto alimentar e da prática culinária. A sua análise centra-se na alteração vertiginosa das representações sobre as formas de comer, feita a partir das colunas gastronómicas incluídas em revistas femininas inglesas do último quarto de século. Do seu texto decorre uma análise fina da maneira como, no contexto urbano, o corpo se tem vindo a constituir em elemento central da identidade e da representação individual, sobretudo da representação do género sexual. O corpo e os diferentes regimes alimentares são simultaneamente uma forma de auto-representação e de representação perante os outros. A questão pode assumir a dimensão dos rituais civilizacionais da modelação e disciplina corporais como em Norbert Elias (1989) ou Stephen Mennell (1985), ou a dimensão gastro-política como em Barry Smart (1994). O texto de Alan Warde coloca-se algures entre uma e outra destas dimensões. Com efeito, é possível captar deste texto o modo como na decisão mais trivial do quotidiano urbano sobre cozinhar, preparar comida no micro-ondas, comprar comida feita ou comer no restaurante se encontra presente a mediação dos especializados intermediários culturais. De igual modo pressente-se como as opções e as estratégias alimentares de hoje se deixam conduzir por sugestões relativas ao tempo de preparação dos alimentos, ao seu custo, ao gosto, ao estilo de vida próprio ou imaginado, mas também por referências relativas ao valor calórico e energético dos alimentos e por preocupações de natureza estética e somática. O consumo alimentar urbano é hoje, em todas as suas dimensões, um exercício experimental de globalização. Não apenas pela variedade crescente de gostos e ingredientes, mas também por efeito da massificação da viagem e do turismo, das migrações, da valorização cultural do passado, da aventura e do exótico e, em alguns casos, da tradição colonial. Esta globalização servida à mesa é evidentemente um acto cultural recheado de ambiguidades. Uma das mais assinaláveis virtudes do texto de Alan Warde reside justamente na sua chamada de atenção para os princípios reguladores e as antinomias contidos nas mensagens gastronómicas que nos chegam de todos os pontos da cidade.

CIDADES EM ANÁLISE

Na sequência dos textos de pendor meso-teórico da Parte II desta colectânea, incluem-se de seguida seis contribuições especificamente centradas sobre experiências culturais urbanas de outras tantas cidades. Sem podermos chamar-lhes estudos de caso, estes textos avaliam os impactos de experiências pontuais e tecem considerações teóricas e analíticas que ajudam a perspectivar algumas das dimensões anteriormente referidas acerca da recente investigação sociológica sobre as cidades.

A abrir a Parte III encontra-se o texto da autoria conjunta de Eric Corijn e Sabine Van Praet sobre a experiência de Antuérpia 93. Trata-se, numa primeira parte, da análise da constituição e do papel cultural da "capital europeia da cultura", iniciativa lançada em 1983, e onde se avaliam as experiências ocorridas nos seus primeiros dez anos, seguida, numa segunda parte, da leitura circunstanciada da experiência de Antuérpia. O movimento da "capital europeia da cultura" pretende, em síntese, promover a cultura local/regional da cidade anualmente designada e deste modo pôr em evidência a natureza plural das experiências culturais da Europa. A escassez da análise sociológica sobre este fenómeno confere ao texto de Corijn e Van Praet um estatuto exemplar, sendo que o seu mérito principal reside na forma como é descrita e avaliada a acção dos numerosos intervenientes. A interrogação basilar dos autores refere-se ao lugar da cultura e da arte no desenvolvimento e (re)valorização das cidades. Trata-se de uma questão central, objecto de variadas contribuições e polémicas. Socorrendo-me de uma das mais conhecidas intervenientes na questão, Sharon Zukin, direi que a relação da cultura e da arte com a cidade tende hoje a ser vista como contendo um potencial ímpar de regeneração urbana, quer interna quer externa, decorrente do fortalecimento do que a autora chama de economia simbólica (Zukin, 1991; 1992; 1995). Para além de outros aspectos, esta economia simbólica abre a possibilidade de a arte se constituir em ingrediente de identidade da cidade, um aspecto que subjaz, sem dúvida, à iniciativa da "capital europeia de cultura" e que, assim, percorre todo o texto de Corijn e Van Praet. Mas, neste domínio, a experiência de Antuérpia 93 deixa-nos algumas interrogações. Tendo sido altamente positiva nos objectivos de curto prazo, contudo, Antuérpia 93 parece ter precludido nos desenvolvimentos de prazo mais alargado da relação arte-cultura-identidade-cidade. Fica em aberto a questão de como projectar de modo coerente e duradouro a oportunidade oferecida por um acontecimento cultural desta envergadura que, temporariamente, trouxe Antuérpia - um caso entre outros -, à condição emblemática de Capital Cultural da Europa. Tendo sido um exemplo de cidade temporaria e simbolicamente global, a experiência de Antuérpia é um estímulo à avalição das condições pelas quais tal estatuto pode esmorecer de imediato e o investimento que se pretendeu globalizante pode não ir além de um sinal leve de uma oportunidade esgotada. De te fabula narratur: o que pode o caso de Antuérpia 93 revelar a tantas outras cidades candidatas à credenciação de Capital Cultural da Europa?

Muitas das preocupações presentes no ensaio de Corijn e Van Praet ressurgem no texto de Hans Mommaas sobre a fragmentação urbana de Tilburg, ainda que sob uma outra matriz empírica e um outro quadro teórico de reflexão. Mommaas discute a partir de Newplace - um bairro do pós-guerra, ocupado a partir de meados dos anos 60, situado nas franjas de Tilburg - as virtudes e as vicissitudes de um mobilizador projecto modernista que alterou as geografias da cidade e os mapas socio-cognitivos dos seus habitantes. A narrativa oferecida é eloquente na interpretação deste contrato modernista: fim das turbulências sociais e económicas, promessa de bem-estar, redistribuição pública de recursos, igualdade de oportunidades, centralidade da família e da igreja, responsabilidade cívica e consensos sociais alargados. Um novo espírito de comunidade e de lugar, uma concepção refundada de cidadania e de participação marcam a nova geografia de Newplace. No decurso dos anos 80, este espaço passa a ser também ocupado por uma geração mais nova de residentes, com diferentes rotinas, gostos e estilos de vida. À degradação das relações primárias (familiares, de género, etárias), com a chegada de uma vaga de imigrantes, a Newplace junta-se também o problema novo da gestão política da heterogeneidade étnico-cultural. A brecha no contrato modernista instala-se e, com a reviravolta neo-liberal em matéria de políticas sociais, a crise do Estado-Providência, o estímulo ao mercado, à diferenciação e à mobilidade, Newplace converte-se num lugar de desencanto, de instrumentalização dos sentimentos, de alienação e desorientação moral. De um espaço de promessa, Newplace transfigura-se num "espaço de diferença" e o esforço de harmonização sócio-espacial de Tilburg lê-se agora em termos de duas geografias segmentadas: a da centralidade e a da marginalidade. As transfigurações sócio-espaciais de Tilburg são carreadas por Mommaas para uma tentativa de dilucidação da relação do moderno com o pósmoderno. O colapso de Newplace é o colapso do projecto moderno e a virtude do projecto pósmoderno? Ou, sem ser nem uma nem outras destas possibilidades, Newplace é, tão-só, um exemplo da necessidade de revisão das nossas concepções sobre a cidade da modernidade?

Implícita na interpretação de Hans Mommaas sobre a ascensão e decadência de Newplace encontra-se a re-orientação das políticas urbanas dos subúrbios e bairros periféricos para os centros das cidades, típica das décadas de 70 e 80. É aqui que se funda toda uma vastíssima literatura sobre os processos de notabilização urbana dos centros residenciais e de negócio. O texto de Justin O'Connor e Derek Wynne é um bom exemplo desta re-orientação. O seu terreno de análise é a cidade de Manchester e, por isso mesmo, é difícil não estabelecer ligação, por mais ténue que seja, com as descrições de Engels sobre a cidade berço da industrialização inglesa. Com efeito, se, como dissemos anteriormente, ao tempo de Engels, Manchester era um caso paradigmático da cidade industrial que crescia a partir do centro para as margens, a contribuição de Justin O'Connor e Derek Wynne coloca-nos perante o movimento de sentido inverso: Manchester cresce hoje "das margens para o centro". Mas que crescimento é este? Trata-se de um crescimento pela regeneração do centro de uma cidade que sofreu o embate violento da decadência económica e da desindustrialização, ou seja, do esvaziamento dos ingredientes que haviam feito dela uma das mais fulgurantes cidades europeias do século XIX.

Nestas condições, a pergunta de O'Connor e Wynne é sobre como construir uma nova identidade para a cidade, dando por adquirido que os seus anteriores predicados de base (cidade industrial e operária) não poderão ser relançados. A resposta estará, para os autores, no empenhamento de numerosos agentes locais na construção de uma nova paisagem cultural com uma espacialização específica. O texto faz ressoar aqui e ali as análises de Sharon Zukin para a regeneração cultural de Nova Iorque, em especial o SoHo e Brooklyn (Zukin, 1991; 1995). Com efeito, também em Manchester existe uma dinâmica economia simbólica posta em marcha por artistas e artesãos que se vão fixando no centro degradado da cidade. Aqui, igualmente, estão presentes políticas de recuperação residencial (Afflecks Palace), de instauração de zonas alternativas de produção cultural, boémia e flânerie (Bairro Gay), de regeneração de zonas ribeirinhas (junto ao Canal). Mas Manchester acrescenta a tudo isto a reapropriação do centro da cidade por um dinâmico ambiente rave e uma vibrante cultura pop, oriundos das suas periferias, e responsáveis pela dinamização da indústria da música e da moda e pela multiplicação de ateliers de design, galerias, restaurantes, etc., em regra iniciados em regime de auto-emprego, por uma geração de jovens empresários em busca de alternativas ao assédio desindustrializante do thatcherismo (Purvis, 1997). De tudo isto, argumentam O'Connor e Wynne,, se está a refazer a imagem do centro da cidade e a nova identidade de Manchester. Duradouramente? Se, como noutros casos, nada pode garantir que o investimento cultural tenha efeitos positivos directos (e duradouros) sobre a renovação urbana e a imagem da cidade (Friedrichs e Dangschat, 1993), a resposta dependerá do modo como, em Manchester, se articulem no futuro a lógica económico-política da cidade e a iniciativa dos novos agentes produtores e intermediários da cultura, que nem sempre são coincidentes e, ao contrário, as mais das vezes, conflituam entre si.

Entre produtores e intermediários culturais, os "consumidores" da cultura urbana constituem um grupo distinto, cujas fracturas internas são postas em relevo no texto de Robert Hollands. O que está em causa é um exame do papel da cidade (Newcastle Upon Tyne) sobre a experiência da vida moderna, nomeadamente, sobre as culturas juvenis. São fortes os indícios e numerosas as contribuições que assinalam a tendência moderna de reconversão das identidades juvenis, para o que muito contribui a sua condição perante o consumo urbano e a correspondente adesão a processos espúrios de auto-identificação. Isto tem conduzido a uma renovação conceptual, em que, por exemplo, o conceito de estilos de vida, tem vindo, gradualmente, a substituir ao conceito de identidade. Uma das virtudes do texto de Robert Hollands reside em utilizar os estilos de vida, não como descrição de práticas, mas antes como quadro interpretativo de novas vinculações materiais e simbólicas dos jovens nos espaços urbanos. Esta démarche põe em claro a distinção entre as formas de utilização da cidade por parte de homens e mulheres jovens. Demarcando-se da influência que alguns trabalhos, como os de Paul Willis (1977), tiveram sobre o encobrimento das práticas juvenis femininas, sobretudo no campo anglo-saxónico, Robert Hollands faz alinhar a sua contribuição por hipóteses alternativas, como as exploradas, pioneiramente, por Angela McRobbie (1991), apostadas em denunciar os estereótipos da subordinação, da dependência e da domesticidade femininas. O autor revela, com sobriedade, alguns usos culturais que a mulher jovem faz da cidade, ao longo de um eixo temporal traduzido no uso nocturno da cidade, a que a Sociologia tem dedicado um limitadíssimo esforço de análise, e um outro espacial, representado pelo universo cultural do "pub". A liberdade que a cidade e a cultura urbana oferecem a todos por igual é sempre desigualmente apropriada, de acordo com os vários alinhamentos sociais, económicos e culturais. Aqui, em que o que sobressai são as relações sociais de sexo, o uso diferenciado que as jovens mulheres fazem de Newcastle, ilustra como as suas identidades se transformam ao sabor das práticas sociais e da cultura urbana.

Não só os indivíduos, homens e mulheres, transformam as suas identidades. Também as cidades o fazem. O texto de Carlos Fortuna oferece uma interpretação teórica sobre a conquista e transformação das imagens e identidades das cidades, seguida da ilustração empírica da cidade de Évora. O texto sustenta que, sob o impacto da globalização, a concorrência inter-cidades impõe, sobre estas, exigências e desafios novos, de cuja resolução depende a sua modernização. Esta, porém, não ocorre no vazio e, como se sustenta no texto, uma das formas mais expeditas de entender a modernização das cidades, é através da "reinvenção da tradição" e da sua reconversão em recurso competitivo. A imagem da cidade está, ela própria, sujeita a este processo, que o autor designa por destradicionalização. Aplicadas ao caso de Évora, as hipóteses de Carlos Fortuna permitem-lhe argumentar no sentido da transfiguração da imagem daquela cidade, de uma cidade de província, culturalmente fechada e tradicionalista, numa outra, de cidade simbolicamente global, aberta e em processo de modernização. O património histórico e monumental local, ele próprio em processo de destradicionalização, desempenha um papel crucial nesta reconfiguração da identidade-imagem da cidade alentejana. Reconhecida, pela UNESCO, como "Património da Humanidade", Évora tem encontrado no turismo urbano e cultural, um dos seus recursos mais valiosos, tanto no diz respeito à redinamização da cultura e da economia locais, quanto no que se refere à sua projecção internacional.

A terminar, o texto de António Arantes. Com "A Guerra dos Lugares", o autor convida-nos a um percurso singular pelos lugares e os não-lugares antropológicos da cidade de São Paulo. Aqui se vive e experimenta a conflitualidade e a tensão de que a metrópole é feita, a tal ponto que não é possível determinar se estamos todos juntos, ainda que em mundos diferentes (como insinua Hans, o homem dos biscates), ou se, ao contrário, estamos todos separados, embora no mesmo mundo. É sobre a dissolução das fronteiras entre espaços, identidades e práticas sociais que Arantes escreve. Simmel (1988), que viu na porta um elo tanto de separação como de união, está presente, com Arantes e connosco, neste percurso. Mas também estão de Certeau (1990) e a condição possibilista que a cidade revela aos transeuntes, ou Turner (1969) e a liminaridade e transitoriedade dos espaços da cidade. O texto de Arantes conduz-nos, ora por territórios da cidade por onde todos passam sem que ninguém aí permaneça (espaços auto-referenciados), ora por territórios onde se permanece sem que ninguém ou poucos por aí passem (onde os sujeitos se tornam culturalmente invisíveis), ora face a edifícios e monumentos que celebram diferentes formas de poder, ora ainda por lugares de não-poder, de desconfiança, trangressão e risco mas também de cumplicidades e solidariedades que estimulam e não deixam indiferentes o nosso corpo e o nosso espírito. Os territórios de São Paulo são bem a confirmação de que o espaço não necessita de ser dito para ter significado, como sustentaria Algirdas Greimas (1976). Mas no dizer do texto de António Arantes, a metrópole revela-se na pluralidade dos seus significados, polissémica, entrecruzada, sobreposta, transgressora, estonteante, irrepetível e sem fronteiras.

Como se vê, é variado o campo de hipóteses, de descrições e de interpretações que se juntam neste livro. Como se disse antes, sendo fundamentalmente uma colectânea de Ensaios de Sociologia, espera-se que, em função dos seus diversos pontos de partida e interrogações, possa contribuir para a construção de um discurso tão multifacetado e plural como a própria cidade, o qual, por isso mesmo, se nos apresenta como o único discurso capaz de lhe conferir mais sentido e maior inteligibilidade. Esse será um dos possíveis, e desejáveis, pontos de chegada deste livro.

NOTAS

(1^) Gostaria de expressar o meu agradecimento a estas instituições, mas também à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, pelo apoio parcial concedido à organização do Encontro. Desejo, igualmente, agradecer aos autores dos diferentes textos apresentados ao Encontro e aqui incluídos a sua disponibilidade e a prontidão com que aceitaram sugestões e procederam a alterações dos seus originais. Por fim, a minha gratidão a Derek Wynne, Claudino Ferreira, Paula Abreu, Paulo Peixoto e Alexandra Dias, pelo apoio concedido, quer na organização do Encontro, quer no tratamento final desta selecção de textos.

(2^) Estou a pensar, entre outros, nos trabalhos de Carlos V. de Faria (1980), A. Fonseca Ferreira (1987), Vítor M. Ferreira (1987), Isabel Guerra (1991), Teresa B. Salgueiro (1992), Eduardo B. Henriques (1996), Nuno Serra (1996) e os contidos em diferentes colectâneas (Tavares, 1993; AAVV, 1987; 1988; 1990a; 1990b; 1993).

(3^) Henri Lefebvre, com a sua concepção de espaço "socialmente construído", simultaneamente homogéneo e fragmentado, é um dos autores mais destacados neste movimento de reconceptualização do elemento urbano. Para este pensador francês, a cidade definir-se-á menos pelo seu elemento físico construído e a sua arquitectura, mas antes pelas práticas espaciais que nela têm lugar, nomeadamente, as práticas de representação do espaço e dos poderes políticos e sociais (Lefebvre, 1991). Pode dizer-se que Lefebvre contribui para fazer deslocar a análise da cidade dos termos que a dominaram até aos meados dos anos 80, onde a economia política da cidade, a importância do (consumo do) espaço, as lutas e os movimentos urbanos ganharam relevo, como o testemunha a interessante discussão em redor dos trabalhos de M. Castells (1973), D. Harvey (1973) e P. Saunders (1980).

(4^) O próprio léxico da intervenção técnica e paisagística se alterou. O planeamento urbano de pendor descritivista cedeu perante o planeamento estratégico de natureza político-social, a preocupação com a expansão física de cidade transformou-se em preocupação com a requalificação e a imagem da cidade, a sua qualidade ambiental, condições de vida e sustentabilidade, tendo-se generalizado noções como as de "cidade-empresa", "marketing urbano", "concorrência inter-cidades" (Kanter, 1995; Portas, 1993; Domingues, 1996).

(5^) Algo paradoxalmente, porquanto, menos consolidada institucionalmente, foi a Sociologia alemã que pioneiramente se dedicou a esta nova reflexão (Sennett, 1969; Jonas, 1995b). Enquanto a Sociologia urbana e a análise da cultura das cidades têm uma dimensão pouco mais que marginal em Inglaterra, nesta parte final do século XIX, em França ambas começam a ganhar destaque com os trabalhos de E. Durkheim, M. Mauss, M. Halbwachs e P. H. Chombart de Lauwe. Nos EUA, seria preciso esperar algumas décadas pelos contributos da Escola de Chicago, nomeadamente pelos trabalhos de R. Park, E. Burgess e L. Wirth, entre outros.

(6^) Quando não referidas explicitamente as suas fontes, estando subentendida a sua autoria, as citações dizem respeito a textos inseridos nesta antologia.

(7^) Esta espectacularidade pode ser ilustrada na fórmula condensada, oferecida por Schivelbusch (1988: 148) sobre a cidade "a montra iluminada como palco, a rua como teatro e os transeuntes como audiência".

(8^) Em oposição ao efeito centralizador que Saskia Sassen atribui à cidade em resultado da globalização, encontram-se numerosas interpretações alternativas, que destacam a natureza fundamentalmente descentralizadora, por isso desigual nos seus efeitos, da moderna tecnologia de informação. Nesta linha de argumento, vejam-se os trabalhos recentes sobre o redesenvolvimento desigual (por exemplo, Massey e Allen, 1988).

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