A Agressão Masculina nos Contextos da Violência Contra As Mulheres.
Manuel Lisboa (Socinova, FCSH, Universidade Nova de Lisboa)
Zélia Barroso (Socinova, FCSH, Universidade Nova de Lisboa)
Joana Marteleira (Socinova, FCSH, Universidade Nova de Lisboa)

Esta comunicação resulta de uma reflexão em torno dos resultados empíricos de vários estudos elaborados pela FCSH-UNL 1 através do SociNova2, sobre a temática da violência e da criminalidade perpetradas contra as mulheres, em Portugae. Pretende-se abordar o fenómeno da violência numa perspectiva relacional, dando um grande ênfase ao contexto sociocultural do agressor, de forma a ultrapassar as visões centradas essencialmente na vítima.
A problemática da violência contra as mulheres revela que por detrás de muitas condutas violentas encontram-se representações sociais do "ser masculino" e do "ser feminino", interiorizadas tanto em homens como em mulheres: e que essas representações fazem com que o contexto da autoria saia da mera esfera dos autores materiais da agressão para o das formas como o agressor e a vítima se representam socialmente entre si e na sua relação mútua.
A violência nas relações amorosas expressa dinâmicas de afecto/poder, nas quais estão presentes relações de subordinação e dominação (por vezes consentidas), sendo o ritual das agressões iniciado, muitas vezes, no namoro, que corresponde à fase da escolha do(a)parceiro(a) e também ao momento em que se iniciam as primeiras negociações e padrões de relacionamento. E, que em alguns casos, apesar da gravidade das agressões, vários mecanismos psicológicos, sociais e culturais ajudam a prolongar a situação mesmo depois de casadas.
Num estudo recente, sobre as situações de violência extrema que dão origem a processos nos Institutos de Medicina Legal (IMLs) e futura participação judicial, a maioria de casos observados em Coimbra e no Porto referem-se à violência física (83%). Apesar da gravidade dos actos, os resultados mostram também que, para a maioria destas mulheres há uma trajectória de violência que vem detrás: em 84% dos casos é anterior ao último ano e em 36.7% das situações essa violência prolonga-se mesmo por um período dupeiror a dez anos. Igualmente é de assinalar a percentagem considerável de mulheres que refere ter sofrido vários tipos de violência (nomeadamente, física e psicológica), o que vem reforçar a hipótese de que em alguns casos a violência tende a ocorrer em "cachos", no sentido em que os actos estão intrincados entre si e vão ocorrendo de uma forma articulada e em cascata, particularmente quando há uma trajectória de violência. Importa, então, conhecer o que prende estas mulheres a relações violentas, quando se encontram em contextos sociais que a tal não são obrigadas por constrangimentos institucionais, ou sociais deles derivados.

De certo modo, poder-se-á dizer que a violência que afecta as mulheres é também socialmente construí da, quer pelos contextos socioculturais mais próximos que lhe estão associados na esfera das interacções quotidianas da vida privada e social, quer pelos contextos das várias camadas da sociedade envolvente, que, pela estigmatização dos géneros e dos papéis sociais institucionalizados, criam condições para que ela ocorra com diferente intensidade e frequência.

Quanto ao perfil social dos agressores, e tendo por referência os estudos citados, verificase que na relação de parentesco com as vítimas predominam os maridos (49,6% IMLs; 40% Custos Sociais), sendo que, nos resultados do estudo do IML de Coimbra 12,2% das mulheres vítimas têm como agressores os namorados.
Outro aspecto importante que ajuda a compreender o contexto social e cultural que está subjacente à autoria da violência diz respeito às causas apontadas para a agressão. No caso da violência extrema, detectada nos IMLs, o ciúme é a mais referida (44,4%, sendo particularmente expressiva em Coimbra com 54,6%). O sentimento de ciúme, enquanto justificação da agressão, surge estreitamente relacionado com a construção social dos géneros, legitimando implicitamente (ou atenuando) a conduta de quem agride e, em alguns casos, servindo de prova da existência de afecto.


Interferir na Família: Expectativas de Reacção da Vitima de violência conjugal e da comunidade, por parte dos residentes no Concelho de Lisboa

Dália Maria de Sousa Gonçalves da Costa (Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas)
daliacosta@net.sapo.pt

A interferência na família por parte de entidades externas pode configurar a intervenção informal (por exemplo por parte de outros familiares ou dos vizinhos) ou formal e institucionalizada (por exemplo por parte das agências sociais e/ ou judiciais). Partindo de uma análise cultural do problema da violência no seio da família, pressupomos que a interferência formal e institucionalizada é condicionada pelas crenças, valores e práticas sociais que consubstanciam uma percepção da família que é partilhada pela comunidade em determinado momento histórico (percepção social), definindo, de forma tácita, as normas, os limites e as expectativas em relação a essa mesma interferência. Quando os maus tratos conjugais configuram um crime público importa conhecer a percepção da comunidade em relação às expectativas de comportamento de uma mulher vitima de violência conjugal, às expectativas em relação às medidas a aplicar ao agressor e à motivação para intervir numa situação de maus tratos conjugais, alheia ao próprio, sugerindo a expectativa de comportamento por parte da comunidade em geral, no que concerne às situações de maus tratos conjugais.

Conhecer, Capacitar Prevenir: uma proposta interdisciplinar de enfrentamento da violência doméstica contra crianças e adolescentes no município de Ponta Grossa- PR.
Adalgisa Hellen Ribeiro Santos (Universidade Estadual de Ponta Grossa)
Cleide Lavoratti (Universidade Estadual de Ponta Grossa)

A violência, em suas diferentes expressões, tem sido um dos fenômenos que mais preocupam a sociedade brasileira. Muito se tem discutido sobre formas para o seu enfrentamento, porém, pouco se fala em termos de prevenção. O presente trabalho expõe a experiência de um Projeto de Extensão da Universidade Estadual de Ponta Grossa - Paraná, que tem como cenário principal a escola, que por se configurar no espaço onde alunos, familiares e profissionais da educação convivem, torna-se um "lócus" significativo de discussão e re-significação das relações sociais permeadas pela violência, em especial, àquelas desenvolvidas no seio familiar. Com o objetivo de sensibilizar os sujeitos envolvidos nessa temática, uma equipe interdisciplinar busca resgatar / recriar formas democráticas de relacionamento e educação, que privilegiam o respeito, o diálogo, o afeto, respaldados nos princípios da Cultura da Paz (UNESCO). Propõe-se também a rejeição ao "pacto do silêncio", do qual participam vítimas, familiares e, infelizmente muitos profissionais que, de alguma forma, mantêm relações sociais com estas famílias. O Projeto incentiva a notificação dos casos de violência aos órgãos de defesa dos direitos da criança, entendendo que a omissão da escola contribui para que o fenômeno da violência doméstica contra crianças e adolescentes se reproduza socialmente.
Palavras chave: violência familiar, escola, prevenção.

Violências na conjugalidade: um problema simétrico?
Cláudia Casimiro (ICS, Universidade de Lisboa)

Esta Comunicação tem por base o desenvolvimento de parte da fundamentação teórica de uma investigação intitulada "Violência conjugal: um problema simétrico? Representações sociais masculinas e femininas" (título provisório), que decorre no âmbito do II Curso de Doutoramento em Sociologia, no Instituto de Ciências Sociais, da Universidade de Lisboa.
As perspectivas tradicionais sobre a violência conjugal têm-se baseado na assunção empírica de que os homens são provavelmente mais capazes de se envolver em actividades violentas nas relações conjugais, sendo o próprio termo "violência conjugal" usado como eufemismo de "mulheres agredidas".
Não se pretende diminuir a importância deste problema cada vez mais reconhecido e investigado. Também não é objectivo explorar a ideia, sugerida por alguns autores, de que as agressões cometidas pelas mulheres sobre os homens, no âmbito da vivência conjugal, constituem um fenómeno social comparável, na sua natureza e magnitude, ao das mulheres mal tratadas. Se alguns autores o afirmam, é importante notar que outros oferecem argumentos igualmente válidos que contribuem para desmistificar tal noção.
Contudo, e independentemente da discussão em torno da questão da simetria no uso da violência conjugal, sabe-se que também as mulheres se podem constituir como agressoras. Havendo certamente diferenças entre as experiências de mulheres e de homens abusados, ambos os lados da questão deverão ser aceites como avenidas viáveis de investigação abrindo caminho para que o problema da violência conjugal possa ser compreendido de forma mais plena. Da comparação entre representações masculinas e representações femininas pode resultar uma visão mais holística sobre a natureza, a dinâmica, as formas e consequências da violência conjugal.
A questão não passa por negar a existência, de facto, de homens violentados, mas pela necessidade de compreender as condições em que a violência é exercida, o que motiva as mulheres a fazerem-no (se se trata de uma "violência defensiva" e/ou de uma "violência ofensiva"), o contexto em que ela ocorre, as consequências que daí podem advir e as interpretações que tanto homens como mulheres elaboram para explicar o fenómeno tendo, portanto, presente vários indicadores que poderão ajudar a enquadrar a questão da simetria/assimetria da violência conjugal.
Nesta comunicação abordar-se-ão alguns dos aspectos teóricos da problemática da simetria da violência no casal através da exploração da literatura recentemente publicada, procurando elaborar-se uma resenha do "Estado da Arte" sobre a mesma.
Investigações recentes têm vindo a sugerir que existe uma simetria na actividade violenta (senão mesmo um predomínio da violência feminina), pondo em causa a noção comummente aceite da assimetria no exercício da violência conjugal. Interessante será perceber que consoante as metodologias e instrumentos de investigação utilizados os argumentos sobre a simetria ou assimetria na violência conjugal pendem ora num ora no outro sentido.
Daí se concluir a necessidade de se estabelecerem, nas investigações em curso, não só critérios rigorosos de análise como também a afirmação da centralidade de determinadas distinções, designadamente, no que respeita aos tipos de agressões e de agressores e também aos tipos de relacionamentos e diferenças de género, evitando deste modo generalizações descuidadas de um contexto para outro.

Da Norma Universal à Acção Local: os direitos das crianças em Portugal e Cabo Verde
Graça Fonseca (CES)
gfonseca113@hotmail.com

Direitos humanos e soberania dos Estados assumem-se como dois princípios constitutivos da actual comunidade internacional, que coexistem e interagem numa relação de tensão dialéctica, que se manifesta num movimento contraditório entre uma expansão desterritorializada de direitos e uma retracção territorializada de políticas: se a codificação de direitos individuais ultrapassa fronteiras nacionais, a sua organização e esquemas de protecção permanecem situadas no plano nacional (Soysal, 1994).
Assim, na actualidade, o Universal assume-se cada vez mais como a referência normativa do Direito dos direitos humanos. Porém, numa comunidade internacional de reduzida densidade institucional, cabe ao Regional e, de modo priveligiado, ao Local a implementação da Norma Universal. E neste exercício, os Estados não são neutrais. A neutralidade imperfeita dos Estados é visível no direito, nas instituições e nas práticas, assentes e delineadas a partir do conjunto de valores sociais e culturais dominantes no colectivo social. E se o direito, as instituições e as práticas de uma determinada comunidade nacional não são neutrais, mas sim económica, social e culturalmente influenciadas, então a norma universal tenderá a produzir resultados diferenciados em sociedades diferentes. Assim, entre a conceptualização universal e a implementação local ocorre um processo de localização progressiva, primeiro por acção das instituições regionais e respectivos sistemas normativos e, posteriormente, por acção do direito e das instituições políticas e sociais que, nas sociedades nacionais, consagram e implementam o direito dos direitos humanos.
Esta articulação entre o Universal e Local constitui objecto central desta comunicação, que tem por base a investigação realizada em Portugal e Cabo Verde no âmbito da Tese de Mestrado, reproduzindo, aqui, as principais conclusões.
Na nossa investigação procurámos analisar as mediações que operam entre a Norma Universal, que, neste estudo, são as normas da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança que consagram as Medidas Especiais de Protecção a crianças em situação de perigo e crianças que praticam crimes, e a Acção Local, comparando a implementação da Norma Universal em Portugal e Cabo Verde.
Partimos da constatação que Portugal e Cabo Verde têm, nesta matéria, um quadro jurídico muito semelhante que consagra, no essencial, as obrigações internacionais assumidas com a adesão à Convenção dos Direitos da Criança. Apesar das suas diferenças políticas, económicas, sociais e culturais, a produção legal em matéria de protecção e promoção dos direitos das crianças aproxima estes dois países, consequência de um intenso processo de transnacionalização jurídica, no qual Portugal se assume como intermediário priveligiado de Cabo Verde. Porém, ainda que estes dois países possuam um quadro jurídico teórico muito semelhante, diferentes níveis de desenvolvimento económico e social, diferentes dinâmicas entre Estado, comunidade e família e diferentes percepções sociais sobre família e infância vão operar, na prática, como filtros que localizam, através dos sistemas legais, judiciais e sociais nacionais, as normas universais Convenção dos Direitos das Crianças.



O papel da família como agente socializador frente ao adolescente infrator
Rosa Emilia Albuquerque de Melo (Universidade Federal da Paraíba) rosa@angolamail.com

Os debates no universo conceitual sobre adolescente infrator parecem deixar em segundo plano o foco que ilumina as análises baseadas na família que propõe a pensar o adolescente como ser em desenvolvimento, que faz parte de um complexo multifacetado, do qual a família é parte constitutiva e principal. Diante da ineficiência das propostas no atendimento a adolescentes em conflito com a lei, que não tem levado em conta tal complexidade; da visão estigmatizada da sociedade sobre eles, propôs este estudo, com o objetivo de refletir o papel socializador da família na perspectiva dos jovens, família e profissionais que atuam junto a Vara da Infância e da Juventude de João Pessoa - Pb, Brasil, na aplicabilidade das Medidas Sócio-Educativas do Estatuto da Criança e do Adolescente. Demonstrando a evolução do conceito de família e qual a influência que as novas formas exercem sobre o adolescente infrator; Identificando o grau de importância que os agentes pesquisados atribuem à família na socialização do adolescente infrator; E demonstrando a escassez de políticas públicas que assistem as famílias no processo de socialização. Participaram deste estudo 18 jovens, de ambos os sexos, com idade entre 15 e 19 anos, que responderam ou respondem a processos na Vara acima citada, e suas respectivas famílias, como agentes privilegiados entrevistamos, 02 Juízes de Direito, 02 Psicólogas, 03 Assistentes Sociais e 01 Pedagoga, todos funcionários da respectiva Vara. A entrevista individual com roteiro semi-estruturado foi o principal instrumento de coleta de dados, sendo complementada por notas em diário de campo, pesquisa documental e bibliográfica. As falas dos entrevistados também foram utilizadas como dados complementares para conferir ênfase ao tema que estava sendo abordado. A análise desenvolveu-se utilizando uma abordagem qualitativa dos dados numa perspectiva analítico-crítica. E demonstrou que as várias facetas na vida e composição familiar que influenciam o adolescente são apontadas pelos profissionais, pelos jovens e inconscientemente pelos pais como sendo a maior dificuldade deles viverem o dia-a-dia longe das infrações. A vida concreta desses adolescentes é percebida por eles pela precariedade, não só econômica, mas também de vínculos, eles vivem sofrendo a influência de violência, na provisoriedade e na instabilidade, perpassados por aspectos psicossociais como estigmatização e culpabilização. A vivência dessa realidade parece gerar sofrimento, freqüentemente, expresso pela revolta como forma de demonstrar a inconformidade diante das condições de existência e dos tratamentos recebidos. Os pais não requerem aquilo que os filhos tem de direito, por desconhecerem seus próprios direitos e também fica claro a omissão do Poder Público e a passividade que os agentes privilegiados, conhecedores de suas obrigações e de tais direitos, quanto à falta de políticas públicas que proporcione condições dos adolescentes abandonarem de vez esse tipo de vida. A coexistência desses motivos, dentre outros, acrescido da humilhação e descriminação e truculência com que se referem ser tratados pela polícia, parecem favorecerem a inclusão no mundo do crime. Expressam o desejo de socialização, passando pela profissionalização e retomada dos estudos, para isso refere-se sempre a necessidade de apoio familiar e profissional dos que estão ligados às Medidas imposta pelo M.M. Juiz, sem os quais a socialização não deve passar de uma ilusão, que descrimina, humilha e gera sofrimento.

Representações e práticas de violência conjugal em casais de diferentes meios socioprofissionais
Isabel Dias (Universidade do Porto)

A presente comunicação pretende dar a conhecer alguns resultados essenciais de uma investigação onde, entre outras formas de violência na família, se analisou a violência sobre as mulheres no contexto das relações conjugais. Através de uma metodologia intensiva-qualitativa, procede-se à análise de um conjunto de variáveis, de forma a compreendermos de que modo as construções simbólicas de cada género e do casal sobre esta realidade orientam (as suas) práticas de violência concretas.

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