Os Akan-Agni Morofoé da Costa do Marfim (África do Oeste) frente à emergência e à disseminação do HIV/AIDS
Acácio S. Almeida Santos (Universidade de Santo Amaro)
acacioalmeida@terra.com.br


Segundo dados UNAIDS, 24,5 milhões de mulheres, homens e crianças estão infectados pelo vírus HIV na África subsaariana e, entre os países de língua oficial francesa da África do Oeste, a Costa do Marfim é, certamente, o que mais óbitos ocasionados pela AIDS acumulou, desde o início reconhecido da epidemia nos anos 80, até o mês de dezembro de 1997, 420.000 mortes.
Por trás das estatísticas nota-se que o impacto do HIV/AIDS na Costa do Marfim, assim como também em outros países da África subsaariana, se dá em esferas largamente incomensuráveis: sofrimentos, lutos, mudanças, perdas globais, criatividades interrompidas e gerações aniquiladas.
Nas sociedades agrícolas, o desaparecimento prematuro de uma geração, além de promover o crescimento de uma multidão de órfãos, rompe a transmissão de conhecimentos teóricos e práticos primordiais, colocando em grave situação a subsistência de populações inteiras. Nessas mesmas sociedades onde muitas vezes as mulheres são responsáveis por 50% a 80% da produção de alimentos, quando uma mulher adulta adoece ou falece a segurança alimentar quase sempre entra em crise.
Neste estudo discute-se, através de dados obtidos com o trabalho de campo desenvolvido por nove meses na Costa do Marfim (África do Oeste), questões relacionadas às práticas sociais dos Akan-Agni Morofoé diante deste novo e importante elemento impactador da realidade: o HIV/AIDS.
Certamente, somente a partir de um amplo conjunto de informações oriundas de análises realizadas em diversos níveis e levando em conta variáveis que vão da biologia e do psiquismo individual à estrutura socioeconômica, às práticas sociais e às representações da saúde e da doença, será possível estabelecer os reais fundamentos de avaliações da efetividade das ações preventivas e terapêuticas em nível da saúde coletiva nos diferentes países e grupos atingidos pelo HIV/AIDS na África subsaariana e na Costa do Marfim mais especificamente.


Oficinas de prevenção e adolescentes: uma proposta a ser enfatizada
Rosângela de Sant'Anna Dall'Agnol (FEEV ALE)

Este trabalho apresenta o projeto de intervenção desenvolvido através de Oficinas de Prevenção de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST's) / Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e Saúde Reprodutiva, cujo objetivo é viabilizar a formação de multiplicadores informais entre adolescentes de baixa renda bem como potencializar e qualificar a adoção de medidas preventivas.
O grupo realizou 10 oficinas, com encontros semanais, com a duração de 01:30 min. cada. Participaram do trabalho 27 adolescentes, sendo 11 do sexo masculino e 16 do sexo feminino, com idades entre 14 e 21 anos.
Foi priorizada a adesão dos adolescentes ao grupo, com vistas à socialização das informações transmitidas na rede social na qual os/as mesmos/as estão inseridos bem como referendada a importância das noções relativas ao corpo e à saúde e o grupo como espaço para o exercício da cidadania.
Foram discutidas situações cotidianas que envolvem práticas sexuais mais seguras, desmistificadas situações de risco ao mesmo tempo em que foi possível propiciar um espaço de fala sobre estes temas.
No decorrer das oficinas ficou evidente a relevância de trabalhos desta natureza visto ter-se constatado a existência de um abismo entre o conhecimento de métodos de prevenção e a utilização dos mesmos em situações reais, estejam estas relacionadas ou não a DST's, AIDS, consumo de bebidas alcoólicas ou drogas o que pode foi exemplificado na fala dos jovens: "quando chega na hora H, todo mundo esquece tudo que aprendeu, e aí não tem jeito".
Este trabalho contribui, no sentido de constatar-se que, para se alcançar uma mudança de postura, é necessário desenvolver atividades sistemáticas, que valorizem as características do grupo, respeitando suas crenças e valores.
Um aspecto a ser mencionado na transmissão de informações foi o desafio de fazê-lo de forma não preconceituosa, não desrespeitosa para com os valores e as crenças da população com a qual o trabalho estava sendo desenvolvido. Este procedimento possibilitou a conscientização de que realizar um trabalho de qualidade em prevenção não significa que todos/as pensem e se comportem da mesma maneira, mas sim possibilitar o conhecimento e a reflexão. Não é coerente nem correto, em nome de um trabalho preventivo, avaliar padrões de comportamento, atribuindo o valor de correto àqueles que estão sintonizados com a maneira dominante do pensar.
Um ponto que muito pouco tem sido mencionado nas políticas preventivas relativas à população adolescente refere-se ao processo decisório e às tomadas de decisão assumidas por esta população. Como trabalhar prevenção com adolescentes que não se sentem legitimados a tomar posições frente às diversas circunstâncias em que estão envolvidos? Este aspecto é indispensável para que tenhamos não somente uma menor incidência de AIDS entre adolescentes, mas fundamentalmente, para que estejamos contribuindo com o desenvolvimento de indivíduos, que exercem suas cidadanias, lutando por seus direitos ao mesmo tempo em que cumprindo com suas obrigações.
É preciso acreditar que trabalhamos junto a pessoas capazes de se responsabilizar por suas decisões. A relevância deste princípio baseia-se em: a) ao intervir busca-se a facilitação no que tange a ajuda que se oferece aos indivíduos para que eles próprios alcancem as suas metas e b) sabe-se que a luta contra a AIDS, a autodeterminação no evitamento de situações de risco é um alicerce importantíssimo, sem o qual talvez quase nada se conquiste.

Algumas reflexões sobre casais sorodiscordantes para o HIV
Ivia Maksud (Universidade Estadual do Rio de Janeiro)

Essa reflexão se trava no interior de um trabalho mais amplo sobre conjugalidade e HIV/AIDS, no qual pretendo analisar a dinâmica conjugal de pessoas inseridas em relacionamentos marcados pela presença do HIV/AIDS. Para os limites dessa apresentação, pretendo discutir questões concernentes à identidade de gênero e ativismo de um grupo demarcado social e temporalmente no espaço. Trata-se de uma reflexão sociológica sobre casais sorodiscordantes freqüentadores de uma organização não governamental de luta contra a AIDS. Se por um lado, inserção desses casais numa atividade/serviço disponibilizada por uma ONG pode enviesar ou obscurecer um olhar mais generalista sobre os casais, por outro lado, possibilita acentuar o entendimento de códigos e valores de atores participantes de uma "nova" configuração da epidemia brasileira de HIV/AIDS. São mulheres e homens com orientação definida majoritariamente como heterossexual, de baixa escolaridade e renda. O trabalho põe em confronto a identidade "clássica" dos fundadores/freqüentadores de ONGs/AIDS, homens homossexuais (intitulados e que se auto-intitulam como "homens que fazem sexo com homens"), e tradicionalmente auto-classificados como ativistas, ao reunir pessoas de orientação heterossexual, com uma prática política restrita e marcadamente não ativista. É discutida a modelagem dada ao imaginário social sobre sexualidade e conjugalidade a partir de valores mais gerais, como sexo, saúde, morte e doença. O trabalho também chama atenção para um "domínio da oralidade/reflexividade", adquirido por esses casais, que difere da escolarização, ou da internalização de regras sociais aprendidas no contexto familiar. Esse dispositivo é acionado, em algum momento da sua vida, pelo sistema de saúde ou outros serviços, alternativos, em decorrência do diagnóstico de HIV/AIDS. Essa nova "entrada" acaba interferindo no plano cultural, pela inculcação/aprendizado de valores distantes de seu imaginário cultural de origem (tal como o conhecimento de outras expressões de orientação sexual; um alargamento nas concepções de gênero; uma prática política mais reivindicatória/ativista etc.).

Mulheres soropostivas e relações afectivo-sexuais entres a confiança e o descuido
Carolina Magda Oliveira Ferreira da Costa
Josenice Ferreira de Araújo (Universidade Federal da Paraíba)

O presente trabalho teve como foco investigativo apreender as concepções das mulheres soropositivas acerca da sexualidade e de suas relações afetivo-sexuais. Os objetivos propostos eram investigar se essas concepções influenciaram na adoção de práticas sexuais de risco; detectar se a contaminação feminina pelo vírus HIV era decorrente do descuido com a saúde reprodutiva ou se era causada por uma confiança ilimitada no companheiro. A AIDS "síndrome da imuno-deficiência adquirida" é uma doença sexualmente transmissível, que começou a ser identificada no princípio da década de 80 e que completou mais de 20 anos de existência cientificamente comprovada no planeta Terra. No Brasil, os primeiros casos de contaminação feminina pelo vírus HIV/AIDS ocorreram no Estado de São Paulo em 1983, inicialmente em mulheres que eram profissionais do sexo. A AIDS se expandiu e contaminou vários grupos de pessoas de ambos os sexos (crianças, jovens adultos), e de várias classes sociais, não se limitando como se acreditava aos ditos grupos de risco: homossexuais, profissionais do sexo e usuários de drogas. No caso das mulheres soropositivas, a fidelidade feminina deixou de ser barreira para a entrada das DST's/ AIDS em seus lares, e a idealização do lar como "lugar sagrado" começou a ser questionado e a se decompor. A maioria dos maridos e companheiros dessas mulheres detinham práticas sexuais consideradas "desviantes" e de alto risco que levou-as a contaminação. Sendo assim, a confiança ilimitada no companheiro, a passividade feminina em relação à prevenção e o desconhecimento da doença tem aumentado o risco de contaminações e tem influenciado as relações afetivo-sexuais que anteriormente, eram concebidas como atividades prazerosas e após a contaminação, são idealizadas e negligenciadas como algo pecaminoso, errado e que traz em si o sentimento de culpa e o medo de transmitir essa doença a outras pessoas. Com a contaminação pelo vírus HIV/AIDS, as relações afetivo- sexuais sofreram algumas modificações, devendo-se a concepção negativa que incorpora uma moralidade e uma culpa relativa ao conhecimento e aos cuidados com o corpo feminino implementados dentro de relações sociais de gênero.

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