Dilema de Transição Política na África Lusófona: De Uni para Pluripartidarismo.
Manuel Jauará. (Universidade Federal de São João Del Rey)
jaubel@uol.com.br

Adoção do pluripartidarismo, com simples abolição da cláusula constitucional que outorgava a exclusividade política ao partido do governo e proibia outras formas de organizações e manifestações políticas foram as principais reformas constitucionais que precederam ao pluripartidarismo nos países da África lusófona Não houve em nenhum deles eleição de uma assembléia constituinte exclusiva ou inclusiva que precedesse o sistema pluripartidarismo adotado neles. O novo momento político, que se vive nesses países corre o risco de causar decepção às massas populares, num período não longo. Isso porque, o novo momento político induz a pensar que a democracia se limita ao processo eleitoral e as demais regras são irrelevantes. Só que a eleição não acaba, como num passe de mágica, com a fome,desemprego,analfabetismo, mortalidade infantil e subdesenvolvimento crônico. A euforia eleitoral que se apropria da África lusófona impede ou deixa para segundo plano, as discussões das questões substâncias, como por exemplo: que estratégia política adotar, que além de estimular a modernização das estruturas produtivas e políticas viabiliza também, a incorporação da contribuição cultural, produtiva, política e social das comunidades etnorurais.
Na maioria dos casos, mesmo depois de completada a transição democrática resta ainda, muitas tarefas a serem cumpridas, condições a serem estabelecidas e altitudes e hábitos a serem cultivados, antes de a democracia poder ser considerada como consolidada. Em essência, entendemos por democracia consolidada uma situação política onde, em síntese, a democracia passou a ser "o único jogo disponível na sociedade".Em termos constitucionais, a democracia se torna o único jogo disponível na sociedade quando todos os atores da comunidade política habituam-se ao fato de que todos os conflitos políticos serão resolvidos de acordo com as normas
estabelecidas, e que as violações dessas normas provavelmente serão ineficazes e sairá cara, segundo axioma de Robert Dahl (1970). Em suma, com a consolidação, a democracia se torna rotina, além de profundamente internalizada na vida social, institucional e até mesmo psicológica, bem como nos cálculos visando atingir o sucesso (Stepan,p.24).
A característica eleitoral das primeiras eleições pluripartidárias, na África lusófona (19991/94) seguiu o modelo do leste europeu. A oposição se apresenta como a salvação nacional perante às massas populares, o governo vigente é sempre associado à corrupção, à ineficiência, à incompetência (etc.).Tudo isso pode ser verdade, mas não esgota a questão.E, se esses mesmo males vierem afetar os novos governantes (o que não é nenhum delírio; haja vista as irrupções sociais, na Argentina e Venezuela em 2002) como então convencer, ainda assim, o povo de que o sistema pluripartidário, apesar do contratempo, é ainda, melhor que o anterior, onde nada era transparente?Qual será em face disso, os argumentos dos políticos, da elite dirigente, das agências internacionais que monitoram e incentivam a democratização e o respeito aos direitos humanos na África lusófona? A grande questão nos parece ser hoje, como equacionar o principal dilema, ou seja, como promover a transição democrática de uma maneira segura, contínua e assegurar ao mesmo tempo sem grandes rupturas, a política de consolidação da unidade nacional. Em que medida os diferentes valores culturais, estruturais e organizacionais das comunidades etnorurais desses países concorrem para ossificação das suas identidades nacionais? Ou então, saber em que medida as diversidades culturais e concepções cosmológicas servem de obstáculos à moldagem das identidades nacionais? Será que na realidade existe dificuldade de dialogo entre etnias/culturas nessas sociedades nacionais a ponto de ser uma ameaça potencial a política de unidade nacional, ou tudo não passa de conjecturas de intelectuais e armadilhas de lideres políticos para assegurarem e consolidarem por muito tempo a hegemonia do bloco no poder, como diria Gramsci?
A democracia é necessária. Todo o ser humano almeja viver numa sociedade livre. É preciso, todavia, ressaltar que não existe um modelo único e talhado para a democracia. Cada povo molda o sistema democrático a sua cultura política, a realidade do seu país.Importar e reimplantar modelo político ou constitucional sem ajustá-lo a cultura política da sociedade em causa, é criar simplesmente uma democracia imaginaria, uma ficção política, de pouca consistência e praticidade.
Considerando que o pressuposto nuclear que lastra esta comunicação é análise do dissenso e apreensão das causas desse dissenso, entre os luso-africanos e os etnorurais na Guiné-Bissau e por extensão em toda África lusófona, em torno das questões centrais que devem nortear a formulação da estratégia política do processo da construção da nação. Torna-se relevante nesse caso, tendemos a pensar assim, analisar nessa formulação, duas questões que nos parecem fundamentais, a saber: um no domínio político e outro no domínio econômico.
No plano político, os dirigentes africanos ainda têm que resolver um dilema: como organizar o seu aparelho administrativo, para poder dar racionalidade a gestão da rex-pública? Como organizar as instituições políticas, executivas e jurídicas para que tenham respaldo do povo, ou melhor, legitimidade? Os lideres emancipacionistas das ex-colonias portuguesas viram-se frente a este dilema: ou inspirar-se no modelo jurídico-constitucional da antiga metrópole ou então estruturar os seus países sob a inspiração das estruturas organizacionais da África ancestral. Adoção de cada modelo tem os seus prós e contra. Se se adotar o modelo da antiga metrópole , em tese o país teria uma gestão mais racional, posto que poderia contar com um número razoável de técnicos e funcionários herdados do governo colonial e também com estruturas organizacionais já montadas. Problema seria expandir as mesmas e criar novas estruturas segundo as demandas que vão surgir em função da exigência e da necessidade que vão surgindo na sociedade e treinar novos funcionários que assumirão as tarefas administrativas . O lado penoso desse modelo estaria na sua ilegitimidade por ausência de respaldo popular, em função da limitação desse modelo. Entre os quais: número excessivo de analfabetos, que ficaram em conseqüência, a margem do processo da modernização; fosso social estimulado por esse modelo, sobretudo entre a elite urbanizada e a população etnorural, que é a maioria nessas sociedades. A exclusão social dessa parcela da população do processo decisório na arena política, produtiva e além de dificuldade de acesso a equipamentos sociais, escolas e políticas de proteção social herdadas na sua maioria do governo colonial.


O Congresso Nacional e o Poder Executivo no Brasil
Charles Pessanha (Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ)
cpessanha@iuperj.br

O presente trabalho tem como objetivo analisar o desempenho do Congresso Nacional, a partir de 1988. O Poder Legislativo no Brasil adotou, desde a primeira constituição republicana, um modelo bicameral, composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Ambas reunidas formam um Congresso Nacional composto pelos parlamentares das duas Casas. A Constituição Federal de 1988 e a legislação infra-constitucional ratificaram o sistema bicameral que, além de prever atribuições específicas para cada uma das Casas, prescreve competências específicas para o Congresso Nacional. Ao contemplar seu elenco de atribuições nos aproximamos virtualmente de uma terceira câmara legislativa a quem cabe privativamente, entre outras funções (1) deliberar sobre os vetos presidenciais aos projetos de lei; (2) apreciar as medidas provisórias emitidas pelo executivo; (3) e exercer o controle externo do executivo, mediante a apreciação do parecer prévio emitido pelo Tribunal de Contas da União nas contas anuais do Presidente da República.


Nação e Estado na Constituição da República Cabo-verdiana
João Octávio da Rocha Nascimento (Instituto Superior de Educação de Cabo Verde)
octnascimento@mail.pt

A 19/09/56, Amílcar Cabral e outros nacionalistas guineenses e cabo-verdianos fundaram o PAIGC, tendo libertado as duas antigas colónias, conquistando a soberania dos respectivos Estados, ao mesmo tempo que lançava as bases para a construção de uma sociedade livre em cada um dos Países. A afirmação dos Estados independentes não coincidiu com a instauração de regimes de democracias pluralistas, tendo antes a organização dos poderes políticos obedecido à filosofia e princípio caracterizadores dos regimes de partido único.
O exercício do poder no quadro desse modelo demonstrou a necessidade de introduzir profundas alterações na organização da vida política e social dos Estados. Novas ideias assolaram o mundo, fazendo ruir estruturas e concepções que pareciam solidamente implantadas, mudando completamente o curso dos acontecimentos políticos. Em C. Verde a abertura política foi anunciada em 90, levando à criação das condições institucionais necessárias às primeiras eleições legislativas e presidenciais num quadro de concorrência política.
Assim sendo, a 28/08, a Assembleia Nacional Popular aprovou a Lei Constitucional n.º 2/III/90 que, revogando o art. 4.º da Constituição e institucionalizando o princípio do pluralismo, consubstanciou um novo tipo de regime político. Concebida como instrumento de viabilização das eleições democráticas e de transição para um novo modelo de organização da vida política e social do país, não deixou contudo de instituir um diferente sistema de governo e uma outra forma de sufrágio, em véspera de eleições para uma nova assembleia legislativa. Foi nesse quadro que se realizaram as primeiras eleições legislativas a 13/01/91, seguidas, em 14/02//91, de eleições presidenciais. A expressiva participação das populações nessas eleições demonstrou claramente a opção do país no sentido da mudança do regime político.
O contexto histórico preciso em que se reconheceu os partidos como principais instrumentos de formação da vontade política para a governação, conduziu a que a democracia pluralista continuasse a conviver com regras e princípios típicos do regime anterior. A realidade social e política em que vivia o país, encontrava-se num processo de rápidas e profundas transformações, com assunção por parte das populações e forças políticas emergentes de valores que caracterizam um Estado de Direito Democrático. Cabo Verde foi dotado de um quadro normativo, de acordo com o novo modelo instituído, que permitiu a necessária estabilidade a um país de limitados recursos.
A reflexão constitucional sobre o conceito da nação cabo-verdiana, tal como acontece em relação às demais nações, é, em termos sociológico e jurídico, inevitável. Do ponto de vista jurídico a nação ou o povo cabo-verdiano aparece como o único titular da soberania, cuja atribuição é exclusiva, originária e indivisível e reflecte-se na própria concepção do poder constituinte. Visto à luza da política, a nação é a estrutura sociológica, a comunidade histórica e cultural que suporta e justifica a organização política do Estado de Cabo Verde.


40 Anos de um golpe que não terminou
Ezilda Duarte Ferreira (Universidade Estácio de Sá)
ezildaferreira@yahoo.com.br

O trabalho destaca tanto no golpe de estado de 1964 quanto nos governos a ele subsequentes a presença de civis e de alguns bem definidos valores civis que lhe deram origem e continuidade apesar do comando militar que dominou todos os seus momentos até a chamada "abertura". Destaca, por isso, na reciclagem de valores que foi possível devido à ditadura militar, a progressiva influência nos meios de comunicação de massa de valores individualistas que prevaleceram sobre o remanescente nacionalismo popular dos anos anteriores a 1964 e sobre a tentativa de se impor um nacionalismo de caserna por parte dos governos militares. E prossegue indicando como continua em andamento essa reciclagem que tem por objetivo a formação de uma sociedade predominantemente individualista compatível com as instituições políticas liberais e com todo o processo de quebra da anteriormente posta legislação de proteção social. Em tudo isso, considera as prováveis influências externas e as relações desse processo com as diversas conjunturas internacionais. Avalia ainda como o atual governo, apesar de ser do partido que praticamente dominou todo o eleitorado chamado "de esquerda", até o momento, não afetou em nada o crescimento na recente história brasileira desses valores individualistas cujo domínio se deve a bases estabelecidas por civis há 40 anos atrás num golpe militar.

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