A localização das desigualdades e diferenças pelos jovens: um estudo de caso.
Jaileila de Araújo Menezes (Universidade Federal do Rio de Janeiro)

Estudo das possibilidades de subjetivação política na contemporaneidade, tomando as relações de amizade entre jovens como uma situação social onde temas como o público (território de convivência entre os diferentes), o privado (projetos estabelecidos pelo eu), o político (reconhecimento e valorização das diferenças, mas também desafio às relações de subordinação), a ética (respeito às diferenças), o discurso (forma que dispomos para nos apropriar do mundo a que chegamos na condição de estranhos e novos), a ação (o que, ao mesmo tempo, nos iguala e destinge dos demais) e o exercício da crítica (localização dos conflitos inerentes à vida social) podem se atualizar. A pluralidade e a diferença que caracterizam a condição da política no contemporâneo convidam as subjetividades para um reposicionamento diante do outro e do mundo. Implica a elaboração de uma crítica aos princípios da democracia liberal, defensora da razão universal, da unidade e do consenso e uma postura de recusa ao modelo subjetivo que lhe é correlato, pautado no individualismo xenófobo, alérgico à alteridade e antipolítico, pois incentivador da busca, prioritária, de auto-realização na esfera privada. Quebra do monopólio do consenso, da transparência, da identificação, da extrema intimidade em prol da hipertrofia da assimetria, da heterogeneidade e da alteridade. Nessa visada ético-política, a amizade toma a forma de um vínculo, pautado na distância, no "entre", espaço necessário ao desenvolvimento do respeito e da tolerância pelo outro, condições primordiais para o desenvolvimento de uma democracia generosa com a diferença. Vale ressaltar que não se trará de uma pura e simples celebração das diferenças, mas sim do reconhecimento de que certas diferenças são construídas em relações de subordinação e por isso devem ser desafiadas em condições de DEMOCRACIA RADICAL, para fazer referência à proposta política de Chantal Mouffe. Nessa situação democrática, pode-se distinguir entre diferenças que existem, mas que não deveriam existir e diferenças que não existem, mas que deveriam existir. A proposta da amizade ético-política foi vivenciada por jovens através de um trabalho em grupo no formato metodológico de oficina que marca a singularidade de uma pesquisa social-clínica, principalmente por diferencia-la de um tipo de pesquisa que denominamos de "identitária". Na pesquisa social-clínica interessam os "momentos de diferenciação", ou seja, momentos que expressam a constituição de um novo modo de pensar e agir que se gesta no grupo, no encontro com os demais, na atividade narrativa de apreender as diferenças e/ou desigualdades. Ao longo dos encontros da Oficina da Amizade, o exercício de pensar junto sobre como constroem suas relações com o diferente latente (o amigo do qual os jovens buscam eliminar as diferenças e ressaltar as afinidades) e o diferente manifesto (aqueles que representam para os jovens em questão a figura avessa do amigo, aqueles com relação aos quais são indiferentes e julgam como inimigos) conduziu os jovens a uma reconstrução sentimental e afetiva com relação aos que denominavam de "amigos" e aqueles que localizavam como sendo o "oposto do amigo", reinventando os laços sociais de um viver junto.

 

Adolescentes autores de ato infracional no sul do Brasil e as tentativas de inclusão social
Marli Palma Souza (Universidade Federal de Santa Catarina)
Regina Célia Mioto (Universidade Federal de Santa Catarina)

Estudos no Brasil têm revelado o aumento significativo do número de atos infracionais praticados por adolescentes. Esta informação tem contribuído para a formação de uma imagem de jovens violentos, estereotipados como "delinqüentes", dos quais a sociedade deve se proteger. Porém, autores como Passeti(1995), Oliveira(1996) e Rosa(1997) afirmam que os adolescentes não são mais propensos a praticar ações violentas, ou possuem menos controle de suas atitudes, uma vez que as suas condutas concentram-se em infrações contra o patrimônio, e portanto tendem a refletir os problemas de uma sociedade cada vez mais excludente e desigual.
Como vítimas ou vitimizadores os adolescentes em conflito com a lei configuram uma realidade perversa quase sempre cercada de omissões de toda ordem e sobre os quais pouco se conhece. De maneira geral, não se sabe como estes jovens estão sendo atendidos a partir do momento que praticam um ato infracional. Isso porque, se de um lado temos
o "Estatuto da Criança e do Adolescente", uma lei inovadora promulgada em 1990, que preconiza, através de "Medidas Sócio-educativas", processos de atenção integral a estes seres em desenvolvimento e que podem ser consideradas como última tentativa da inclusão social desses jovens; por outro temos informações do número significativo de adolescentes que, após a aplicação de "Medidas Sócio-educativas" voltam a reincidir em atos infracionais.(Souza, 2001; Mioto,2001) .
No ano de 2001, o Fórum Nacional de Pró-reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras junto com a UNESCO, e esta em parceria com o Ministério da Justiça convidaram, as universidades brasileiras a se engajarem no processo de conhecimento da realidade social dos adolescentes em conflito com a lei. Tal engajamento teria como finalidade indicar alternativas que pudessem subsidiar a implementação de políticas públicas adequadas ao atendimento, em curto, médio e longo prazo das demandas colocadas pelos jovens autores de atos infracionais.
No estado de Santa Catarina, situado na região sul do país, o desenvolvimento do trabalho ficou sob a responsabilidade da Universidade Federal de Santa Catarina e da Universidade Estadual de Santa Catarina além de outros parceiros. Para atender os propósitos elencados definiu-se como objetivo geral, elaborar diagnóstico sobre os programas de execução de "Medidas Sócio-educativas", impostas aos adolescentes em conflito com a Lei, no estado de Santa Catarina, bem como propor alternativas que consubstanciem a política de atenção integral a esses adolescentes.
Na perspectiva de dar amplitude ao diagnóstico, o grupo de trabalho optou por realizá-lo através de duas metodologias distintas.
A primeira constou de uma pesquisa empírica de caráter exploratório para atingir, por amostragem 513 adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa, 282 coordenadores de Programa e Instituição acolhedora de Prestação de Serviço à Comunidade, 453 Técnicos, Orientadores, Educadores e Monitores que atendessem adolescentes em cumprimento de medida sócio-educativa.
A segunda metodologia foi o desenvolvimento, através da realização de um seminário, de uma avaliação qualitativa sobre a execução das medidas sócio-educativas. Para tanto, foram utilizadas técnicas de trabalho participativo orientadas e subsidiadas por: conferências, materiais didáticos, roteiros de reflexão, mediadores e monitores. A produção dos grupos de trabalho, bem como das sessões plenárias foram documentadas por monitores e analisados pelo grupo de trabalho.
Considerando a extensão da pesquisa que se desenrolou desde 2001até
2003 e o volume de dados coletados, privilegiou-se, neste resumo, descrever o processo que permitiu o diagnóstico no Estado. A elaboração do trabalho permitirá a discussão dos resultados.

 

A exclusão social travestida de inclusão social: análise dos processos grupais de educadores e adolescentes em situação de risco pessoal e social
Soráia Georgina Ferreira de Paiva Cruz, Juliana Uesono, Daniele Moreno Passos, Paula Ione da Costa Quintemo Fiochi, Danilo Lima Tebaldi, Marina Bevilacqua Alves de Lima, Sara Gobbo, Camila Ramos Pereira, Julliana Polastrini, Roberta Grangel da Silva, Elizandra Prates de Oliveira.

A presente intervenção é realizada num estabelecimento de assistência à infância e adolescência considerada de risco pessoal e social. Este se situa no interior paulista, possui caráter filantrópico-caritativo-religioso. Tal estabelecimento surgiu durante o período da ditadura militar, na década de 60170, juntamente com a criação das FEBEMs e FUNABEMs. Nesse contexto histórico foi produzida a figura de criança e adolescente perigosos para si e para os outros e estes estariam propensos ao crime e à marginalização social pelo fato de pertencerem a classe empobrecida socialmente. Percebe-se, então, a associação entre criminalidade e pobreza, discurso esse veiculado até hoje pelos agentes institucionais deste estabelecimento. Assim, as crianças e adolescentes eram vistos pelos educadores como futuros transgressores da lei e da ordem. Fomos chamados a intervir no sentido de normalizar e normatizar esta população, gestando uma administração útil dos homens. Nesse sentido a demanda era de que reafirmássemos as práticas de tutela e controle, gerenciadas pelo Estabelecimento. Tais práticas eram invisíveis, pois estão travestidas pela pedagogia caritativa-filantrópica. Para que pudéssemos ter visibilidade das forças em jogo na instituição, formamos cinco grupos de adolescentes com idade variando de doze a dezessete anos e com os agentes institucionais composto por vinte e seis membros. Os grupos foram pensados como dispositivos que produziriam cartografias que desenhassem movimentos de exclusão maquiadas por inclusão social. Assim, nossa postura foi de problematizar os processos de burocratização, estreotipias e naturalizações da infância e adolescência empobreci da e por esse motivo considerada perigosa para si e para a sociedade. Realizamos vinte e cinco oficinas semanais com os agentes institucionais e praticamente quinze encontros com cada grupo de adolescente. Percebemos acontecimentos diferentes em todos os grupos. No grupo dos agentes institucionais ganharam visibilidades os seguintes movimentos: atuam no Estabelecimento com o senso comum sobre criança e adolescente e portanto reafirmavam o lugar da adolescência de risco pessoal e social; não tinham um plano pedagógico a não ser o caritativo e filantrópico para atuar com os clientes, mantinham relações fortemente hierarquizadas que transpunham para a relação com os adolescentes; sentiam-se privilegiados por estarem atendendo a terceira geração de assistidos sem se darem conta que tal fato reproduzia a exclusão social; os cursos oferecidos como profissionalizantes, são cursos que não possibilitam a inscrição do adolescente em outros campos sociais; para eles 60% das crianças têm problemas psicológicos e 40% têm problemas de aprendizagem. Enfim, tais conceitos e práticas possibilitavam a manutenção dos adolescentes numa perspectiva geográfica e social. Quanto aos grupos de adolescentes percebemos também vários movimentos: produziam críticas aos cursos de bordado e marcenaria; buscavam inscrever-se em outros campos sociais, universidades, Horto Florestal, enfim, outros espaços da sociedade; reivindicavam o direito de brincar, de cantar, de dançar, burlando as regras do Estabelecimento; criavam peças teatrais onde encenavam seus cotidianos e buscavam em diferentes locais e pessoas novas formas de investimento afetivo. Assim, o dispositivo grupal nos forneceu visibilidade aos jogos de forças vindas dos agentes institucionais e as que os adolescentes investem contra os mesmos. Nesse sentido, buscavam apoderar-se de seus direitos negados pelo Estabelecimento e criavam condições para expandir seus relacionamentos e afetos em outros lugares, não se centrando apenas no estabelecimento. A exclusão pensada como incapacidade dos sujeitos viverem a própria existência, reafirmada pelo Estabelecimento através de suas praticas é cotidianamente contestada, transgredi da, pela práticas dos adolescentes que durante esses dois últimos anos vêm constantemente se reafirmando e se apropriando de outras inscrições no mundo, rompendo com o estigma de perigosos para si e para os outros.


Maternidade na adolescência forma de inclusão e/ou exclusão social.
Filomena Gerardo
Cerlis - Centre de Recherche sur les liens sociaux, Paris V- Sorbonne
fgerardo@net.sapo.pt

Esta pesquisa enquadra-se no âmbito da tese de Doutoramento em Sociologia, sobre a "Construção identitária das mães adolescentes" investigação comparativa entre a situação das mães adolescentes em Portugal e das mães adolescentes no contexto francês .
A maternidade na adolescência pode ser encarada como uma forma de inclusão social quando a jovem se encontra numa situação de exclusão escolar e/ou profissional. A maternidade vem permitir à jovem mãe adquirir o estatuto socialmente valorizante: o de mãe. Com o estatuto de mãe, a jovem podem ainda acumular as regalias sociais que acompanham a maternidade tais como: a aquisição do abono de família, à do rendimento mínimo, entre outras.
Para as instituições de acolhimento de mães adolescentes a sua função primeira é a da integração social da jovem. Por isso, observamos que as jovens mães em contextos institucionais têm a possibilidade de frequentarem uma formação profissional, o que dá uma maior probabilidade a estas mães adolescentes de integrarem o mundo do trabalho, dado que adquiriram uma formação escolar e profissional.
É interessante observar que, se numa primeira fase a maternidade permite a inclusão social através da aquisição de um novo estatuto social e dos benefícios ligados à maternidade. Numa segunda fase, verifica-se que consoante a situação familiar e a situação perante o trabalho das mães adolescentes, estes podem ser factores de exclusão social.
Em termos da situação familiar da " mãe adolescente " pode estar associada à noção de "mãe solteira". E segundo as normas socialmente estabelecidas a maternidade "deveria" surgir no seio de um casal. Por conseguinte, a exclusão social passa também pela monoparentalidade, este é outro factor exclusão social. A monoparentalidade só por si só representa para estas jovens uma forma de exclusão social, dado que a aquisição do estatuto de "mãe" é valorizante em termos sociais quando este é vivido no seio conjugal. A maternidade para as adolescentes quando esta é desejada tem por objectivo a constituição da sua própria família.
A situação perante o trabalho é outra das formas mais visíveis da exclusão social da jovem mãe. Ao analisarmos a situação de " mãe adolescente " existe uma forma de contradição em termos cronológicos, porque ser mãe é um dos atributos da idade adulta e elas são adolescentes/jovens. Deste modo, o que segundo as jovens assunta os empregadores é de saber se elas vão serem capazes de acumular duas responsabilidades: a do trabalho e a de cuidar de uma criança. A mãe adolescente acumula vários elementos que do ponto de vista do mundo laboral podem ser problemáticos é o de ser jovem ao qual se associa a noção de imaturidade e ao mesmo tempo a de ter um filho. E quando a jovem se encontra numa situação de monoparentalidade outro factor adicional de exclusão para o empregador, mas também para a jovem que não tem meios para mandar guardar o seu filho. Torna-se problemático para a jovem mãe conciliar a dimensão laboral, e o exercício da parentalidade.
Quando a mãe adolescente se encontra na situação de "mãe só" o estatuto de mãe torna-se estigmatizante para ela e desencadeia situações de grandes dificuldades económicas ou até mesmo de pobreza.
No caso específico desta investigação constatamos que a "mãe adolescente" passa por constantes alternâncias entre a situação de inclusão social dada pela maternidade e ao mesmo tempo de exclusão social.


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