Reconfiguração do conceito velhice
Maria Ester Vaz , Luisa Ferreira da Silva e outros
estervaz@netcabo.pt

Nesta comunicação analisa-se a evolução do conceito de velhice tendo por base as categorias de idade e classe social associadas à definição e posicionamento das políticas sociais face à velhice.
A noção de idade é produto da prática administrativa (Lenoir, 1998: 65). Mas a idade não é um dado natural mesmo quando serve de instrumento para medir a evolução biológica; ela é uma noção social de comparação com os diversos membros (Halbwachs, 1935).
A visão do mundo social integra uma repartição de tarefas entre os grupos sociais e as suas categorias de percepção que mantém ou transforma a posição de cada um no espaço social (Bourdieu, 1984, pp. 3-12).
Os critérios de idade e de classe social produtiva associaram-se ao aparecimento de instituições e profissionais especializados com uma afirmação dos interesses da classe dominante. A classificação de pessoas "idosas" evidenciou-se por discursos e apelações bem elaboradas por conselheiros, peritos, serviços especializados e estruturas comerciais. O conjunto destes procedimentos induziu a uma ordenação social que os aparelhos ideológicos de Estado impuseram aos cidadãos por uma interiorização de valores que Saül Karsz (1988) designa por "olhar exterior".
Em Portugal, as políticas sociais têm favorecido a criação de equipamentos sociais como suportes de lazer, complemento alimentar e prestação de serviços. A cidadania das pessoas idosas é reduzida ao acesso a um maior número de bens e serviços. Esta perspectiva de produção de bens de uso revela que os problemas se podem resolver pela acumulação material de comportamentos individuais de consumo.
Os dados empíricos recentes mostram que só as pessoas com mais de 60 anos se preocupam e encaram a idade de velhice com apreensão relacionada a um estado de dependência por ausência de saúde. As dimensões económica e afectiva são eleitas como essenciais para o seu bem estar.


Família e geração: o envelhecimento em pauta
Débora Campos de Paula (mestranda do IMS- Ciências Humanas e Saúde- UERJ )

A análise das representações individuais no âmbito familiar, é tangenciada por temas diversos e profundamente imbricados. As questões relativas a gênero, geração, sexualidade, raça e situação sócio económica são importantes pontos de discussão ao problematizarmos a construção social do sujeito.
No contexto familiar, diferentes atores influenciam e são influenciados pelos valores e dispositivos sociais que contribuem na formação dos papéis e das representações dentro da familia, bem como, deste núcleo com outras experiências sociais.
Esta comunicação visa discutir questões relativas à construção da categoria "idoso" no cenário brasileiro, enfatizando a inserção destes sujeitos nas formas familiares contemporâneas. A correlação entre velhice, perda e desengajamento no âmbito familiar e social. Além da representação da velhice frente a questões como sexualidade, matrimónio e direito reprodutivo.
A velhice, como tema de pesquisa, tem por vezes, sido tratada de forma descontextualizada, caracterizada apenas como um problema de ordem demográfica e de saúde pública é encarada de forma desvinculada às questões de gênero, raça e família. Um exame mais profundo da vivência destes atores, da forma como são representados e como observam a contemporaneidade, abre inúmeras possibilidades de inter relação e de entendimento dos valores que permeiam as relações familiares e sociais de forma mais abrangente.


A Superação das Desigualdades na Velhice - Mais uma Questão Social no Século XXI
Benedita Cabral - Universidade Federal de Campina Grande
beneditaedina@yahoo.com.br

A expansão do processo de globalização incide sobre os diversos aspectos das sociedades contemporâneas afetando expectativas da vida humana (Santos, 1995). Em fins do século XX uma outra "Questão Social": o acelerado envelhecimento das populações e a forma peculiar de vivenciar essa fase do ciclo vital.
Esse tema tem sido amplamente discutido tanto na esfera política e econômica como na esfera acadêmica. Entretanto, o que se observa é a freqüência de processos que excluem e desqualificam interesses dos segmentos mais velhos da sociedade brasileira, como o desmonte da Seguridade Social. Por outro lado, as conquistas de legislação favoráveis na última década, tais como, a Lei do Idoso (1994) e o Estatuto do Idoso (2004) são indícios importantes das chances de se alcançar inserção democrática desses segmentos. Enquanto a consolidação dessas conquistas evidencia a luta dos setores da sociedade comprometidas com a ética da cidadania para assegurar a todos os que envelhecerem igualdade de direitos e de possibilidades.

A constituição do problema social envelhecimento transcorrido no século XX é resultado da conjunção de fatores que emergiram no processo de mudanças na sociedade, e que incluem desde as conquistas da liberdade das tecnologias, até as novas relações de poder, bem como, o desenvolvimento das forças produtivas, aumento da expectativa de vida, distribuição da riqueza, novos padrões culturais, negociações entre os Estados, sistemas de controles sobre a vida humana, conquistas na medicina, elevação dos padrões educacionais, difusão dos sistemas de comunicação e muitos outros que, junto aos citados, formam a teia complexa da sociedade pós-moderna (Santos, B. 1994; Featherstone, 1994; Lenoir, 1979; Guillemard, 1989).
Comparativamente aos períodos históricos precedentes à conquista da longevidade surge como novidade, também pelas dimensões que atingiu nas populações da maioria das sociedades. Não sendo fenômeno recente, (ocorre, pelo menos desde o século XIX) efetivo contingente humano tornou-se longevo, sendo objeto de reconhecimento progressivo, através de especulações entre os grupos sensíveis às suas peculiaridades. A conquista da aposentadoria para os trabalhadores envelhecidos poderia ser citada como primeiro resultado desse reconhecimento, (que tornou visível a fragilidade da s regras do trabalho assalariado) incapaz de assegurar a reprodução dos sujeitos, quando se esgotasse sua força produtiva.

O prolongamento da vida foi tratado com desprezo e deixado ao cuidado da caridade religiosa durante muito tempo. Portanto, não fazia parte dos encargos da sociedade, como mostra a literatura. Por outro lado, a expansão da vida, mediada pelo processo de sua transformação em problema da sociedade, refletiu-se em mudanças na classificação das idades, na noção da velhice e influenciou nas relações entre as gerações jovens e velhas, colocando em confronto interesses que dizem respeito à distribuição dos poderes e da riqueza, a transmissão de herança, a ordem familiar, contribuindo também, para elaboração de novos valores culturais. No movimento de constituição desse novo campo e de novos atores no cenário da sociedade, houve a revisão dos cálculos em torno das idades, que operou maior fragmentação no curso da vida conhecido até fins do século XIX. Também surgiu espaço para as novas concepções sobre a juventude e a maturidade, as quais foram subdivididas em novos percursos. Se a sociedade atual adota o culto à juventude num trabalho permanente de inculcação do valor de todos se sentirem e se preservarem jovens, e por isso, serem jovens, a luta de que falava Bourdieu (1983) tende a ser implacável: com a perda dos referenciais etários como parte da organização social, e com cada grupo disputando acirradamente, a possibilidade de permanecer no mesmo lugar preservando por mais tempo o usufruto das conquistas da humanidade.

 

Envelhecimento e discriminação social: alguns dados nacionaisl
José Ferreira-Alves (Universidade do Minho) alves@iep.uminho.pt
Rosa Novo (Universidade de Lisboa)
rfnovofa@fpce.ul.pt

Parece ser verdade que diferentes sociedades valorizam de forma diferente os seus membros mais idosos. Parece haver sobretudo um contraste entre as sociedades ocidentais e orientais na forma como pensam e tratam os mais idosos. De acordo com alguns autores, a discriminação social dos mais idosos irá afectar de forma grave as sociedades ocidentais. No sentido de averiguar quanta e qual a discriminação mais prevalente entre nós, decidimos estudar a ocorrência de vinte formas de discriminação que se revelaram importantes noutros estudos, em sociedades com um ritmo de envelhecimento semelhante ao nosso. Esta apresentação consistirá da apresentação e discussão desses resultados

Terceiro setor, saúde, envelhecimento e atividade física no Brasil: uma análise crítica sobre o projeto "FELIZIDADE".
Bruno Assis de Oliveira, Edson Marcelo Húngaro e José Luis Solazzi (Centro Universitário Municipal de São Caetano do Sul - IMES; GEPOSEF - IMES/SCS; SNDEL
f1bruno@terra.com.br

No presente estudo analisamos criticamente um projeto de Atividade Física e Saúde destinado à chamada população de terceira idade em um município do Estado de São Paulo - São Caetano do Sul - no Brasil: o Projeto "FELIZIDADE". Para a tanto, a metodologia de pesquisa adotada foi a da análise documental efetuada à luz do referencial bibliográfico que havíamos previamente revisado. Interessava-nos, nessa análise documental, verificar com qual concepção de saúde o projeto trabalhava; quais os objetivos que se punha; e os resultados obtidos. Verificadas essas questões passamos à problematização das mesmas e, temos aqui, uma primeira sistematização dos resultados encontrados.
Vale ressaltar que o estudo que ora apresentamos está vinculado ao Observatório de Políticas Sociais de Esporte, Lazer e Educação Física da região do Grande ABC. Este Observatório é fruto de uma parceria entre o Centro Universitário Municipal de São Caetano do Sul - o IMES - e a Secretaria Nacional de Desenvolvimento do Esporte e do Lazer/SNDEL do Ministério do Esporte Brasileiro - o MESP e tem por objetivos mapear e analisar criticamente as Políticas Sociais ligadas aos temas mencionados nessa importante região do Estado de São Paulo que é o ABC paulista.
Resultados: Com as transformações societárias recentes que têm implicado na substantiva alteração das características do Estado, bem como de suas funções, a influência direta desse no atendimento dos direitos sociais em geral e, mais especificamente, na saúde, é cada vez menor. A responsabilidade pelo atendimento de direitos nessa área está sendo transferida, cada vez mais, para a sociedade. A conseqüência dessa transferência é o aparecimento de organizações no interior da sociedade civil caracterizadas pela promoção de ações de natureza privada com fins públicos: o terceiro setor. Dentre estas instituições, encontra-se o Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul - o CELAFISCS - que desenvolve um Projeto Longitudinal, de estudo e intervenção , sobre Envelhecimento e Aptidão Física de São Caetano do Sul - o "Projeto Felizidade". Constatando as transformações ocorridas quanto às funções do Estado, sabendo do problema enfrentado pela população idosa no Brasil e tomando conhecimento do projeto desenvolvido pelo CELAFISCS, surgiram-nos algumas questões: se direitos sociais elementares estão sendo transferidos para o Terceiro Setor, sob quais pressupostos teóricos estes se fundamentam? Existe algum comprometimento, desse projeto, com a superação das injustiças sociais que acometem a população idosa? Com qual conceito de saúde ele trabalha? Quais os resultados que ele têm obtido? Qual a visão de idoso subjacente ao projeto?
Os resultados inicialmente obtidos demonstraram que, das instituições e profissionais envolvidos, muitos se mostram orientados por uma visão ainda estreita de saúde, acatando o uso de estratégias exclusivamente individuais para o combate do sedentarismo, perdendo a oportunidade de usar seus conteúdos para conscientizar as pessoas sobre uma realidade sócio-econômica adversa e legitimando a despolitização do cotidiano. Dessa forma, a atividade física, ao tempo que canaliza a atenção da sociedade para a sua capacidade de delinear "corpos saudáveis", mascara outros determinantes do quadro social brasileiro, superestimando o papel da atividade física em relação à saúde, admitindo sua "capacidade de produtora" de saúde e disseminando a idéia que vincula a atividade física ao poder de remediar a doença.

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