O Desmantelamento da Seguridade Social e o Agravamento da Questão Social no Brasil
Ivanete Boschetti - Universidade de Brasília (Brasil)
ivanete@unb.br

A Constituição brasileira de 1988 institucionalizou a seguridade social como conjunto de políticas que deveria assegurar direito à saúde, previdência e assistência social. Antigos e novos direitos deveriam fundamentar-se nos princípios de universalidade, uniformidade, equivalência, seletividade, distributividade e irredutibilidade do valor dos benefícios. O financiamento deveria ser progressivo e diversificado (IPEA, 2002). A gestão deveria assentar-se em regras democráticas e descentralizadas. Decorridos 14 anos, a seguridade não foi implementada conforme preconizado. Estas políticas, que deveriam compor um todo articulado, são executadas seguindo normas e regras próprias e autônomas (Boschetti, 2003). Os benefícios são orientados por lógicas específicas e muitas vezes antagônicas, que opõem os direitos contributivos (previdência) aos direitos não contributivos (assistenciais) e não fortalecem a concepção de seguridade como proteção social. O financiamento é fragmentado e regressivo. A gestão mescla descentralização e centralização, e não consolida os canais de controle social previstos (Theodoro, 2002). A implementação desarticulada, autônoma e sob regras específicas das três políticas vem solapando a possibilidade de consolidação da seguridade social pública, que permanece apenas como referência constitucional. As três políticas que legalmente constituem a seguridade social brasileira estão sendo concretizadas de modo fragmentado e disperso, o que provoca um deslocamento do conceito de seguridade social instituído na Constituição. A não implementação da seguridade social como conjunto integrado possibilita e induz a desagregação das políticas que deveriam compor esse conjunto; por outro lado, a sua desintegração provoca uma mudança de rota, abalando e mesmo destruindo a possibilidade de consolidação da seguridade social como sistema de proteção social universal. A previdência social é apontada pelo governo como responsável pelo "déficit" previdenciário e pelas desigualdades dos direitos existentes entre os trabalhadores. Não se enfatiza que este "déficit" resulta, na verdade, da utilização dos recursos da seguridade social para pagamento de juros da dívida pública (Anfip, 2002; Braga, 2001). Estas tendências vêm impedindo a implementação da seguridade social e provocam uma reconfiguração das políticas sociais em três direções: estabelecimento de uma previdência (seguro social) pública mínima diferenciada para trabalhadores do setor privado e público que fortalece os planos e fundos de pensão privados; manutenção de um sistema público universal de saúde, com graves problemas de abrangência e qualidade dos serviços, que obrigam a população a recorrer a planos privados; e uma política de assistência social focalizada e restrita à população em extrema situação de pobreza, que não possui condições de trabalhar - idosos, crianças e portadores de deficiência. Este desenho pode garantir proteção social universal nos países onde predomina (ou predominou) a "sociedade salarial" (Castel, 1995) porque assegura cobertura a todos os trabalhadores integrados no sistema produtivo. Mas, no Brasil, este sistema exclui os 40,6 milhões de trabalhadores pobres que estão em condições de trabalhar, mas que estão desempregados e não contribuem para a seguridade social e que representam 57,7% da população economicamente ativa. Em cada 100 trabalhadores ativos no setor privado, aproximadamente 58 não contribuem e, portanto, não têm e não terão acesso aos benefícios previdenciários. Estes dados são expressões numéricas da dramática situação de exclusão do acesso aos direitos previdenciários e assistenciais. Em países onde não se instituiu a "sociedade salarial", como é o caso do Brasil, a forma de organização da seguridade social é injusta, provocadora e reprodutora de desigualdades sociais. O predomínio de uma estrutura econômica com relações informais de trabalho, baixos salários e reduzidos benefícios faz com que a seguridade social brasileira não responda às dramáticas situações de pobreza, desemprego e baixa renda que caracterizam a questão social resultante da própria dinâmica e funcionamento do capitalismo brasileiro.
(Des) Evolução das Políticas Sociais em Portugal: um olhar sobre o impacto nos grupos de excluídos
José Manuel Gameiro Rebelo dos Santos Escola Superior de Ciências Empresariais do Instituto Politécnico de Setúbal jrebelo@esce.ips.pt
O social está na ordem do dia. Nunca como nos dias de hoje as palavras inclusão, inserção, solidariedade e exclusão, foram tantas vezes ditas e escritas. São obrigatórias, a par com termos como "economia social", "responsabilidade social" e "terceiro sector" nos discursos de qualquer político. As pessoas individualmente e a sociedade civil, organizam-se e parece estar-se a caminhar para uma sociedade mais justa e mais solidária. Numa primeira análise somos levados a pensar que no futuro tudo será melhor a estes níveis. No entanto nem sempre o que parece é. Nos últimos anos tem-se assistido em Portugal, a uma inflexão nas políticas sociais que afecta toda a sociedade. No entanto, são os grupos mais vulneráveis como os idosos, os imigrantes e os desempregados aqueles que mais sentem os efeitos nefastos desta situação. Efectivamente, um olhar atento sobre o que tem sido feito neste domínio, permite verificar um significativo retrocesso, com implicações na já parca qualidade de vida de um número crescente de indivíduos que vem engrossando a fileira dos excluídos socialmente.Os anos noventa constituíram um período áureo, com os investimentos nas áreas educativas, de saúde e de apoio social a permitir mais qualidade de vida e maior dignificação do Ser Humano. Em contraponto e já no século XXI, o governo tem vindo a preparar, em nome do equilíbrio orçamental e do controlo do déficit, um conjunto de medidas que de forma gradual vai implementando e que se repercutem na generalidade na vida dos cidadãos. No entanto há a salientar que embora com menos expressão, têm sido definidas e implementadas determinadas políticas que minimizam alguns dos efeitos referidos. Não pretendemos pôr em causa a premência das medidas tomadas e que decorre de menos comparticipações europeias nos investimentos nacionais e do gradual envelhecimento da população, tornando-se o índice de dependência de idosos, cada vez mais preocupante. É inequívoco que o tempo das pré-reformas já passou, que a idade da reforma por velhice tem de ser prolongada e que se tem é de equacionar novas formas capazes de assegurar a todos os cidadãos um envelhecimento activo, sob pena de num curto espaço de tempo, a situação se tornar insustentável em termos financeiros e o sistema entrar em ruptura. Também não é nosso propósito encontrar soluções alternativas. Pretende-se apenas identificar e analisar as medidas tomadas, procurando quantificar os seus efeitos no presente e no futuro. Assim, num primeiro ponto, no âmbito duma contextualização histórica, identifica-se a evolução das políticas sociais dos anos oitenta aos nossos dias. Num segundo ponto, analisam-se as medidas já implementadas e a implementar nas áreas da saúde, protecção social, emprego, imigração e envelhecimento da população. Em seguida, com o objectivo de perceber as repercussões destas medidas no curto e médio prazo, procedemos a uma análise da evolução demográfica, procurando verificar o crescimento da população idosa, do número de desempregados e dos imigrantes. Num último ponto, propomo-nos avaliar em termos quantitativos e também qualitativos as verdadeiras repercussões destas medidas.



Políticas sociais: "solidariedades planeadas"
Maria da Saudade Baltazar
Univ. de Évora (Dep. de Sociologia)
saudadebaltazar@sapo.pt

No momento actual a organização social não consegue satisfazer as necessidades básicas de todos os indivíduos e consequentemente a estes não lhes é permitida uma vida digna. Situação que se fica a dever à produção insuficiente de bens e serviços para dar resposta a tais necessidades e/ou nem todos dispõem de recursos que permitam a obtenção desses bens e serviços. Do modelo de desenvolvimento adoptado, desejavelmente sustentado, emergem causas de natureza estrutural e que por seu turno dão origem a uma multiplicidade de problemas sociais.
Situações de insuficiência/carência que afectam um número significativo de indivíduos e cuja resposta organizada (quer seja ao nível internacional, nacional, regional ou local) é proporcionada mediante as denominadas políticas sociais, que apresentam como principal finalidade prevenir, atenuar ou resolver esses problemas sociais que se traduzem em situações de exclusão social e pobreza. Respostas que se pretendem continuadas por parte do poder político e supletivamente da sociedade civil.
Alguns atributos da sociedade contemporânea, nomeadamente o envelhecimento demográfico associado a crescentes taxas de desemprego assim como as consequências negativas do avanço das novas tecnologias, surgem como factos preocupantes e que por sua vez justificam desde logo a intervenção ao nível das políticas sociais.
Esta tem sido uma preocupação constante no seio da União Europeia, pese embora a Europa Social se encontrar manifestamente mais atrasada do que a Europa Económica. Perante o slogan "A Europa deve ser a Europa dos cidadãos", um dos desafios actuais da União Europeia consiste na criação de um sistema de protecção social que permita a melhoria da qualidade de vida e contrarie a exclusão social.
O que pressupõe a actuação conjunta dos vários Estados Membros, assim como dos diversos parceiros sociais, no respeito constante ao princípio da subsidiariedade.
Obedecendo aos imperativos do Mercado Único, a política social europeia pretende corrigir os desequilíbrios económicos e sociais existentes ao garantir direitos mínimos e condições de protecção com vista ao atenuar das grandes disparidades entre Estados Membros. Cujos objectivos prioritários recaem na melhoria das condições de vida/trabalho, na formação de emprego, no desenvolvimento de recursos humanos com vista a alcançar um elevado nível de emprego, no diálogo social entre parceiros, na promoção de uma protecção social adequada e por consequência resolver o problema da exclusão social.
Deste modo a política social europeia, ao pretender criar uma sociedade mais justa e dinâmica, estimula a parceria entre Política Social, Política Económica e Política de Emprego e apela à conjugação dos contributos da União Europeia, dos governos nacionais, parceiros sociais e de quaisquer outros intervenientes. Cooperação entre entidades que se revela de premente importância, pois só desta forma é possível atenuar/solucionar problemas relativos a uma convergência económica difícil, funcionamento deficitário do mercado interno e marginalização de grupos sociais mais vulneráveis.
Apela à formação de redes de parcerias entre diversos grupos, em substituição do uso exclusivo da via legislativa na resolução dos problemas sociais, e à promoção de uma sociedade activa em vez de manter uma sociedade passiva ao responsabilizar os cidadãos dos seus direitos mas também dos seus deveres.
No caso português, não obstante a existência da Providência social desde 1935, a dimensão de política social só adquire significado nos anos 70. Mas Portugal, do conjunto dos Estados Membros da União Europeia, tem provavelmente uma das economias mais vulneráveis.
Logo o desenvolvimento actual de Portugal encontra-se necessariamente vinculado ao QCA III (2000-2006). E é deste instrumento que emergem políticas sociais em vigor no nosso país, tais como o Programa Operacional Emprego, Formação e Desenvolvimento Social (POEFDS) intervindo sobre o emprego e a formação com vista à competitividade económica e coesão social.
De destacar também o Plano Nacional de Emprego (PNE) ao assentar no pilar da empregabilidade, o Programa Integrado de Apoio à Inovação e o Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI) que procura contribuir para a promoção da inclusão assim como a igualdade de oportunidades de participação social numa sociedade com melhor qualidade e maior coesão.
Porque se entende que os problemas sociais, nomeadamente a pobreza e a exclusão social são formas complexas e multidimensionais, as políticas sociais devem ter um carácter intersectorial e transversal com vista a uma multidisciplinariedade de acção. Logo o trabalho em rede constitui uma opção no âmbito das políticas sociais. Solidariedades que carecem de programação, daí os instrumentos de planeamento acima referidos.
Mas muitos são os desafios que se colocam às actuais políticas sociais, com que constrangimentos se debatem hoje e como se afigura o seu futuro?


Indicadores sociais e gastos publicos municipais em Santa Catarina: um estudo de correlação.
Gilmar Rodrigues e Erni Seibel - U.F. Santa Catarina

Pretende-se neste trabalho correlacionar a evolução dos indicadores sociais e os gastos públicos na década de noventa em Santa Catarina. Apesar do senso comum sobre uma correlação entre estas duas dimensões (indicadores sociais e gastos públicos) o que se busca mais especificamente é medir o grau desta correlação. Um grau maior ou menor de correlação nos permitirá observar o empoderamento dos governos locais na determinação e influencia dos indicadores sociais, gerais e específicos partir da gestão dos gastos públicos. Para tanto utilizaremos os índices e indicadores sintéticos organizados e disponibilizados pelo PNUD (1991 e 2000) e os dados do TCE/SC (1990-2000). Metodologicamente dividiremos os dados gerais (IS e Gastos): por município, por tamanho de município; por micro e meso-região; específicos: por índices temáticos (renda, educação, longevidade, habitação); por sua vez os gastos serão organizados por função de gasto ( conforme a lei. 4220) e por nível de gasto (infraestrutura, social e administrativa). A partir dos dados organizados procederemos os cálculos e análise das correlação (gerais e especificas) entre os dois bancos de dados. Os períodos analisados serão 1991-2000 (para os indicadores sociais e gastos públicos). A expectativa é de que, a partir deste trabalho possamos destacar as áreas temáticas mais sensíveis à variação dos gastos públicos.


Políticas públicas, desigualdades sociais e contradições
No vale do rio jari, amazônia brasileira

Denise Machado Cardoso, UFPA, Brasil
Demacard@uol.com

A discussão que envolve o desenvolvimento em áreas com populações humanas empobrecidas, como é o caso da Amazônia, destaca-se no meio acadêmico há décadas. O desenvolvimento sustentável baseado em justiça social e equidade passou a ser o modelo mais defendido por cientistas, movimento sociais e pela mídia, mas a questão que se impõe nos dias atuais refere-se mais às políticas que de fato implementem ações nessa direção, pois embora o desenvolvimento sustentável tenha se tornado quase uma unanimidade em termos conceituais, pouco tem sido feito pelos governos para erradicar pobreza e devastação de áreas como as florestas do Trópico Úmido. No vale do rio Jari, por exemplo, assiste-se a um verdadeiro embate entre o poder público dos municípios e populações tradicionais que ali habitam. Ambos defendem políticas de melhorias de condições de vida para essas populações, mas o que se verifica são ausências dessas políticas ou, quando implementadas, a ineficácia marca as ações governamentais.

 

O desmantelamento do regime previdencial da Segurança Social em Portugal

Maria do Carmo Tavares (CGTP - Internsindical)

- Os vários regimes de Segurança Social e os objectivos de cada um

Universialidade do Sistema;
Razões do baixo nível das prestações;
O porquê das baixas carreiras contributivas.

- O principio da contributividade e os direitos:

O plafonamento nas contribuições, inversão da solidariedade;
Plafonamento opcional e o obrigatório para as pensões de velhice e invalidez e sobrevivência. O caminho para o desmantelamento da segurança social;

- A diferenciação "positiva" e o caminho para o assistencialismo;

A diferenciação positiva das prestações por "grupos" dentro do sistema previdencial e as contradições deste processo;
Destruição da universialidade.

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