A reinvenção do movimento sindical: a ênfase prepositiva
Gardénia Campos (Universidade Federal do Rio Grande do Norte)

Na década de 70, em plena ditadura militar, a sociedade brasileira depara-se com a entrada em cena de forma expressiva, de uma nova geração de sindicalistas que rompeu com o padrão de ação sindical submetido ao controle do Estado. Esse novo grupo de sindicalistas inaugurou o que posteriormente convencionou-se chamar de "novo sindicalismo". O "novo sindicalismo" ganhou visibilidade ao projetar lideranças (a maior delas hoje, presidente do Brasil) e ao implementar ações de massas e grandes greves. Além disso, o "novo sindicalismo" trouxe para a esfera pública - impactando a luta de resistência ao regime - demandas trabalhistas que se gestavam no interior das fábricas, mas também demandas que extrapolavam o ambiente de trabalho e que estavam circunscritas em questões mais gerais intrinsecamente relacionadas com a redemocratização brasileira e com a luta pela cidadania. Essa nova configuração do movimento sindical desembocou em 1983 na criação da Central Única dos Trabalhadores - CUT. Inicialmente marcada por uma visão de conflito e ruptura com o Estado e com o patronato, a CUT foi se projetando externamente como uma organização movimentalista com um forte viés da política de dizer "não". Após 20 anos de sua fundação, a CUT convive hoje com mudanças profundas na sociedade brasileira. Tais mudanças, frutos da redemocratização política, da revisão do papel do Estado e do reordenamento no mundo do trabalho, dentre outras, incidiram diretamente na ação sindical fazendo emergir deslocamentos que indicam uma ressignificação nas ações desenvolvidas pela CUT. Este novo cenário tem tensionado o movimento sindical a redefinir o seu padrão de intervenção, levando-o a repensar as suas estratégias de ação, particularmente substituindo o confronto, por uma ação mais propositiva na gestão dos interesses das diversas categorias por ele representadas e também por aquelas fora do seu alcance de representação: os desempregados e os trabalhadores da economia informal. Nesse sentido, a CUT sinaliza para a adoção de um discurso e uma prática mais afirmativos, que contenham proposições mais substanciais, levando-a a metamoforsear-se de uma ação conflituosa a uma ação mais propositiva. Nessa redefinição do movimento sindical ganha destaque a intervenção da CUT em economia solidária a partir do ano de 1999, quando é fundada a Agência de Desenvolvimento Solidário da CUT - ADS. Ocorre que para a CUT, a geração de emprego e renda não poderá simplesmente reproduzir as práticas do mercado capitalista, importa para a Central, além de promover renda e trabalho, também conferir às experiências de economia solidária por ela protagonizadas, um caráter diferenciado nas relações de trabalho e de produção, baseados na solidariedade, na gestão compartilhada e na repartição justa do excedente. No entanto, essas experiências não têm se dado de forma tranqüila, tanto pelas questões internas da própria Central, quanto pelo contexto das experiências de economia solidária, que revela duas situações. A primeira se refere à adoção de critérios de competitividade e gestão compatíveis com a lógica do mercado, desvirtuando-as assim, dos princípios da economia solidária. Esta degeneração da prática econômica solidária decorre, em grande parte, da insuficiente formação democrática dos sócios, que em grande medida se inserem na economia solidária enquanto uma forma de se recolocar na produção social e escaparem da pobreza. A segunda situação reside na constatação de que algumas experiências têm de fato logrado êxito. Isso se deve, sobretudo, quando o objetivo máximo dos sócios da empresa solidária é promover a economia solidária tanto para dar trabalho e renda a quem precisa como para difundir um modo democrático e igualitário de organizar atividades econômicas. Este contexto, nos incita uma questão: em que pólo se situa as experiências da CUT em economia solidária?

 

Trabalho e sindicalismo no contexto da globalização
José Maria Carvalho Ferreira ( SOCIUS, ISEG - Universidade Técnica de Lisboa)

A crescente integração dá ciência e da técnica nos parâmetros da racionalidade instrumental do capitalismo e da globalização tem-se traduzido em mudanças profundas no mundo do trabalho e do sindicalismo.
Essas mudanças são bastante visíveis nas conexões entre as tecnologias de informação e da comunicação e a divisão do trabalho, como em relação à autoridade hierárquica, ao processo de tomada de decisão e ao processo de liderança nas organizações. Por outro lado, importa sobremaneira analisar outros aspectos que se reportam às mudanças de carácter cognitivo, emocional e comportamental no âmbito da acção individual e colectiva no contexto da organização do trabalho.
De uma prévia análise que acabamos de referir poderemos extrair os ensinamentos explicativos que estão na origem da conflitualidade e, necessariamente, da acção colectiva que enforma o sindicalismo nas sociedades contemporâneas. As mudanças, nestes domínios, também não escapam aos dilemas e contingências da globalização.
Finalmente, como base conclusiva, deste trabalho, tentarei explicitar as hipóteses ou tendências mais verosímeis que se apresentam ao mundo do trabalho e do sindicalismo no contexto da globalização.

 

Trabalho, inovação e sindicatos
Fernando Coutinho Cotanda - Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Brasil
cotanda@portoweb.com.br

O presente trabalho, a ser submetido à apreciação deste Congresso, é resultado de minha tese de doutorado.
O estudo problematiza a relação entre sindicalismo e processo de trabalho em um contexto de inovações tecno-organizacionais, focalizando diferentes níveis e dimensões das atuações da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e das entidades a ela filiadas que estiveram orientadas para exercer influência sobre os processos de inovação.
Para os sindicatos, coloca-se a disjuntiva de atuar sobre o processo de trabalho influenciando-o, ou deixar que a bandeira da mudança no trabalho siga sendo levantada e implementada unilateralmente pelas empresas. A tendência à microcentralidade do sistema de relações de trabalho e o surgimento de novas institucionalidades por onde passam o conflito e o consenso no plano das empresas apontadas na literatura terão poucas chances de ser contra-arrestadas, se a postura sindical frente às inovações for predominantemente passiva ou reativa.
Afirmamos, em primeiro lugar, a existência de uma implicação recíproca entre os processos inovativos que modelam o processo de trabalho e a dinâmica do conflito e do consenso entre capital e trabalho e, em segundo lugar, que a ação sindical pró-ativa sobre os assuntos da produção faz-se necessária para opor obstáculos à unilateralidade pela qual são conduzidas as inovações e às conseqüências negativas que podem advir desse processo para as relações de trabalho. Partindo desses pressupostos é que propomos problematizar a relação do sindicalismo "cutista" com os processos de inovação tecnológica e organizacional em curso no Brasil, nos anos 80 e 90.
O principal argumento que pretendemos demonstrar neste estudo é o de que a CUT e as entidades a ela filiadas, apesar de afirmarem majoritária e formalmente a pertinência e o objetivo de influir sobre os processos de inovação e de procurar fazê-lo em diferentes níveis e dimensões, no âmbito micro, meso e macroregulatório, obtiveram limitado êxito nesse sentido. Na produção desse resultado, estiveram implicados fatores sobre os quais a governabilidade do sindicalismo "cutista" é reduzida, tais como: o sistema de relações de trabalho, as decisões políticas de cunho macroeconômico, as estratégias empresariais refratárias à negociação dos processos de inovação, a assimetria de poder entre capital e trabalho, dentre outros. Entretanto, conforme iremos enfatizar e demonstrar, o reduzido êxito do sindicalismo "cutista" em influir sobre as inovações esteve associado também às suas próprias limitações: as estruturas internas dos sindicatos pouco adaptadas e capacitadas a formular e a interagir com as mudanças tecno-organizacionais, o afastamento dos sindicatos dos locais de trabalho, os limitados vínculos sociais, dentre outros constrangimentos que, a rigor, estão mais próximos da sua governabilidade. Demonstraremos, também, que a edificação de posturas sindicais pró-ativas relativamente aos assuntos da produção são, no entanto, exeqüíveis, conforme revelam algumas experiências sindicais.

Actores socioeconómicos en la frontera: La dificultad de una articulacion supranacional.
Miguel Centella Moyano , Mar Chaves Carrillo, Ramón Fernández Díaz, José Antonio López Rey (GIESyT, Universidad de Extremadura)

La articulación de entidades organizacionales de carácter transfronterizo es una necesidad que se pone de manifiesto en la puesta en marcha de proyectos conjuntos generados en el marco de la Unión Europea. La desaparición de la frontera y la libre circulación de trabajadores entre Portugal y Espanha obliga a una mayor cooperación, cuando no a una clara convergencia, entre las organizaciones que defienden los intereses de los trabajadores.
En esta comunicación se presenta una entidad supraorganizacional que nace en el marco de la cooperación transfronteriza entre Espanha y Portugal en la región de Alentejo y Extremadura. Se analiza el Consejo Sindical Interregional conformado por dos sindicatos portugueses (UGT y CGTP) y sus socios españoles (UGT y CCOO).
El CSI es una entidad de tipo supraorganizacional participada paritariamente por las organizaciones mencionadas y con un ámbito discrecional delimitado claramente. Sin embargo existen diferentes aspectos que retrasan o incluso llegan a dificultar esta articulación.
Existen, en primer lugar, dificultades de tipo estructural. La estructura en ambos países es netamente diferente, con una gran descentralización en el caso español frente a una mayor centralización en el portugués que genera estructuras sindicales con competencias en el nivel regional (UGT y CCOO de Extremadura) frente a organizaciones más fuertes en el nivel estatal aunque menos en el local (UGT y CGTP). Esta situación genera una serie de consecuencias de distinto calado y ámbito, desde diferentes estilos de negociación colectiva hasta una diversa implantación territorial.
Las características de los trabajadores que cruzan la frontera también son diferentes. El trabajador medio español que desarrolla su actividad en Portugal posee una relativa cualificación y presta sus servicios en actividades de manera normalizada (personal sanitario, operarios cualificados en la presa de Alqueva, etc.) mientras que gran parte de los trabajadores portugueses carecen de dicha cualificación y desarrollan sus empleos en la economía sumergida (trabajo doméstico en Badajoz o estacional agrícola). Esto significa que la labor sindical resulta mucho más difícil (por falta de colaboración de los propios trabajadores) allí donde resulta más necesaria.
Otro aspecto a tener en cuenta es el uso de diferentes categorías ocupacionales y formativas en ambos mercados de trabajo, lo que dificulta la homogeneización y comparación entre trabajadores y cualificaciones.
En esta comunicación se desarrollan más ampliamente estas cuestiones y se presentan otras.

Sindicalismo, trabalho e educação: um panorama e uma comparação entre as posições de sindicatos docente do Brasil e Portugal
Ivonaldo Leite (Universidade Estadual do Rio Grande do Norte)

Nos últimos tempos, a importância que se tem atribuído à relação educação e trabalho tem sido de tal magnitude que em torno dela convergem não só focagens académicas específicas (por exemplo, de historiadores, sociólogos e economistas) como também as atenções dos mais variados intervenientes sociais, podendo mencionar-se, entre eles, políticos e empresários. Esta "convergência de abordagens" é impulsionada por um mapa discursivo onde, dentre outras, a noção de produtividade desempenha um papel central. Refere-se a formulação de uma educação para o trabalho como o factor que, atendendo às demandas do mercado, é indutor do desenvolvimento, livrando assim os países dos seus supostos "atrasos estruturais". Este é o âmbito geral que a presente Comunicação tem em perspectiva, resultando ela de uma Tese de Doutoramento apresentada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto. Isto é, tendo em conta as políticas educativas pensadas em função do aludido cenário, no Brasil e em Portugal, realiza-se um movimento analítico procurando conhecer os discursos de sindicatos docentes em relação às mesmas nos dois países, ao longo dos anos 1990, desenvolvendo-se em seguida um panorama comparativo entre os discursos. No referente ao Brasil, define-se como entidade a ser focada a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE); quanto a Portugal, é delimitada a Federação Nacional dos Professores (FENPROF). Metodologicamente, a investigação utiliza dois recursos: Entrevistas, realizadas com membros das Direcções das duas entidades; e análise documental, relativa aos documentos produzidos por ambas durante o período em consideração. A abordagem empreendida revela, por exemplo, que os discursos da CNTE e da FENPROF perante a relação educação e trabalho têm três dimensões. No caso da CNTE, as dimensões são (1) uma apreciação da globalização, das novas tecnologias e das transformações no mundo do trabalho; 2) uma avaliação crítica das políticas educativas desenvolvidas; 3) e a apresentação de proposições próprias no quadro da mencionada relação. No caso da FENPROF, elas são (1) a compreensão de que o ensino profissional é caminho para Portugal superar o seu "atraso estrutural"; 2) um questionamento passivo às iniciativas governamentais; 3) e a apresentação das suas proposições para o referido contexto. A partir disso, constata-se que há convergências e divergências entre os discursos da CNTE e da FENPROF. Procura-se entender estes resultados fazendo-se referência a um quadro sócio-histórico, donde se põe em realce as características que marcam as formações sociais brasileira e portuguesa, pois, ao fim e ao cabo, existe uma espécie de condicionamento, oriundo das conjunturas em que os sindicatos actuam, que exerce influência na forma como os mesmos formatam as suas posições. As suas acções, portanto, são acções em função de conjunturas determinadas, o que significa dizer que os seus protestos, as suas demandas e as suas proposições só podem ser compreendidas por alusão ao contexto em que eles agem e interagem. Assim, a Comunicação adopta um estilo de análise que, por apanhar os fenómenos que foca em estruturas concretamente situadas, valoriza a construção de conceitos e procedimentos para tratar dos problemas que a prática social coloca como desafio.

Políticas sindicais internacionais de língua portuguesa: a CGTP e a CUT
Hermes Augusto Costa (CES/FEUC)
Hermes@fe.uc.pt

Do ponto de vista sindical, a "Questão Social" no novo milénio constitui o produto de múltiplas e persistentes lutas nacionais e locais pelo direito ao trabalho, à organização, à autonomia e liberdade sindicais e, enfim, às mais elementares formas de dignidade humana que daquelas decorrem. Mas ao mesmo tempo que está presente nos mais distintos quadrantes nacionais/locais, a Questão Social é uma questão eminentemente global, tanto mais que a ela subjazem desigualdades sociais globais (como a desigualdade Norte/Sul, por exemplo). Tais desigualdades globais são, pois, o pretexto para a activação de lutas sindicais transnacionais partilhadas não só entre o movimento sindical, como entre este e muitas outras organizações sociais que compõem a "sociedade civil global".
Partindo do reconhecimento desta múltipla legitimidade das lutas (local, nacional, transnacional), pretendo abordar a atenção e espaço que as duas maiores organizações sindicais de Portugal e do Brasil (respectivamente a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses, CGTP, e Central Única dos Trabalhadores, CUT) vêm conferindo a uma política de relações internacionais. Partindo do trabalho de campo que realizei nos últimos anos junto das duas centrais sindicais, reportar-me-ei aos obstáculos com que essa política internacional se confronta, às fases que a estruturam e aos temas que a preenchem, procurando realçar algumas semelhanças e a diferenças entre a CGTP e a CUT a esse respeito.

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