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Nº 46
Outubro de 1996
Ciência, conhecimento e sociedade
ISSN 0254-1106 e ISSN eletrónico 2182-7435
  Ciência, Conhecimento e Sociedade - João Arriscado Nunes
 
 
João Arriscado Nunes
  Escala, heterogeneidade e representação: para uma cartografia da investigação sobre o cancro  (pp. 9-46)
 O cancro é considerado por diferentes actores, mundos sociais e instituições como um dos grandes problemas do fim-de-século, assumindo as características de um típico "objecto de fronteira", reapropriável e redefinível de diferentes modos em diferentes contextos. Desde os finais da década de 1970, contudo, tem vindo a impor-se uma definição dominante, frequentemente associada a um projecto reducionista que procura redescrever o cancro como uma doença genética e recentrar as prioridades da investigação nessa perspectiva. Os investigadores em oncobiologia, porém, continuam a ter de lidar com o problema de, estando a maioria dos cancros conhecidos ligados à exposição a factores ambientais, explicar a relação destes com os factores genéticos. A partir de uma pesquisa em curso sobre a investigação em oncobiologia, procura-se identificar o modo como o recurso a imagens espaciais centradas na escala permite articular os diferentes processos envolvidos no surgimento, desenvolvimento e supressão dos cancros, e a sua relação com a emergência de um paradigma contextual na oncobiologia.
 
Maria Eduarda Gonçalves
  Mitos e realidades da política de ciência em Portugal  (pp. 47-67)
 O presente artigo procura analisar e interpretar aspectos da evolução da política pública de ciência em Portugal desde que ela foi lançada, nos finais de 60. À luz das tendências recentes da análise de políticas (policy analysis), parte-se da noção de política pública como processo dinâmico sujeito à influência de uma pluralidade de factores contextuais, constrangimentos institucionais, interesses e culturas políticas dos actores envolvidos. Este conjunto de factores afigura-se particularmente distintivo e explicativo em países marcados por fortes idiosincrasias sócio-culturais e institucionais, enraízadas por vezes na história política e económica, como parece ser o caso de Portugal. No discurso político e legal, a importância da ciência, bem como o papel do Estado na promoção do seu desenvolvimento, têm sido frequentemente reconhecidos. No entanto, a política de ciência permanece de facto, hoje ainda, como uma área relativamente secundária no leque das políticas públicas, verificando-se, assim, uma aparente contradição entre o discurso e a prática política e social.
 
Susan Leigh Star
  O Poder, a Tecnologia e a Fenomenologia das Convenções. Ou: de ser alérgica às cebolas  (pp. 69-107)
 O presente artigo investiga o modelo de heterogeneidade proposto pela abordagem dos actores-redes de Latour e Callon, sobretudo quando entendido como modelo empresarial ou de gestão de redes de actores. Exploram-se modelos alternativos de heterogeneidade e de plurivocidade, incluindo a divisão do eu perante situações de violência e casos de múltipla pertença/marginalidade, como, por exemplo, os que são vividos pelas mulheres de cor. As explicações alternativas aqui avançadas inspiram-se em trabalho teórico na área do feminismo e no interaccionismo simbólico. Elabora-se ainda uma teoria da múltipla pertença, que procede ao estudo da interacção entre as tecnologias estandardizantes e os seres humanos enquanto membros de mundos sociais múltiplos e enquanto cyborgs — isto é, enquanto humanos-com-máquinas.
 
Jean Lave
  A Selvajaria da Mente Domesticada  (pp. 109-134)
 Os estudos sociológicos e antropológicos da ciência têm tomado como seu objecto a ciência como prática quotidiana. Enquanto modo hegemónico de conhecimento, a ciência constrói o quotidiano em termos que reforçam esse seu papel hegemónico. Daí que seja necessário analisar o modo como o discurso científico constrói o quotidiano e a constituição mútua de um e de outro, através do contraste que entre si estabelecem. Nesta perspectiva, são contrastados os discursos científicos sobre a mente, a cognição, a resolução de problemas ou a matemática e os usos situados e contextuais do cálculo como parte de práticas "quotidianas"
 
Francisco Louçã
  A Flecha e o Alvo do Tempo — Paradoxos Económicos  (pp. 135-155)
 O artigo apresenta várias concepções do tempo (cíclico e unilinear, natural e objectivo ou subjectivo) e o seu impacto na construção do cânone da teoria económica: o modelo do equilíbrio geral de Walras e o confirmacionismo econométrico que o sustentou e operacionalizou. As dificuldades, contradições e paradoxos desses conceitos do tempo são examinadas, em particular do ponto de vista das condições de Laplace para a inferência indutiva e para o trabalho estatístico que a economia tem desenvolvido através de processos cada vez mais sofisticados mas de discutível justificação epistemológica. Conclui-se que a análise realista do papel construtivo do tempo — a flecha do tempo — só pode ser desenvolvida com o estudo da irreversibilidade dos processos sociais complexos, o que supõe simultaneamente uma formalização a partir dos instrumentos da dinâmica não-linear e o recurso complementar a uma heurística histórica.
 
Fátima M. Antunes
  Politicas Educativas e Discursos sobre Educação nos Anos 80 e 90: o debate acerca do ensino profissional na escola pública  (pp. 157-176)
 Através da análise do debate acerca do ensino profissional na escola pública, explora-se a questão de saber que definições de educação disputaram a possibilidade de influenciar a elaboração e formulação das políticas educativas ao longo dos anos 80/90. São identificados três discursos principais sobre educação — "a diversificação da educação"; "a escola democrática"; "a democratização da educação" — que propõem medidas de política educativa para Portugal com base em distintas concepções acerca da educação. Defende-se que estas concepções se apresentam polarizadas em torno de temáticas que constituiram eixos estruturadores daquele debate: (i) projectos de desenvolvimento para o país; (ii) a relação educação e trabalho/emprego; (iii) a igualdade de oportunidades em educação.
 
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