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Roque, Ana Cristina (2000) (PT)

 

 

O Ñanga era um feiticeiro, sacerdote, terapeuta, curandeiro, oráculo, “exorcista”, intermediário entre o “sobrenatural e o humano”, “elemento aglutinador da comunidade, duplamente pólo do sagrado e do profano”. “A Missão Antropológica de Moçambique (MAM) foi criada em 1936.” “[…] Parece evidente que se pretendia mostrar todo um […] trabalho que, ainda que submetido aos objetivos específicos da Missão Antropológica, tornava possível apresentar e dar a conhecer as outras gentes do Império e os seus usos, costumes e tradições.” “Em nome da ciência e do progresso foi esquecida toda uma tradição de medicina popular, também ela bem enraizada no espaço colonial português, onde o uso de ervas, raízes e mezinhas prevalecia, em muitas regiões, como único meio para curar maleitas e moléstias de muitos portugueses, para purificar os ‘maus ares’ e afastar más sortes e maus olhados.” “De todo este conjunto, o material do Ñanga da Matola é, seguramente, um dos mais interessantes. Integra remédios, receituários e instrumentos que foram descritos, desenhados e fotografados e se fazem ainda acompanhar do registo escrito de uma longa entrevista que, durante três dias, manteve com ele o chefe da equipa da Missão.” “Estar de boa saúde significa realizar em si mesmo o equilíbrio vital; estar em paz com os ‘deuses’, com os antepassados, com os vizinhos e com o seu próprio corpo… Se este equilíbrio vital se quebra, quer por falta de forças mais fortes do que as do indivíduo quer por falta de cumprimento dos seus deveres para com os antepassados ou com o próximo, o indivíduo cai doente e deve fazer tudo para se restabelecer.” “A intervenção do Ñanga surge pois como indispensável ao restabelecimento do equilíbrio do indivíduo e, por inerência, da comunidade de que ele faz parte e sem a qual, isolado, não poderá subsistir.”