A memória social refere-se aos processos através dos quais o conhecimento e a consciência do passado são gerados e mantidos em sociedade. Acontecimentos importantes – revoluções, vitórias, crises – surgem como defi nidores da identidade coletiva e eventos essenciais para a aprendizagem. Como disciplina que procura expandir o conhecimento do passado, a História contribui para a memória social. Neste sentido, a memória pode ser intencionalmente (re)construída e representada ou não-intencional e implícita.
Hoje, apesar do avanço da globalização, o Estado ainda é um dos principais agentes da memória. A Reconquista, o terramoto de 1755, o 25 de Abril ou a atual crise económica são momentos cruciais na vida da sociedade portuguesa. Através dos seus rituais e manuais, o Estado português reproduz a versão oficial destes eventos, a fim de afirmar a continuidade e a unidade da comunidade política e moldar as relações sociais, as instituições, a arte e as atitudes políticas.
No entanto, a versão oficial da História nunca é a única, sendo próprios da política democrática os conflitos sobre o significado do passado: há, naturalmente, uma inevitável dimensão interpretativa na memória social. No entanto, para que as comunidades possam aprender com as vitórias passadas – e especialmente com os erros do passado –, os debates democráticos têm de filtrar as visões flagrantemente distorcidas do passado, que servem interesses de poder no presente. O que os atores políticos omitem é tão importante como o que eles relembram aos cidadãos. Uma vez que a memória é maleável à interpretação e à manipulação política, a crítica social deve prestar especial atenção à forma como aquela é invocada nas atuais tomadas de decisão. Isto é especialmente importante em tempos de privação, em que é muito frágil a memória das crises passadas e de como foram ultrapassadas pela comunidade. Para que a aprendizagem social seja possível, a memória das crises não pode sucumbir a uma crise da memória.
Mihaela Mihai