O conceito de humanitarismo tem as suas raízes associadas à criação do Comité Internacional da Cruz Vermelha, em 1863, que gerou as condições para que uma organização não política pudesse prestar auxílio humanitário a populações em risco. É normalmente aplicado em dois contextos: guerra e catástrofes naturais. Em qualquer um destes contextos está subjacente a ideia de que, em casos extremos de sofrimento humano, é possível e desejável que atores internos ou externos prestem auxílio a quem mais precisa.
Na sua conceção clássica, o humanitarismo é pautado pelos princípios de humanidade, imparcialidade, neutralidade e independência. O final da Guerra Fria ditou mudanças na visão clássica do humanitarismo resultantes de uma ordem mundial caracterizada por alterações geopolíticas e pela erosão progressiva da distinção entre combatentes e civis, confrontando a comunidade internacional com novos cenários de crise e novos desafios. O número crescente de missões humanitárias, a par de um certo abuso do “rótulo” humanitário, criou alguma confusão relativamente ao verdadeiro caráter e propósito do humanitarismo, tornando-o um conceito mais complexo e fragmentado.
A era pós-1990 ficou igualmente marcada pela afirmação de uma conceção de humanitarismo (“novo humanitarismo”) assumidamente mais política, adotada por governos, agências internacionais e muitas organizações não-governamentais, desafiando o paradigma clássico e considerando que, em contextos de crise humana estrutural, os objetivos tradicionais de salvar vidas e aliviar o sofrimento humano eram meramente paliativos. No contexto atual, e em particular após o 11 de setembro de 2011, o conceito e prática do humanitarismo confrontam-se com importantes questionamentos éticos resultantes de lógicas de politização e instrumentalização dos princípios humanitários por parte de atores políticos, que têm vindo a distorcer a essência do humanitarismo.
Daniela Nascimento