A economia solidária vem ganhando visibilidade e tem vindo a disseminar-se no contexto português, sobretudo no que se refere às práticas nas comunidades. Tem-se por um lado a expansão do conceito de economia solidária (ES) que passa a ocupar lugar privilegiado em grupos de estudos, em cursos de pós-graduação e como objeto de investigação em dissertações e teses, e em disciplinas académicas específicas sobre o tema; por outro a sua dimensão prática presente nas diferentes formas de organização autogestionária de grupos nos territórios locais ou nas ações geridas por entidades ligadas ao setor da economia social.

Ao longo da história, as associações e as cooperativas surgidas no século XIX marcam os novos contornos da economia e da política no mundo, e é neste seio que a ES ganha a sua sustentação no tempo presente. Sua raiz histórica também vincula-se aos movimentos populares na américa latina e aos movimentos eclesiais da igreja católica (França, 2007).

A ES pode ser definida a partir de diferentes correntes e abordagens conceptuais. Num registo de base francófona, Laville define economia solidária como o “conjunto de atividades que contribuem para a democratização da economia, a partir de influências de cidadania”. Já com base nas experiências latino americanas, França (2007) utiliza a ideia de economia plural para definir a economia solidária como uma “outra” economia que combina diferentes lógicas económicas na tentativa de “ajustar as disfunções do sistema económico e ocupar-se dos pobres e excluídos”.

Ainda sobre a sua dimensão conceitual, a economia solidária oferece um conjunto de possibilidades de reflexão sobre a relação entre a economia e a sociedade. Laville (2009) distingue a economia solidária em duas dimensões: a) uma dimensão (sócio) política, e b) e uma dimensão (sócio) económica. Esta dupla dimensão revindicada pela ES ultrapassa a lacuna deixada pela economia social, que ao centrar-se mais na relação mercado e Estado e no seu sucesso económico, deixou de lado a mediação política (Laville, 2009). E portanto, do ponto de vista (sócio) político, a ES revigora uma nova política evocando uma proposta emancipadora e democrática. Para tanto propõe uma forma de hibridização entre democracias participativa e representativa.

Do ponto de vista (sócio) económico a ES questiona os modelos económicos vigentes, e propõem um novo modo de se fazer economia assente na hibridez das economias, não monetária, não mercantil e mercantil; e entre reciprocidade, redistribuição e mercado (Laville, 2009). Ela parte do princípio da solidariedade como mecanismo transversal nos modelos de compra, venda, produção e troca de bens e serviços. Opõe-se às formas de exploração, e por isso adota o modelo de funcionamento autogestionário, fortalecendo a cooperação e formas coletivas. Numa temática mais vasta, o que se pretende é que a dimensão económica e social estejam diretamente interligadas face a urgente necessidade de democracia económica no mundo.

No caso Português, a ES não têm o seu âmbito bem definido e não estão suficientemente estabilizadas (Namorado, 2009). Há tanto uma hibridez entre as semânticas que designam estas práticas solidárias, como uma mistura entre a variedade de expressões como terceiro setor, economia social, setor não lucrativo e, que acabam por serem utilizadas como definição de práticas de economia solidária. Isto significa que a economia solidária é composta por uma heterogeneidade de práticas, mas também de organizações, como por exemplo: cooperativas, instituições de solidariedade social, mutualidades, fundações, comunidades gestoras de baldios, dentre outras. E portanto, a ES reflete uma presença e uma proximidade com a economia social. E é nesta complexidade de racionalidades e semânticas que se situam as diferentes formas de ES no país.

Consoante às formas de economia solidária, podemos classificar em diferentes categorias, podendo manifestar-se em: redes e clubes de trocas ou mercados e feiras solidárias como é usualmente designado em Portugal; sistemas de comércio justo e finanças; comunidades e cadeias produtivas; serviços de proximidade; cooperativas de produção e comercialização, grupos de produção e compra.

Em Portugal, uma das formas de economia solidária com significativa expansão e presença nas comunidades são os mercados e feiras de trocas solidárias realizadas em diferentes regiões do país. O primeiro mercado solidário a “Mercearia na Granja do Ulmeiro” , foi implementado em 2006, e tinha como objetivo fortalecer a economia local, através de atividades de trocas de bens e serviços. Os mercados de trocas para as crianças, criados em Coimbra, atualmente estão presentes em 12 localidades e são outro exemplo de economia solidária baseada na troca. Muitos destes circuitos de trocas solidárias utilizam a “moeda social”, um mecanismo que intermedia as trocas entre os membros do grupo. Os espaços de troca revigoram as ações coletivas e novas formas de sociabilidade marcadas por relações de entreajuda e solidariedade.

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