Um estilo de música e de poesia originário da Jamaica e dos guetos das grandes cidades dos EUA, e hoje cultivado pela juventude excluída e inconformista dos bairros populares de todo o mundo. Consiste num texto e num ritmo de batida. O texto é mais importante do que a melodia e a harmonia, uma característica que o rap partilha com o canto gregoriano. O ritmo da batida permite variações. Há pausas para frases solitárias e de solidão, em que o rapper se interrompe a si próprio como se bebesse um copo de água mental. Tem uma duração variável e pode ser grande como se fosse uma jam session.
O rap é um grito de revolta contra a injustiça social, o racismo e a violência. Mas é também um grito de revolta contra os gritos de revolta que até agora não deram em nada. O rap cria o lugar onde estão as pessoas e os seus dramas íntimos; as lutas de resistência e as resistências na luta; a criatividade moderna entre a loucura, a violência e o fanatismo; a rutura com o ancien régime e todos os novos silêncios do universo a que chamamos deus e com quem julgamos falar na farmácia, no ponto de droga, na meditação, no jogging; a poesia, sempre à beira de não existir; a brutalidade sedutora da ordem e do progresso; e sobretudo tanta coisa que nem imaginamos que exista porque existe sob a forma de ausência e que, no pior (melhor) dos casos, nos cria mal-estar, provoca insónias e nos faz mudar de namorada ou namorado.
O rap é herdeiro da tradição de “cantautores” como Zeca Afonso, José Mário Branco, Fausto, Sérgio Godinho, Adriano Correia de Oliveira, Luís Cília e Manuel Freire, que usaram a força expressiva da arte para combater a repressão e a censura. O rap alarga o conceito de música de intervenção, exprimindo a revolta e a raiva da juventude urbana dos subúrbios das cidades.
É a juventude da geração à rasca, a geração que a retórica vazia dos discursos e a ausência de propostas atirou para as ruas e praças das cidades um pouco por todo o mundo em busca de formas de expressão alternativas.
Boaventura de Sousa Santos