Teses Defendidas

Desobedecendo o sistema - Matriz abissal e lutas indígenas em contextos latino-americanos

Maurício Hashizume

Data de Defesa
27 de Maio de 2020
Programa de Doutoramento
Pós-Colonialismos e Cidadania Global
Orientação
Boaventura de Sousa Santos e José Manuel Mendes
Resumo
Com o intuito de enfatizar as possíveis contribuições pela emancipação social de lutas indígenas contemporâneas em contextos latino-americanos, esta tese propõe um esforço de releitura da própria formação daquilo que existe de fato como sistema-mundo hegemônico e dominante e suas emaranhadas relações de poder. A partir de reflexões e escritos prévios acerca de uma variedade de movimentos sociais anti-sistêmicos (especialmente aqueles territorializados no continente) e de seus cotidianos de conflitos e de inter-relações atadas a vetores axiais Imperiais/Coloniais estabelecidos desde a Primeira Modernidade, formula-se aqui o conceito de matriz abissal. Como fonte de longa duração de combinações e justaposições de hierarquias capitalistas, coloniais e heteropatriarcais, a matriz abissal se apresenta tanto em termos teóricos (epistemológicos, por exemplo) e práticos (práxis) e tem sustentado imposições, desigualdades e injustiças em distintos espaços-tempos da Terra. Este conceito se ancora e se propaga a partir de um duplo movimento: da "produção ativa de não-existências", uma das chaves da linha abissal traçada criticamente por Boaventura de Sousa Santos (2005); e da ideia, oriunda do pensamento feminista negro, de matriz de dominação, de Patricia Hill Collins (2002). Com base nesse registro, vidas e sociedades coloniais se constituem como alvos de perpetrações de violência e apropriação "justas" em benefício (direto e indireto) do modo de vida imperial. Lutas indígenas com as quais se estabeleceu diálogo nas pesquisas qualitativas no Brasil (com o CIR, na Raposa Serra do Sol) e na Bolívia (com o CRSUCIR, em Raqaypampa) relevam os desafios, limites e oportunidades, para possíveis condições pós-abissais. Pelos marcos da teoria marxista da dependência, notou-se ainda que a superexploração da força de trabalho e dos corpos/territórios coloniais seguem dependendo de fatores extra-econômicos. De outra parte, desobediências político-epistêmicas e novas institucionalidades subalternas levadas a cabo por indígenas contestam o sistema-mundo capitalista/colonial/heteropatriarcal. Transbordam, assim, o campo progressista classista e suas reivindicações, organizações e legados, mostrando que as opressões presentes, recorrentes e acutilantes de raça e de gênero fazem parte de um mesmo arco de poderes. Na esteira das ciências sociais por demanda das/os/es próprias/os/es indígenas (nos casos específicos, relacionados aos campos da comunicação social e da formação política de jovens), ampliam-se, problematizam-se e refinam-se interpretações e abordagens frente à matriz abissal e suas formas de colonialismos. Ambas têm nas operações de coisificação, saque e mercantilização de vidas humanas e não-humanas seu modus operandi e sua regra principal; não sua exceção, seu excesso ou seu desvio.

PALAVRAS-CHAVE: Colonialismo, Capitalismo, Movimentos Indígenas, Brasil, Bolívia