Oficina
Verdades, Memórias e Reconciliação: a Experiência Brasileira
Alexandra Barahona de Brito
Cecília MacDowell Santos
26 de maio de 2011, 10h30
Sala de seminários (2º piso), CES-Coimbra
Resumo
O termo “justiça transicional” foi cunhado para referir os processos utilizados para lidar com um passado de opressão e violência. Apesar da sua crescente popularidade, o termo deixa muito a desejar por vários motivos. Em primeiro lugar, implica uma clara delimitação temporal da transição entre autoritarismo ou guerra civil e democracia. Estes limites são difíceis – ou mesmo impossíveis – de identificar. Os esforços dos cientistas políticos para determinar o momento em que a democracia se tornou “a única opção possível” dependem exclusivamente em medidas arbitrárias, representando incorrectamente os complexos processos de democratização. De certa forma, as democracias estão constantemente a sofrer transformações. Além disso, embora a democracia seja o resultado final pretendido com estas transformações, as suas perspectivas são mais remotas em alguns contextos do que em outros. Não é possível presumir um progresso linear para instituições democráticas devido à multiplicidade de variáveis contextuais que determinam as transformações políticas. E mais, em sociedades devastadas pela Guerra, a preocupação imediata das elites domésticas e dos seus aliados internacionais consiste em alcançar uma paz estável. A transição para um regime democrático é uma preocupação essencial, mas não tão importante como cessar o derramamento de sangue.
Apesar destas limitações, nas últimas décadas, tem sido desenvolvida uma área de investigação independente e especializada em “justiça transicional”, reunindo os esforços de cientistas políticos, historiadores, sociólogos, psicólogos, activistas políticos e filósofos. Todos estes académicos têm vindo a trabalhar no sentido de uma melhor compreensão das principais questões com as quais sociedades provenientes de situações de autoritarismo ou conflitos sociais se defrontam.
O que deve ser feito com um passado recente repleto de vítimas, criminosos, corpos secretamente enterrados, medo arreigado e recusa oficial? Deverá este passado ser exumado, preservado, reconhecido, desculpado? Como pode uma nação de inimigos formar uma união, antigos adversários reconciliados, no contexto de uma história tão violenta e, muitas vezes, de feridas ainda por sarar? O que deverá ser feito com milhares de criminosos ainda em liberdade? E como pode um novo governo impedir que tais atrocidades sejam perpetradas no futuro?
O objectivo desta workshop é explorar algumas dessas questões prementes. O nome pretende transmitir o nosso conhecimento da pluralidade das trajectórias políticas pós-violência e da complexidade e singularidade de cada contexto, a nossa rejeição de generalizações injustas e simplistas, e o nosso compromisso com o pluralismo metodológico. Orientados por esses princípios, é nossa intenção contribuir para o actual debate e oferecer novas perspectivas sobre aquilo que já é literatura em massa.
Formato
O workshop tem duas partes: a manhã será dedicada a uma apresentação por Alexandra Barahona de Brito, seguida de dois comentários por dois investigadores do CES; a segunda parte incluirá uma apresentação por Cecília MacDowell Santos, novamente seguida por dois comentários por investigadores do CES. Na segunda parte da tarde, todos os participantes estão convidados a participar numa mesa-redonda sobre o tema geral da conferência.
Programa
10h30 Nota introdutória por Mihaela Mihai
10h45 Comunicação principal por Alexandra Barahona de Brito: "Verdade Parcial e Compensação sem Justiça? A Experiência Brasileira"
11h15 Comentários por Silvia Rodríguez Maeso e Mihaela Mihai
11h45 Discussão geral
12h30 Pausa para almoço
14h00 Comunicação principal, por Cecília MacDowell Santos: "Para além do Paradigma de Justiça de Transição: O Papel da Mobilização Jurídica (Transnacional) nas Lutas de Memória-Justiça no Brasil"
14h30 Comentários por MIchele Grigolo e Miguel Cardina
15h00 Discussão
15h45 Coffee break
16h00 Mesa-redonda plenária: conclusões
Notas biográficas
- Alexandra Barahona de Brito é uma investigadora independente e consultora editorial de Cascais, Portugal. Anteriormente, foi investigadora sénior no Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais (IEEI), Lisboa, e no Instituto de Relações Europeias e Latino-Americanas (IRELA), Madrid; foi também, Professora de Direitos Humanos e Política na Universidade de Lisboa (ISCTE) e na Universidade Moderna, respectivamente. Possui o Doutoramento em Política e Mestrado em Estudos Latino-Americanos pela Universidade de Oxford, com obras publicadas (livros e artigos) sobre justiça transicional, direitos humanos, democratização e relações Europeas-Latino-Americanas, incluindo os seguintes títulos: “Human Rights and Democratization in Latin America: Uruguay and Chile” [Direitos Humanos e Democratização na América Latina: Uruguai e Chile] (Oxford University Press, 1997), e co-edição de “The Politics of Memory: Transitional Justice in Democratizing Societies” [As Políticas da Memória: Justiça Transicional em Sociedades Democratizantes] (Oxford University Press, 2001).
- Cecília MacDowell Santos é investigadora do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra e professora associada de sociologia da Universidade de São Francisco (Califórnia, EUA). É Doutora em Sociologia pela Universidade da Califórnia-Berkeley e Mestre em Direito pela Universidade de São Paulo. No CES, é docente nos programas de doutoramento “Direito, Justiça e Cidadania no Século XXI” e “Democracia no Século XXI”.
Os seus actuais interesses de investigação centram-se na mobilização jurídica e na (re)construção dos direitos humanos em escalas local, nacional e transnacional. No âmbito desta temática, tem vindo a realizar estudos sobre as relações entre o Estado, os sistemas de Justiça e os movimentos sociais, com enfoque nos discursos e lutas feministas em torno da violência contra as mulheres, nos direitos indígenas e no direito à memória política, especialmente nos contextos brasileiro e latino-americano. Também tem realizado estudos sobre a mobilização jurídica transnacional dos direitos humanos no contexto português e europeu.
É autora de Women's Police Stations: Gender, Violence, and Justice in São Paulo, Brazil (Palgrave Macmillan, 2005); co-organizadora de Desarquivando a Ditadura: Memória e Justiça no Brasil (Editora Hucitec, 2009) e de Repressão e Memória Política no Contexto Ibero-Brasileiro: Estudos sobre Brasil, Guatemala, Moçambique, Peru e Portugal (Ministério da Justiça do Brasil, 2010). Tem artigos publicados em livros e revistas internacionais peer-reviewed, incluindo Latin American Research Review, Cadernos PAGU e Sur-International Journal on Human Rights, entre outras.
Organização: Mihaela Mihai, DECIDe

