Teses Defendidas

Mortes no feminino: Narrativas judiciais sobre feminicídio no Brasil

Marina Oliveira Guimarães

Data de Defesa
22 de Julho de 2022
Programa de Doutoramento
Estudos Feministas
Orientação
Madalena Duarte
Resumo
O Brasil conta, desde 2015, com uma legislação própria sobre o crime de feminicídio, motivada por uma onda de reformas criminais na América Latina e pelo altos índices de assassinatos de mulheres. O processo de criminalização do feminicidio na região, embora marcado por debates e questionamentos sobre a sua conveniência, foi promovido pelo movimento feminista e constitui uma manifestação, no campo jurídico, de visibilizar política e socialmente o assassinato de mulheres e toda a discriminação estrutural que o afeta. Para além do debate sobre sua criminalização, aos feminismos é importante também analisar a forma como o crime de feminicídio é percebido e interpretado pelo Direito. Diante disso, esta tese propõe-se a investigar quais as narrativas contidas nas decisões judiciais acerca dos crimes de feminicídios nos Tribunais brasileiros - foram analisadas 129 decisões judiciais dos Tribunais estaduais do Brasil no ano de 2018. A investigação se assenta na matriz epistemológica e nos métodos jurídicos feministas, possibilitando o cariz qualitativo na reflexão dos dados empíricos, por meio da Análise de Conteúdo. As narrativas contidas nas decisões judiciais interpretam o crime de feminicídio como mais um crime de homicídio, desconsiderando todo o processo simbólico e histórico de luta por reconhecimento de mortes de mulheres por serem mulheres. Isso gera um apagamento conceitual do feminicídio e também sua desvinculação tanto das violências anteriores praticadas pelo feminicida como das causas estruturais que precedem o crime. Se por um lado o feminicídio é tido como outro tipo de homicídio, por outro, o feminicida é constantemente descrito, na narrativa, como um homem médio, que cometeu um deslize biográfico ao matar uma mulher e, por isso, diferencia-se, sobremaneira, do homicida "habitual". A centralidade das narrativas está nas mulheres. Como consequência, as suposições de gênero são fundadas na relação vítima-feminicida, em que se pondera especialmente a avaliação do comportamento das vítimas. As decisões judiciais criam, embora de maneira não linear ou exclusiva, um tipo "ideal" de vítima que se vincula a um tipo "ideal" de feminicida, construindo uma tipologia específica de feminicídio. Neste contexto, consideram-se as narrativas concorrentes aquelas que se libertam dos estereótipos ou os refutam, em especial, os de gênero, de vítima, de feminicida, de violências e de feminicídios. Há fragmentos destas narrativas presentes na amostra analisada que já demonstram algum avanço em relação a muitos outros argumentos, mas não contestam enfaticamente os estereótipos e muito menos estão livres deles. No fim, como exercício reflexivo, são apresentadas algumas alternativas que podem contribuir para novas formas de argumentar e decidir em crimes de feminicídio.

Palavras-chave: feminicídio, decisões judiciais, vítima, Teorias Feministas do Direito