12ª EDIÇÃO DO PRÉMIO CES PARA JOVENS CIENTISTAS SOCIAIS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Gabriela de Freitas Figueiredo Rocha vence 12.ª edição do Prémio CES

Julho 2021

Sobre o trabalho premiado

Esta trabalho analisa a resistência indígena ao processo de repetição dos esquemas coloniais no contexto político brasileiro recente, a partir da luta pela identidade e pelo reconhecimento que se trava no espaço homogeneizante da cidade.

Na medida em que o Estado brasileiro forjou historicamente um "lugar do índio" pela violência, aculturação, a miscigenação e o etnocídio, as conquistas democráticas dos últimos trinta anos, embora sejam significativas, não alteraram as lógicas monoculturais em que o político é pensado e vivido, onde o indígena ocupa um lugar residual, uma população uniforme a ser tutelada, integrada e protegida. Reforçam-se estereótipos coloniais, sobretudo na conjuntura atual, onde o avanço do fascismo tem legitimado fortemente a violência contra os povos etnicamente diferenciados e as práticas coloniais que colocam em risco todas as conquistas democráticas recentes.

Propos-se, em diálogo com a literatura pós-colonial e decolonial, deslocar o olhar para a agência dos coletivos indígenas ao reinventarem suas existências ao se apropriarem da língua colonizadora, das lógicas e aparatos normativos, criando fraturas ao processo de tradução monocultural que o indigenismo impôs. Fazem isso a partir das fronteiras em que habitam - aquelas fronteiras físicas e simbólicas que os constrangem a permanecerem em "seus lugares". A tradução é trazida aqui como um procedimento essencial, de natureza epistemológica e política, pois a partir dela se instaura o equívoco e a incerteza, daí o seu caráter permanentemente fronteiriço. Afinal, é na fronteira onde a diferença cultural potencializa a sua possibilidade de descolonizar e instaurar relações recíprocas e diálogos interculturais, pois passa de um objeto passivo a uma relação permanente de diferenciação.

A investigação deu-se através do estudo de caso alargado sobre a resistência indígena na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, durante os anos de 2015 e 2016, onde acompanhei coletivos e pessoas envolvidas em uma série de situações, aplicando a observação participante, a execução de entrevistas e pesquisa documental. Procurei elaborar o estudo de uma perspetiva situada, politicamente posicionada na defesa dos processos que buscava compreender e com os quais intento contribuir, de modo crítico, mas especialmente potencializador das forças que esse movimento encerra.

As conclusões dao trabalho assentam na relação entre as disputas nos campos institucionais por espaços de negociação e autodeterminação e seus reflexos no local, no território urbano, marcado por exclusões e violências que são a continuação da violência que os expulsa de seus territórios originários. Existir e resistir na cidade significa, assim, reapropriar-se do corpo, da língua, do nome, retomar raízes que se pensavam extintas, assumir um lugar permanentemente aberto de enunciação da diferença. Isso é colocado em prática a partir de diferentes estratégias de resistência que resumi em três: a defesa do nome e da autenticidade, a performance cultural e a retomada.

Palavras chave: Indígenas em contexto urbano; indigenismo no Brasil; pós-colonialismos. identidades fronteiriças; tradução intercultural